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Desapropriações de terras ainda se arrastam no Porto do Açu

Retirada de famílias de pequenos produtores rurais começou ainda na fase de obras do complexo porto-indústria

9 out 2022 - 05h11
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SÃO JOÃO DA BARRA (RJ), CAMPOS DOS GOYTACAZES (RJ) E RIO - Desde o início das atividades do Porto do Açu, o número total de empregos aumentou em quase 3 mil vagas em São João da Barra, cidade de 36,7 mil habitantes no litoral norte do Rio que sedia o megacomplexo porto-indústria, mas milhares de pessoas acabaram desalojadas para dar lugar a um distrito industrial que ainda está longe de sair do papel.

A Prumo Logística, dona do porto, procura compensar os impactos ambientais com a criação de uma reserva particular do patrimônio natural (RPPN), considerada a maior do País a abrigar vegetação de restinga. A empresa acabou de inaugurar um centro de visitantes e tem um trabalho de preservação de tartarugas marinhas, em parceria com o Projeto Tamar. Uma solução definitiva para os impactos sociais, porém, ainda se arrasta.

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A disputa judicial tem se arrastado no silêncio dos tribunais nos últimos anos, mas, na última década, teve o barulho de protestos, com fechamento de estradas e pneus queimados. Pessanha lembra casos de idosos retirados de casa sob aparato policial e de moradias destruídas. Segundo o advogado, proprietários desalojados ficaram sem ter onde alocar seu gado e foram obrigados a ficar movimentando os animais ou a alugar propriedades.

O geógrafo Marcos Antônio Pedlowski, professor da professor da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (Uenf), estudioso dos impactos socioambientais das políticas de planejamento territorial e ambiental, analisa as desapropriações da área do Porto do Açu há mais de dez anos. A resistência dos pequenos produtores rurais foi, de certa forma, surpreendente.

Muitas das famílias instaladas na região há décadas mantêm algum grau de parentesco entre si e, quando começaram as obras do empreendimento, boa parte dos proprietários já estava em idade avançada, diz Pedlowski. Foi um movimento de resistência de idosos, completa o professor, que classifica as desapropriações como "grilagem estatal".

A resistência sobrevive no Sítio do Birica, propriedade de 27 mil metros quadrados que chama a atenção de quem passa pela estrada que leva ao Porto do Açu. É uma ilha verde em meio a um deserto de terrenos desocupados, de solo arenoso e vegetação rasteira. Na cerca da frente da propriedade, cartazes com palavras de ordem contra o Porto do Açu instigam ainda mais a atenção dos passantes. Dentro do sítio, o verde das árvores e da produção variada de orgânicos, de hortaliças a legumes e frutas, contrasta com o vazio deixado pelos vizinhos.

Os donos do sítio, Noêmia Magalhães, de 76 anos, e Valmir Batista, de 80 anos, lutam contra a desapropriação há mais de dez anos. Apesar da realidade diferente da maioria das famílias de pequenos produtores rurais que viviam e trabalhavam há décadas na pacata zona rural, Noêmia se destacou na resistência.

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Enquanto o impasse se arrasta, o casal segue plantando - o suficiente para se alimentarem por 30 dias, garante Noêmia - e vivendo a vida no campo, em parte como no sonho da aposentadoria. Ao refletir sobre a trajetória, Noêmia avalia que a resistência valeu a pena, mas se lamenta de ter se afastado de filhos e netos por causa das ameaças. Questionada sobre o que fará se a decisão final do Judiciário for pela desapropriação, diz não saber bem ao certo como reagirá: "Acho que antes vão ter de me prender".

Rogério Zampronha, presidente da Prumo Logística, dona do Porto do Açu, afirma ter disposição para resolver os problemas, que já se arrastavam desde antes de sua chegada ao cargo, em abril passado. "Estamos tendo um cuidado todo especial no relacionamento com os proprietários, para defender os interesses deles também. Não queremos ficar 20 anos esperando uma solução judicial. Decidimos conversar diretamente. Isso está sendo feito. Aceleramos bastante esse processo e espero resolver muito rápido", diz o executivo.

Estadão
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