Crédito consignado: governo quer unir trabalhador e banco em plataforma com 'leilão' por menor juro
Nova modalidade de empréstimo, que será proposta pelo governo ao Congresso, terá estrutura tecnológica para fomentar competição entre instituições financeiras
BRASÍLIA - O governo realiza os ajustes finais em uma plataforma que pretende unir, de um lado, trabalhadores da iniciativa privada interessados em contratar crédito e, de outro, instituições financeiras aptas a oferecer esses valores. Essa será a base tecnológica do novo empréstimo consignado privado, que os ministérios da Fazenda e do Trabalho devem propor ao Congresso Nacional ainda em 2024.
Receba as principais notícias direto no WhatsApp! Inscreva-se no canal do Terra
"Estavamos desenvolvendo com o Serpro e a Dataprev toda a estrutura de tecnologia da informação. Agora está pronto e deve sair em breve, neste ano", afirmou ao Estadão o secretário de Reformas Econômicas da Fazenda, Marcos Pinto.
O sistema seguirá os moldes do Desenrola, o programa de renegociação de dívidas que vigorou até maio. A ideia é que os bancos compitam pela contratação do crédito, numa espécie de "leilão" pelos menores juros e melhores prazos e condições.
"O trabalhador vai levantar a mão, nessa plataforma, e dizer: 'Quero um consignado'. Com isso, ele dá autorização para os bancos olharem os dados dentro do INSS, e aí ele escolhe a instituição que fizer a melhor oferta", explica Pinto.
Hoje, o consignado privado fica bem atrás dos consignados voltados ao setor público e aos aposentados do INSS. O diagnóstico da equipe econômica é de que dois fatores brecam esse tipo de concessão.
"O primeiro problema é que precisa de um convênio entre banco e empregador, o que exclui praticamente todas as pequenas e médias empresas. E o segundo é que, quando o trabalhador sai ou perde o emprego, ele perde o vínculo (que possibilita o crédito)", explica Pinto.
Com a nova plataforma, que estará interligada ao e-Social e ao FGTS Digital, a contratação do empréstimo será diretamente com o banco, sem necessidade de convênio com a empresa. "Na hora que o empregador for pagar os encargos trabalhistas, ele já terá de deduzir a parcela do empréstimo, e isso vai direto para o banco", diz o secretário.
Caso o funcionário mude de emprego, a dívida continuará ativa e poderá ser redirecionada para o novo vínculo. Além disso, no caso de demissão, parte das verbas recisórias poderá ser dada como garantia. Atualmente, o limite é de 10% do saldo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e 100% da multa, mas há discussões dentro do governo para que esse lastro seja elevado.
Além das pequenas empresas, o objetivo é levar o consignado a públicos que hoje contam com oferta limitada ou inexistente dessa modalidade, como por exemplo os trabalhadores domésticos."Esse (trabalhador doméstico) é um público importante. Pessoas que se financiam em crediários supercaros do varejo ou no rotativo do cartão de crédito e que vão poder pegar esse novo tipo de financiamento", afirma.
A ideia é que os trabalhadores possam comprometer até 35% de sua remuneração bruta mensal com esse crédito, mas o porcentual ainda pode sofrer ajustes, afirma Pinto. Questionado sobre a taxa de juros, o secretário diz que a média será inevitavelmente superior à observada no consignado do INSS e dos servidores públicos, uma vez que o risco será maior.
Sobre a possibilidade de definição de um teto para essa taxa, Pinto diz que a decisão sobre estabelecer ou não um limite e qual será ele ficará a cargo do Conselho Curador do FGTS, como já previsto em legislação vigente atualmente.
Como mostrou o Estadão/Broadcast, embora os bancos já tenham se manifestado de forma contrária, segue de pé no Ministério do Trabalho a possibilidade de haver um teto de juros no novo desenho do consignado para trabalhadores do setor privado.
A pasta também defende que o novo consignado seja atrelado ao fim do chamado saque-aniversário do FGTS, modalidade em que os trabalhadores sacam anualmente uma parcela do fundo. Os bancos criaram um crédito em cima desse saque, que hoje movimenta bilhões de reais — e, por isso, se opõem à extinção desse produto. O Ministério do Trabalho alega, porém, que as retiradas anuais ameaçam a sustentabilidade do FGTS.