Expectativa que vira pesadelo: as dificuldades na Justiça de quem comprou imóvel, mas não recebeu
Os baixos valores atribuídos ao instituto do dano moral, no Brasil, são uma distorção do sistema
Nos tribunais brasileiros, são muitos os processos envolvendo atrasos na entrega de apartamentos adquiridos na planta, revelando uma realidade cruel: depois de adquirir a tão sonhada casa própria, muitos consumidores enfrentam verdadeira batalha para desfrutar do bem, tendo sua expectativa transformada em pesadelo.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), em entendimento firmado no Tema Repetitivo 996/16, reconheceu que, em caso de descumprimento do prazo para a entrega do imóvel, incluindo o período de tolerância de 180 dias, o prejuízo do comprador é presumido, consistente na injusta privação do uso do bem, ensejando pagamento na forma de aluguel mensal até a entrega definitiva, com base no valor locatício de imóvel assemelhado.
No que tange à compensação, a Lei n.º 13. 786/18 dispõe que, se a entrega do imóvel se estender por mais de 180 dias, será devida indenização de 1% do valor efetivamente pago à incorporadora para cada mês de atraso. Este entendimento vem sendo adotado pela jurisprudência do TJ-SP.
Por outro lado, pode o comprador optar pela solicitação do distrato e receber 100% de tudo que foi pago, com o valor corrigido e juros cobrados. Existe ainda a possibilidade de pleitear indenização por danos morais, estes eventualmente caracterizados com a privação do uso do imóvel que serviria de moradia ao consumidor, causando-lhe angústia, hipótese que não se confunde com o mero descumprimento contratual.
Diga-se, sem rodeios, que os baixos valores atribuídos ao instituto do dano moral, no Brasil, são uma verdadeira distorção do sistema e contribuem diretamente para que causadores de danos continuem adotando condutas abjetas. Sob o manto - ainda que roto - de combate à chamada indústria do dano moral, está se abrindo caminho para a perpetuação das práticas lesivas, em detrimento dos consumidores.
Por mais que legislação e jurisprudência convirjam no sentido de responsabilização das empresas nos casos de atraso na entrega do imóvel, isso não tem sido suficiente para edificar o muro de arrimo fundamental para conter práticas empresariais deletérias e equilibrar a coexistência entre liberdade econômica e proteção dos consumidores.
Considerando a relação de hipossuficiência dos consumidores diante dos players do setor imobiliário, é premente a necessidade de endurecimento das condenações judiciais para que as empresas observem o dever de cuidado, fazendo com que a adoção de comportamentos responsáveis passe a ser um requisito básico para sua sobrevivência no mercado - e não mero diferencial.