Como o vazamento de informação de uma reunião entre Haddad e bancos derrubou a Bolsa
Ministro se encontrou nesta sexta com representantes do mercado financeiro; rumores de que mexeria nas regras do arcabouço fiscal, divulgados após o encontro, fizeram indicadores piorar
O vazamento de informações de uma reunião fechada entre o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e representantes de bancos e instituições financeiras nesta sexta-feira, 7, em São Paulo, gerou ruído no mercado e piorou indicadores como Bolsa e juros.
No encontro, Haddad afirmou que há um conjunto de alternativas a serem levadas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no caso de o crescimento das despesas obrigatórias do governo consumir o espaço para as despesas discricionárias (não obrigatórias, como recursos para custeio e investimentos) dentro da regra fiscal. Ele também não se comprometeu de forma explícita a respeitar o crescimento máximo de despesa, mas não disse que alteraria o arcabouço fiscal, um dos temores do mercado.
A reunião incluiu o presidente do Santander Brasil, Mario Leão, além de outros representantes do banco, e cerca de outras 15 pessoas. Na agenda pública do ministro, constam os nomes de representantes das gestoras do Itaú e do Bradesco, e de casas como SPX, Absolute, Apex, Verde, Ibiuna e RPS, entre outras.
Uma informação divulgada após a reunião, que segundo o ministro foi uma "interpretação indevida" de sua fala, foi que os limites do arcabouço fiscal podem ser mudados.
Após um alívio no Ibovespa na quinta, quando subiu 1,23%, o índice voltou a terreno negativo nesta sexta, fechando com uma queda de 1,73%. As mínimas da sessão foram acentuadas com os ruídos sobre a situação fiscal. Os juros futuros fecharam em forte alta, disparando mais de 0,40 ponto porcentual, e o dólar encerrou a sessão em alta de 1,41%, cotado a R$ 5,3247, voltando aos maiores níveis de fechamento desde 5 de janeiro de 2023.
Haddad reclamou do vazamento de "informações falsas", negou mudanças no arcabouço e garantiu que, no encontro, havia dito que está disposto a contingenciar gastos. "Não teve nada no sentido de que o arcabouço poderia ser mudado, foi exatamente o contrário do que eu falei", disse na sede da pasta em São Paulo, na Avenida Paulista. "Eu falei que, sim, se algumas despesas crescessem além do previsto, poderia haver um contingenciamento de gasto, que é absolutamente normal e aderente ao que prevê o arcabouço fiscal."
Pessoas presentes à reunião relataram ao Estadão/Broadcast que Haddad foi questionado sobre o crescimento das despesas obrigatórias, como as com saúde e educação, o que pode no futuro zerar o espaço para despesas discricionárias. Ele afirmou que há um conjunto de alternativas que podem ser levadas a Lula "na hora certa" para lidar com o problema, mas não quis detalhar quais medidas seriam estas.
Ainda segundo o relato de participantes do encontro, o ministro disse que caso haja uma resistência grande no governo a cortar determinadas despesas, ele colocaria as opções a Lula: contingenciar os gastos ou cortar, em um exemplo hipotético, R$ 30 bilhões do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
Outra pergunta foi sobre uma possível pressão no governo para elevar o teto de aumento real das despesas neste ano, atualmente de 2,5%. Haddad disse, segundo os relatos, que se a ideia surgir, explicará a Lula as possíveis consequências sobre indicadores financeiros.
De acordo com essas pessoas presentes, a posição de Haddad diante dos questionamentos foi a de explicar como funciona o arcabouço. Embora ele não tenha se comprometido com medidas concretas para respeitar o crescimento máximo de despesas, ele também não disse que o arcabouço será alterado caso haja pressão de despesa.
Uma dessas pessoas acredita que rumores sobre a reunião geraram ruído no mercado porque operadores podem ter interpretado que as falas de Haddad significam que ele está fraco dentro do governo ou sem convicção o suficiente na consolidação fiscal. Os presentes afirmam, no entanto, que o ministro simplesmente disse o que tem dito com frequência.
Após a reunião, com a piora dos indicadores, Haddad voltou a falar com jornalistas para reclamar do que chamou de "interpretação" da sua fala. "O que eu disse, e foi uma combinação feita, [foi] por favor, não interpretem, não coloquem na minha boca uma interpretação sobre o que eu falei. Se, porventura, houver alguma dúvida, faça a pergunta que eu respondo", disse. "O que eu pedi é para não interpretarem o que eu falei, o que foi feito indevidamente."