Ensino híbrido ganhará (muito) mais espaço em 2022
Instituições devem adaptar seu portfólio de cursos, seus modelos de entrega, e definir seu posicionamento no ensino híbrido.
A pandemia de Covid-19 provocou um impacto profundo na educação do país, agravando ainda mais as desigualdades já existentes entre a rede pública e a privada. Instituições, professores e alunos tiveram de se adaptar ao ensino remoto e de enfrentar diversos problemas, tais como: falta de computadores e o acesso à internet.
Com sinais de arrefecimento da crise sanitária, algumas questões que se colocam são: como será a educação pós-pandemia? Como deve ser a preparação para o ano letivo de 2022?
“O setor de educação foi fortemente impactado pela crise – as matrículas e a evasão estão sendo pressionadas pelos impactos econômicos, a aprendizagem foi comprometida pela distância, os professores e funcionários foram extremamente exigidos durante a transição e os alunos terão expectativas diferentes das que tinham antes da crise sanitária. A transformação que está ainda por vir não será a continuação nem do modelo anterior à Covid-19 nem da cristalização do que houve durante a crise”, explica Eduardo Tesche, sócio da EY-Parthenon e líder para o setor de Educação.
Em entrevista para a série especial da Agência EY sobre as perspectivas para 2022 nas mais diversas áreas socioeconômicas, Tesche fala sobre as transformações no modelo de ensino, a adoção do modelo híbrido e como reduzir a evasão escolar.
Na sua opinião, a pandemia acelerou transformações no modelo de ensino?
A pandemia impulsionou uma transformação que já vinha acontecendo. A aprendizagem hoje e no futuro se dará de forma mais ampla em algumas dimensões. A expectativa de formação completa após o fim do ensino superior está dando lugar a um aprendizado constante ao longo da vida para dar conta de um mercado de trabalho mais complexo e de necessidades pessoais mais amplas. O ambiente físico de aprendizado, centrado na figura do professor dentro de uma sala de aula, está sendo substituído por um modelo híbrido, que busca extrair de cada experiência de aprendizado o melhor que aquele formato tem a oferecer. A educação sendo centralizada por escolas e instituições de ensino superior passa a ser muito mais abrangente, com empresas passando a assumir a liderança da formação de sua mão de obra e compartilhando, como modelo de negócio, os aspectos únicos em que são diferenciadas.
As universidades vão adotar o ensino híbrido?
Não há dúvidas de que o ensino híbrido será mais utilizado pelas instituições. As que permanecerem unicamente no ensino presencial serão pressionadas pela concorrência em função de outras instituições acessarem os alunos na sua região. Mas, além disso, teremos alunos que valorizarão a comodidade do ensino a distância e a melhoria da experiência de aprendizagem com aumento do uso de recursos digitais e novas metodologias de ensino. Será extremamente importante para as instituições adaptaram seu portfólio de cursos, seus modelos de entrega e definir o seu posicionamento no ensino híbrido.
Como a tecnologia pode melhorar nesse novo formato de ensino? Neste caso, pensando também nos ensinos fundamental e médio, além do universitário.
Um desafio importante no Brasil é a deficiência da infraestrutura de acesso à internet e acessibilidade da banda larga. A maior parte dos alunos do ensino básico frequenta o ensino público, onde a disponibilidade de recursos digitais ainda é bastante inferior ao ensino privado. Essa diferença pode ampliar ainda mais a fenda que separa os alunos do ensino privado e público, com impactos significativos no aumento da desigualdade social. Esse é provavelmente o maior desafio do ponto de vista de tecnologia, garantir que tenhamos equidade na utilização dos recursos digitais. Para além da tecnologia, existe, entretanto, um aspecto humano importante que é a capacitação dos professores para fazerem uso apropriado das metodologias mais adequadas ao ensino à distância e híbrido.
Houve aumento da evasão escolar durante a pandemia. O que é preciso fazer para tentar resolver essa questão?
A evasão é bastante ligada aos aspectos econômicos, tanto no ensino básico quanto no ensino superior. Houve uma evasão importante de alunos de ensino básico que saíram da escola, que muitas vezes não conseguiram se adaptar durante a pandemia, para o mercado de trabalho. A perda de emprego e renda levou crianças e adolescentes a começarem a trabalhar de forma prematura e a incorporação dessa renda no orçamento familiar pode tornar difícil que elas voltem aos bancos escolares em um futuro próximo. Para além da dependência financeira, houve impactos na socialização das crianças, criação de vínculo com a escola e frustração no aprendizado. Será preciso que haja uma retomada econômica e um programa estruturado de incorporação desses alunos à escola, com frentes de remediação de aprendizado, socialização e conscientização dos pais.
O mercado de educação privada teve se se adaptar e ainda terá de fazer ajustes para este ano. Como avalia essa questão? O que é importante que elas tenham como foco?
O mercado terá de se adaptar de forma contínua ao longo dos próximos anos. O setor de educação foi fortemente impactado pela crise – as matrículas e a evasão estão sendo pressionadas pelos impactos econômicos, a aprendizagem foi comprometida pela distância, os professores e funcionários foram extremamente exigidos durante a transição e os alunos terão expectativas diferentes das que tinham antes da crise sanitária. A transformação que está ainda por vir não será a continuação nem do modelo anterior à Covid-19 nem da cristalização do que houve durante a crise. Será certamente um modelo novo, em que as expectativas serão muito mais elevadas em termos de experiência dos alunos. Esse deve ser o foco. Começar pela transformação da experiência dos alunos, com vista à aprendizagem e ao reengajamento deles e dos pais com as escolas e instituições de ensino superior.
Quais medidas as escolas podem adotar para que os alunos consigam recuperar o aprendizado (comprometido durante a pandemia)?
As escolas devem começar com uma avaliação completa e individualizada do impacto da pandemia no aprendizado, identificando quais foram as áreas em que esse impacto foi maior e quão abrangente foi. É importante que essa avaliação leve em conta não apenas aspectos de transmissão do conteúdo do currículo, mas que englobe aspectos socioemocionais e de desempenho cognitivo. Com base nesse diagnóstico, é preciso desenvolver um plano de remediação que toque os aspectos comuns à maior parte dos estudantes e desenvolver planos e suporte individualizado para necessidades específicas. O contexto de cada aluno durante a pandemia foi provavelmente diferente em relação ao apoio que teve dos pais, à infraestrutura tecnológica e às necessidades pregressas de apoio. A execução deste plano irá depender fortemente da disponibilização de ferramentas e de treinamento para os professores, que precisarão ser envolvidos em uma transformação digital mais estruturada e duradoura.