Cortes em benefícios irregulares pode gerar economia de até R$ 20 bilhões por ano
Revisão no cadastro do Bolsa Família já levantou cerca de 1,5 milhão de benefícios irregulares, que devem ser cortados
A revisão em andamento no cadastro do Bolsa Família já levantou cerca de 1,5 milhão de benefícios irregulares, e o prosseguimento do pente-fino levará a um corte de um número ainda maior de beneficiários, informaram à Reuters duas fontes do governo, em iniciativa que poderá gerar uma economia potencial estimada em até R$ 20 bilhões por ano.
Na tentativa de melhorar as contas federais, a revisão de programas também passará pelo Farmácia Popular para corrigir ineficiências e combater fraudes, de acordo com uma das autoridades. Nesse caso serão usados como base auditoria da Controladoria-Geral da União (CGU), ainda em andamento, e levantamento do Conselho de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas (CMAP).
Em relação ao Bolsa Família, uma das fontes afirma que o governo está fazendo uma recuperação de dados do Cadastro Único de programas sociais, que, segundo o relato, teria sido "danificado" pelo governo anterior.
"Está claro que tem bastante gordura fácil de cortar, tem muita fraude, muita gente que recebe e não deveria, tem cruzamento de sistemas que não estavam integrados", disse a segunda fonte.
Uma das frentes de ação busca identificar pessoas que se cadastraram indevidamente como famílias unipessoais, apesar de viverem no mesmo lar com outros beneficiários, o que não é permitido pelo programa.
Segundo esse membro do governo, também foram encontradas outras diversas irregularidades no cadastro, como beneficiários que já recebem repasses previdenciários, pessoas que têm registro de carteira de trabalho assinada e até mesmo servidores públicos e militares.
"Está claro que pelo menos 1,5 milhão de cadastros são totalmente irregulares, e tem mais 1 milhão a 1,5 milhão que provavelmente também são", disse a fonte, em condição de anonimato porque a avaliação ainda está em andamento.
Desde a transição de governo, auxiliares do presidente Luiz Inácio Lula vinham acusando a gestão Jair Bolsonaro de afrouxar regras do programa, até então chamado de Auxílio Brasil, para incluir mais beneficiários em meio ao processo eleitoral. O governo Bolsonaro argumentava que o programa havia sido ampliado para atender aos mais pobres, especialmente diante do aumento da inflação.
Atualmente, o programa conta com 21,9 milhões de beneficiários. Para o Orçamento de 2023, a verba disponibilizada para o Bolsa Família é de 175,7 bilhões de reais.
Após o término do cruzamento de dados, o governo deve realizar um recadastramento dos beneficiários para peneirar os pagamentos irregulares.
Procurado, o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome não apresentou detalhes sobre a revisão e informou que o governo "está trabalhando com a máxima prioridade na construção do novo Bolsa Família a fim de que o recurso chegue às famílias que mais precisam o mais rápido possível".
Farmácia Popular
Em outra frente, o governo quer olhar com lupa o Farmácia Popular, disse uma das fontes, embora ela argumente que o objetivo não é meramente fiscal, mas uma melhora de eficiência para abrir espaço para mais gastos no programa.
"O Farmácia Popular precisa ser olhado com cuidado, tem muita fraude, não é pequeno. É um programa que tem que aprimorar e dá para economizar. A gente quer expandir o gasto para recuperar o programa, mas precisa ter um desenho melhor", afirmou.
A CGU confirmou que há um trabalho de auditoria em andamento no Farmácia Popular, mas informou que não é possível fornecer detalhes, considerando que a iniciativa não está concluída.
O Farmácia Popular ganhou o noticiário em 2022 após o governo Jair Bolsonaro anunciar um corte de verbas para essa finalidade. A PEC da Transição, que viabilizou a liberação de verbas para o Bolsa Família neste ano, também recuperou recursos para o programa, que subsidia medicamentos. O orçamento do Farmácia Popular é de 3,1 bilhões de reais em 2023.
O programa disponibiliza medicamentos gratuitos para tratamento de diabetes, asma e hipertensão, além de subsidiar até 90% do valor de referência de remédios voltados a outras patologias.
A Reuters ouviu relatos de pessoas que têm em seus cadastros no SUS registros de coleta de medicamentos por meio do Farmácia Popular, embora afirmem nunca terem feito retiradas desse tipo.
No fim de 2022, o CMAP, conselho do governo que avalia as políticas públicas, publicou um relatório de avaliação sobre subsídios tributários a medicamentos. O documento aponta problemas na regulação de preços desses produtos no país e conclui que há uma concentração de subsídios em fármacos mais consumidos por famílias de renda maior, mas não faz recomendação específica sobre o Farmácia Popular.
Responsável pela gestão do programa, o Ministério da Saúde informou que "tem como prioridade a reconstrução de políticas públicas fundamentais para a saúde da população brasileira, como o programa Farmácia Popular".
"A iniciativa, criada em 2004 para ofertar assistência farmacêutica à população, será fortalecida e aperfeiçoada", disse a pasta.