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Como se chegou à pior recessão desde os anos 90?

1 dez 2015 - 10h29
(atualizado às 10h47)
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Foto: Divulgação/BBC Brasil / BBC News Brasil

No início do ano já se sabia que 2015 seria um ano difícil, mas poucos poderiam prever uma deterioração tão rápida e, ao mesmo tempo, persistente da economia brasileira.

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Segundo dados divulgados nesta terça-feira pelo IBGE, de julho a setembro o PIB do país se retraiu 1,7% frente ao segundo trimestre do ano e 4,5% frente ao mesmo período de 2014. Na comparação interanual trata-se da pior queda desde o início da séria histórica do instituto, em 1996.

"Inicialmente a previsão do governo era que a atividade econômica cairia nos dois primeiros trimestres de 2015 e começaria a se recuperar justamente de julho a setembro", lembra o economista da Unicamp André Biancarelli.

"O que aconteceu, porém, foi que o último trimestre foi o pior de todos. Ou seja, a crise ainda está se aprofundando e, infelizmente, não temos horizonte para uma melhora."

Até o governo, que em abril falava em uma contração da economia de 0,9% em 2015, agora já admite uma queda de 3,1% no PIB, o que seria a maior recessão desde 1990.

Nos últimos 12 meses, pelo menos 825 mil pessoas perderam seus postos de trabalho segundo o IBGE. Os investimentos se paralisaram e a renda dos trabalhadores caiu.

Para completar, ainda não parece haver luz no fim do túnel. Segundo previsões do Banco Central a recessão deve durar pelo menos mais três trimestres.

"Esperamos uma queda do PIB de - 3,2% em 2015 e - 2% em 2016, ou seja, dois anos consecutivos de recessão, algo que não se via desde 1930", diz a economista da Consultoria Tendências, Alessandra Ribeiro.

"Nessa toada, o risco é que o segundo mandato de Dilma Rousseff termine com uma média de crescimento negativa", acrescenta Biancarelli.

Mas, afinal, como a situação se deteriorou a esse ponto?

Economistas consultados pela BBC Brasil listaram cinco fatores que agravaram a recessão nos últimos meses. Confira:

1. Lava Jato e preços do petróleo

Segundo cálculos da Tendências, a operação Lava Jato deve ter um impacto de -2,5% no PIB deste ano em função das paralisações nas atividades da Petrobras e de algumas das maiores construtoras do país.

Isso significa que, não fossem os efeitos das investigações nas empresas, a queda do PIB poderia ser de 0,7% na estimativa da consultoria – que hoje projeta uma retração de 3,2% para a economia em 2015.

Empresas como a Odebrecht e a Camargo Correa, além da própria estatal petrolífera, revisaram seus investimentos e os contratos com parceiros e fornecedores, além de ter feito demissões.

"O setor de óleo e gás e a construção civil têm uma participação importante no total dos investimentos da economia – então era esperado que o efeito fosse significativo", explica Ribeiro.

Foto: Divulgação/BBC Brasil / BBC News Brasil

André Perfeito, da Gradual Investimentos, ressalta que a Petrobras também foi afetada pela queda dos preços do petróleo.

Em agosto de 2014, o barril (tipo brent) estava na casa dos US$ 100. Hoje, não passa dos US$ 50.

"Isso altera as perspectivas para os projetos do pré-sal e obriga a empresa a revisar alguns de seus planos", diz Perfeito.

2. Crise política

Outro fator que teria prejudicado bastante o desempenho da economia na avaliação dos economistas foi a crise política.

"No início do ano a agenda do ajuste fiscal acabou capturada pelo presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB)", diz Perfeito.

Foto: Divulgação/BBC Brasil / BBC News Brasil

"Surgiram problemas como a 'pauta bomba' (medidas propostas pelo Congresso que aumentavam os gastos públicos) e o resultado foi que o processo de ajuste não caminhou tão rápido como se imaginava."

Otto Nogami, professor do Insper, acrescenta que a crise política também contribuiu para agravar o clima de incertezas, que inibe investimentos.

Ninguém no início do ano poderia imaginar que alguns grupos defenderiam um impeachment da presidente e que chegaria a haver dúvidas sobre capacidade de Dilma Rousseff terminar o mandato.

"E o resultado disso tudo foi uma deterioração rápida das expectativas de investidores para a qual também contribuiu a perda do grau de investimento (pela agência de classificação de risco Stardard & Poor’s)", opina Nogami.

3. Aperto monetário e ajuste

Muitos analistas admitem que o aperto monetário e o ajuste fiscal mais duro do que era esperado também tiveram seu papel no aprofundamento da recessão.

Os cortes de gastos anunciados em um primeiro momento não se mostraram suficientes para o governo atingir a meta de superavit primário (economia feita para pagamento dos juros da dívida), o que levou a uma revisão sucessiva da meta para 2015 e novos enxugamentos.

Para alguns economistas, o ajuste não foi rápido e contundente como deveria ser. Já outros, de linha mais heterodoxa, o problema foi que o ajuste e o aperto monetário foram duros demais.

Ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e do Planejamento, Nelson Barbosa, anunciam cortes
Ministros da Fazenda, Joaquim Levy, e do Planejamento, Nelson Barbosa, anunciam cortes
Foto: LEvy e Barbosa / BBC News Brasil

A questão é que a recessão levou a uma queda da arrecadação – e com isso o deficit fiscal em vez de cair, cresceu. No último relatório de receitas e despesas deste ano, por exemplo, o governo confirmou a intenção baixar a meta fiscal de 2015 para um déficit primário de R$ 51,8 bilhões, ou 0,8% do PIB.

"O ajuste não foi eficiente nem sequer para produzir seu objetivo direto, que era o superávit, quem dirá em gerar crescimento", diz Biancarelli, um dos críticos ao processo de ajuste.

Como a inflação ficou acima do esperado (analistas preveem que feche o ano na casa dos 10%), o Banco Central também aumentou os juros mais do que era previsto em uma tentativa de conter os preços.

Para Nogami, do Insper, não há como negar que tanto a política fiscal quanto a monetária foram e têm sido contracionistas, mas elas são um "mal necessário".

Ribeiro, da Tendências concorda: "Já vimos tentativas de recuperar a economia ampliando os gastos do Estado e elas sempre fracassaram."

Já Biancarelli acredita que há alternativas: "Uma taxa de juros mais razoável e uma recuperação dos investimentos públicos hoje poderia dar algum alívio a economia", diz ele.

4. Queda no consumo

Para Nogami, a recessão brusca ocorreu em parte em função do estouro do que ele chama de "bolha do consumo".

Até o fim do ano passado, mesmo com a economia desacelerando, o mercado de trabalho ia relativamente bem. A renda real média dos trabalhadores crescia e o desemprego registrava recordes sucessivos de baixa – o que dava confiança para as famílias continuarem comprando.

A regra vale para qualquer produto: de vegetais no supermercado a compra de um carro
A regra vale para qualquer produto: de vegetais no supermercado a compra de um carro
Foto: Divulgação

Além disso, Nogami diz que, até 2014, foram adotadas uma série de medidas para estimular o consumo – como a expansão do crédito.

Neste ano, com o aumento do desemprego e enxugamento do crédito, o Brasil estaria vivendo a ressaca desse processo.

"Sem aquela demanda que vinha sendo inflada artificialmente, a indústria e outros setores estão sentindo a necessidade de reajustar sua estrutura, o que muitas vezes representa um aumento das demissões", diz Nogami.

"Além disso, o enxugamento dos gastos públicos também teve um efeito significativo na demanda, já que o governo é o segundo maior 'consumidor' da economia, depois das famílias, respondendo por 22% dos gastos totais."

5. Cenário externo

Para Biancarelli, o cenário externo também contribuiu para que o desempenho da economia brasileira fosse pior do que o esperado em 2015.

Ele menciona que o FMI revisou sucessivamente suas expectativas de crescimento para a economia global em 2015. Neste mês, por exemplo, a estimativa passou dos 3,3%, em julho, para 3,1%.

Entre os fatores externos mais relevantes para a economia brasileira estariam a queda nos preços nas commodities e a desaceleração chinesa.

Como resultado desses dois fenômenos, o valor negociado das exportações brasileiras caiu e, mesmo com o real desvalorizado, as exportações para a China tiveram baixa de quase 20% no primeiro semestre na comparação com 2014.

"Acho que está claro que, mesmo com o real em um patamar mais baixo, não vão ser as exportações que vão puxar a economia nos próximos meses, como em 2004", diz o economista da Unicamp.

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