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Fim da escala 6x1: o que diz a proposta que reduz jornada de trabalho para 36 horas semanais

Discussão nas redes sociais está gerando pressões para mudança nas leis trabalhista; mas empresários são contra.

13 nov 2024 - 05h43
(atualizado às 07h27)
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No comércio, escala com 6 dias de trabalho e 1 de folga é comum
No comércio, escala com 6 dias de trabalho e 1 de folga é comum
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Uma mobilização nas redes sociais em torno da jornada de trabalho está provocando uma discussão para alterar direitos dos trabalhadores previstos na Constituição.

Alguns internautas estão fazendo campanha para que deputados apoiem uma Proposta de Emenda Constitucional apresentada pela deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP) que reduziria a jornada de trabalho legal no Brasil para 36 horas por semana. Um abaixo-assinado coordenado por um movimento fundado por um ex-balconista de farmácia já atraiu mais de 2 milhões de assinaturas.

A discussão começou depois de uma campanha mobilizar trabalhadores contra a chamada "escala 6x1", em que se trabalha seis dias por semana para uma folga.

"Se você ainda não sabe o que é essa tal de escala 6x1, ela é uma escala de trabalho permitida pela nossa legislação na qual se trabalha 6 dias seguidos, e se folga apenas um dia por semana", diz Hilton em uma postagem no X.

"Isso tira do trabalhador o direito de passar tempo com sua família, de cuidar de si, de se divertir, de procurar outro emprego ou até mesmo se qualificar para um emprego melhor. A escala 6x1 é uma prisão, e é incompatível com a dignidade do trabalhador."

A redução da jornada de trabalho proposta por Hilton promoveria no Brasil uma escala do tipo 4x3 — ou seja, com trabalho em quatro dias por semana para três dias de folga. A parlamentar defende que isso seja feito sem redução salarial. No entanto, parlamentares e entidades empresariais criticam a proposta, e dizem que ela acarretaria em prejuízos econômicos, aumento de custos e desemprego.

Entenda abaixo a discussão.

O que é a escala 6x1?

No Brasil, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) estabelece que funcionários não podem trabalhar mais de 8 horas por dia ou 44 horas por semana — com possibilidade de duas horas extras por dia, mediante acordo trabalhista.

A escala de trabalho — ou seja, como essas horas são divididas por dia de trabalho — não é estipulada pela lei.

Assim, as empresas podem definir a escala como quiserem. A escala mais comum é a 5x2 — de cinco dias trabalhados, com dois de folga.

Mas no comércio, por exemplo, uma das escalas mais comuns é a 6x1 — com seis dias de trabalho para um dia de folga.

Há dois tipos de escala mais comuns dentro da 6x1:

  • 7 horas e 20 minutos por dia
  • ou 8 horas diárias com alguns dias mais curtos, para compensar

Uma das reclamações dos trabalhadores é sobre o dia de descanso — que deveria ser preferencialmente tirado no domingo, para coincidir com o de familiares e amigos, mas muitas vezes é tirado no meio da semana.

Quem é Rick Azevedo, que começou esse movimento?

O fim da escala 6x1 é a principal meta de um movimento chamado "Pela Vida Além do Trabalho" (VAT), fundado por Rick Azevedo, um ex-balconista de farmácia que se elegeu vereador pelo PSOL no Rio de Janeiro na eleição passada.

Azevedo trabalhava na farmácia em 2023 quando gravou um vídeo que viralizou no TikTok.

O vídeo foi gravado pouco depois de sua chefe ligar para ele em sua folga e pedir que ele entrasse mais cedo no trabalho no dia seguinte.

"Quando é que nós da classe trabalhadora iremos fazer uma revolução nesse país contra essa escala 6x1? Gente, é uma escravidão moderna. Moderna não: ultrapassada", diz Azevedo no vídeo.

@rickazzevedo

Até quando essa escravidão?? 😡 #clt #escala6x1 #fy

♬ som original - Rick Azevedo

"Eu que não tenho filho, que não tenho nada, que sou sozinho, não dá para fazer as coisas. Imagina quem tem filho, quem tem marido, quem tem casa para cuidar".

"A pessoa tem que se doar para a empresa seis dias na semana e só um dia para folgar. E isso por salário mínimo. Gente, não dá."

O vídeo explodiu em visualizações e Rick passou a fazer campanha pelas redes sociais pelo fim da escala 6x1.

Foi criado então o movimento "Pela Vida Além do Trabalho", com um abaixo-assinado na internet apoiado por mais de 2 milhões de pessoas.

"A gente tem uma ilusão que a CLT protege. Mas a CLT está defasada desde a última reforma trabalhista. Tem trabalhadores sendo explorados", disse Azevedo à BBC News Brasil em maio.

O movimento propõe a "revisão da escala de trabalho 6x1 e a implementação de alternativas que promovam uma jornada de trabalho mais equilibrada, permitindo que os trabalhadores desfrutem de tempo para suas vidas pessoais e familiares".

A proposta ganhou engajamento nas redes sociais, com opiniões contra e a favor da redução da escala.

"É óbvio que eu quero o fim da escala 6 por 1", disse a atriz Luana Piovani para seus 5,4 milhões de seguidores no Instagram. "Não é possível que as pessoas não tenham consciência de classe, não tenham generosidade, empatia, sororidade, dororidade, compaixão."

Já o influenciador Léo Picon chamou a proposta de "ideia populista".

"Sabe o que daria mais tempo para o trabalhador do que tirar o 6º dia da escala de trabalho de 44 horas semanais? Ficar menos de 2h no trânsito todos os dias, creches e escolas em período integral, não sufocar salários em impostos que não retornam, diminuir a taxa de juros, educação pública que contribua para o crescimento profissional…", escreveu em sua conta no X, onde tem 1,1 milhão de seguidores.

O Congresso vai acabar com a escala 6x1?

A ideia de Rick Azevedo foi levada adiante pela deputada federal Erika Hilton, que em 1º de maio deste ano apresentou uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC).

A deputada afirma ter coletado 134 assinaturas de parlamentares. No entanto, para tramitar no Congresso, o texto precisa de 171 assinaturas.

A mudança proposta pela PEC não fala especificamente sobre a escala. Ela trata da redução da jornada de trabalho semanal.

Hilton quer mudar o artigo 7º da Constituição Federal, que trata dos direitos dos trabalhadores. Hoje a lei diz que o horário normal de trabalho não deve ser maior que oito horas diárias e 44 horas semanais.

A PEC propõe mudar a jornada de trabalho para 36 horas semanais.

"O momento é o de transformar as garantias conquistadas por determinadas categorias profissionais em direito para todos os trabalhadores brasileiros, especialmente, requerendo o fim da escala 6x1 e adoção da jornada de 4 dias no Brasil", diz o texto da PEC, em sua justificativa.

O texto afirma que a redução da jornada de trabalho deve ser implementada sem redução de salário.

Uma redução de oito horas semanais na jornada de trabalho — de 44 horas para 36 horas — implicaria na adoção de uma escala 4x3 para a maioria das empresas.

O que diz o governo Lula?

Na segunda-feira (11/11), o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, disse que a redução da jornada de trabalho deveria ser tratada por convenções e acordos coletivos de trabalho.

"O Ministério do Trabalho entende que a questão da escala de trabalho 6x1 deve ser tratada em convenções e acordos coletivos de trabalho. A pasta considera, contudo, que a redução da jornada para 40 horas semanais é plenamente possível e saudável, quando resulte de decisão coletiva."

A reação do ministro foi criticada por defensores do fim da escala 6x1 — que pedem apoio direto do governo de Luiz Inácio Lula da Silva à causa.

Com o crescimento do debate, o vice-presidente, Geraldo Alckmin, afirmou nesta terça-feira (12/11) que a redução da jornada é um tema global, mas que cabe à sociedade e ao Congresso fazer essa discussão.

"Isso não foi ainda discutido, mas acho que é uma tendência no mundo inteiro. À medida que a tecnologia avança, você pode fazer mais com menos pessoas, você ter uma jornada melhor. Esse é um debate que cabe à sociedade ao parlamento a sua discussão", afirmou Alckmin.

O que é a escala 4x3?

O texto cita algumas experiências já feitas com a escala 4x3, como um projeto-piloto realizado em setembro do ano passado pelas entidades Reconnect Happiness at Work, 4 Day Week Global e Boston College.

"Cerca de 22 empresas com até 250 colaboradores aderiram à iniciativa (...) É possível observar menor número de faltas dos empregados e produtividade em alta", defende o texto da deputada.

No site do movimento 4 Day Week Global, os organizadores dizem que o projeto-piloto teve dados coletados pela Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV-EAESP).

Segundo o movimento, "61,5% dos participantes observaram melhorias na execução de projetos, 44,4% relataram uma capacidade aumentada de cumprir prazos, 82,4% sentiram um aumento de energia para realizar tarefas e 62,7% experimentaram redução no estresse no trabalho".

"Além disso, 85,4% notaram um incremento na colaboração entre colegas, enquanto 65% relataram uma redução na exaustão e 74% observaram uma melhoria na saúde física. Em termos financeiros, 72% das empresas participantes relataram um aumento na receita durante o período do piloto."

Neste mês, o 4 Day Week Global começou outro projeto-piloto de seis meses no Reino Unido, em que 17 empresas vão experimentar o modelo de semana com quatro dias de trabalho.

Quem é contra a redução da jornada?

Alguns parlamentares conservadores — como Nikolas Ferreira (PL-MG) e José Medeiros (PL-MT) — e empresários são contra as mudanças propostas na lei.

A Confederação Nacional do Comércio (CNC) afirma que não é possível reduzir a jornada de trabalho sem reduzir o salário dos funcionários. A entidade representa mais de 4 milhões de empresas, responsáveis por 23,8 milhões de empregos diretos e formais.

"Embora entendamos e valorizemos as iniciativas que visam promover o bem-estar dos trabalhadores e ajustar o mercado às novas demandas sociais, destacamos que a imposição de uma redução da jornada de trabalho sem a correspondente redução de salários implicará diretamente no aumento dos custos operacionais das empresas", diz uma nota da CNC divulgada na segunda-feira (11/11).

A entidade avalia que a PEC provocaria uma onda de demissões no país e possível aumento de preço para consumidores.

"O impacto econômico direto dessa mudança poderá resultar, para muitas empresas, na necessidade de reduzir o quadro de funcionários para adequar-se ao novo cenário de custos, diminuir os salários de novas contratações, fechar estabelecimento em dias específicos, o que diminui o desempenho do setor e aumenta o risco de repassar o desequilíbrio para o consumidor", argumenta a CNC.

O impacto maior seria sentido pelos setores de comércio e serviços que "exigem uma flexibilidade que pode ser comprometida com a implementação da semana de quatro dias, dificultando o atendimento às demandas dos consumidores e comprometendo a competitividade do setor".

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