Dólar tem leve alta com alívio após aprovação de pacote de combustíveis
Em dia marcado por fortalecimento da moeda americana no exterior, na esteira da frustração com as negociações para um cessar-fogo entre Rússia e Ucrânia e da divulgação da inflação ao consumidor (CPI) nos EUA, o dólar esboçou uma alta forte no mercado doméstico de câmbio, operando a maior parte do dia ao redor R$ 5,05, tendo atingido máxima a R$ 5,0760 no início da tarde. A moeda, contudo, perdeu força na última hora de negócios e chegou até a flertar com uma virada para o lado negativo, após alívio com a aprovação pelo Senado de projeto para amenizar a alta dos combustíveis. A proposta traz a criação de uma conta de estabilização de preços, auxílio para motoristas de baixa renda e a ampliação do vale-gás para famílias carentes.
Com mínima a R$ 5,0110, o dólar à vista fechou a R$ 5,0160, em leve alta de 0,11%. A moeda acumula perda de 1,23% na semana e de 2,71% em março. Preços de commodities em níveis elevados e taxa de juros local elevada (e em ascensão) servem de anteparo para o real, dizem analistas.
Segundo operadores, além do ambiente externo desfavorável, havia certa cautela diante da possibilidade de soluções mais heterodoxas com intervenção direta na formação de preços, sobretudo após a Petrobras anunciar alta de 18,7% na gasolina, de 24,9% no diesel e de 16% no gás de cozinha. Quase no fechamento do mercado de câmbio, o Senado também aprovou o teto base do projeto que altera a cobrança do ICMS sobre combustíveis.
"A aprovação do projeto no Senado ajudou nesse movimento de recuo do câmbio à tarde. Não que seja exatamente positiva. Ainda existe um problema fiscal. Mas é um ponto a menos de incerteza e mostra que estão buscando um acordo", afirma a economista-chefe do Banco Ourinvest, Fernanda Consorte, que prevê um ambiente de grande volatilidade para os ativos, em razão da guerra no leste europeu. "Ainda existe fluxo de capital para o Brasil que está contendo uma aceleração da taxa de câmbio. Mas não acredito que essa taxa vai ficar baixa se vier uma piora no conflito entre Rússia e Ucrânia".
Aprovado pelo Senado, o projeto dos combustíveis ainda precisa ser apreciado pela Câmara dos Deputados. Fontes da equipe econômica afirmaram ao Broadcast que a criação da conta de estabilização de preço é "inócua", já que não há espaço no teto de gastos para sua adoção. Não haveria folga fiscal nem mesmo para a criação do auxílio-gasolina no valor de até R$ 3 bilhões.
No exterior, o índice DXY - que mede a variação do dólar frente a uma cesta de seis divisas fortes - subiu novamente para a casa de 98,500 pontos, com fortes ganhos em relação ao euro, na esteira o tom moderado da presidente do Banco Central Europeu (BCE), Cristiane Lagarde, após a instituição, como esperado, manter as taxas de juros inalteradas. Frente a divisas emergentes, as maiores altas do dólar foram em relação ao peso colombiano, a lira turca, zloty polonês e o florim húngaro.
O fortalecimento do dólar teve como gatilhos a frustração com a falta de um entendimento para um cessar-fogo entre Rússia e Ucrânia e o índice de inflação ao consumidor (CPI) dos EUA em fevereiro. A inflação americana está no maior nível em 40 anos (e pode ser ainda mais pressionada pela escalada recentes do petróleo), o que aumenta a expectativa para a decisão de política monetária do Federal Reserve, na quarta-feira (16). Embora permaneça a aposta majoritária em elevação inicial de 0,25 ponto porcentual dos juros nos EUA, volta à baila a possibilidade de um tom mais duro do BC americano e possível alta de 0,50 ponto em maio.
O CPI subiu 0,8% em fevereiro, levemente acima do esperado (0,7%), enquanto o núcleo avançou 0,5%, em linha com as expectativas. Na comparação anual, o índice atingiu 7,9% (ante projeção de 7,8%), enquanto o núcleo subiu 6,4% - ambos no maior nível desde 1982.
Ao observar o comportamento da inflação implícita nos títulos de dois anos indexados à inflação nos EUA, o head da tesouraria do Travelex Bank, Marcos Weigt, observa, no Twitter: "Se não vier uma recessão causada pela alta das commodities (principalmente o petróleo), acho bem provável que o Fed suba a taxa de juros bem acima do que o mercado está precificando hoje".
Em relatório, a gestora de recursos Armor Capital afirma que, diante dos impactos inflacionários da guerra no leste europeu, a "tarefa das autoridades monetárias se tornou ainda mais complexa", uma vez que podem "ficar atrasadas com relação às expectativas dos demais agentes econômicos e contribuírem para a disseminação da escalada de preços".
No caso do Brasil, a gestora acredita que os juros deverão ir mais para perto de 13% e prevê que a taxa Selic, hoje em 10,75% ao ano, atinja 12,25%. Como o Fed, o Copom anuncia sua decisão de política monetária na quarta-feira (16). Com a perspectiva de aumento da entrada de recursos para o Brasil, em razão da melhora dos termos de troca provocada pela forte elevação das commodities, a Armor revisou sua projeção para taxa de câmbio no fim deste ano de R$ 5,75 para R$ 5,40.