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IA e machine learning na Saúde: é a hora certa de investir

Enquanto debate a sustentabilidade econômica do setor, a Saúde já encontra na tecnologia exemplos práticos contra o desperdício

10 jan 2023 - 02h30
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Foto: Unsplash

Diagnósticos mais precisos, cuidados terapêuticos cada vez mais rápidos e acessíveis, criação de protocolos de saúde assertivos e desenvolvimento de medicamentos personalizados e mais eficazes. Essas são apenas algumas das vantagens que a inteligência artificial (IA) pode trazer para a medicina, já que ela é capaz de identificar relações significativas em dados brutos – como relatórios médicos, registros de pacientes e ensaios clínicos – e cruzar esse conhecimento a dados populacionais. 

Na gestão de Saúde, os insights que podem ser revelados pela inteligência artificial e pelo aprendizado de máquina são de igual importância. Mesmo assim, ainda são poucos os players da Saúde que estão usando todo esse potencial em novos negócios. 

Quem já aderiu a essa transformação digital consegue fazer hoje uma gestão dos recursos com mais segurança, sem abrir mão da qualidade do serviço ofertado. É justamente o caso de algumas healthtechs nacionais que estão eliminando desperdícios característicos desse setor, como a duplicidade de pedidos de exames, com a ajuda da informação.

“Startups que oferecem consultas a preços populares e planos de saúde digitais são alguns exemplos de novos negócios que foram facilitados e potencializados pelo uso dos dados”, conta Paulo Fernandes Silvestre, mestre em tecnologias da inteligência e design digital, que complementa: “Muitas vezes, o uso da inteligência artificial e do machine learning não está na área assistencial, mas na gestão em Saúde, como para reduzir fraudes, por exemplo”.

“Já que a inteligência artificial é a tecnologia usada para a identificação de padrões, quando aplicado em auditorias e acompanhamento de contas médicas, esse recurso tem trazido ótimos resultados”, revela o especialista.

Além disso, os sistemas dotados de inteligência artificial conseguem antecipar sobrecargas de leitos assistenciais ou falta de medicamentos, o que permite à gestão hospitalar e até à gestão da saúde pública uma tomada de decisão preventiva. Na ponta assistencial, já há estudos que calculam a redução de custos de tratamento a partir da aferição personalizada do uso de drogas quimioterápicas. Dessa forma, o paciente recebe uma dose menos tóxica e com a mesma eficiência esperada ao seu tratamento.

Possibilidade é o que não falta

Na área de sinais e imagens, há ainda mais aplicações já disponíveis, como lembra Renato Sabbatini, diretor de Educação em Saúde Digital da Associação Brasileira CIO Saúde (ABCIS) e um dos pioneiros da informática em Saúde na América Latina: “É o caso do diagnóstico automático de ECG, que promove a detecção de fibrilação atrial e o processamento de sinais gerados pelos pacientes em wearables, como os smartwatches. Já no processamento de imagens em si, embora os sistemas baseados em aprendizado de máquina estejam registrando alta eficiência, a verdade é que ainda estão bem longe de serem utilizados na rotina da radiologia, talvez por sua utilidade ainda ser bastante limitada.” 

Outra área de aplicação que se desenvolveu celeremente e é muito adotada é a NLP – Natural Language Processing –, com conversão texto-voz e voz-texto e chatbots inteligentes, embora, em muitos casos, o uso desse tipo de tecnologia ainda se mostre extremamente impreciso e, por vezes, perigoso, quando voltados para orientações assistenciais aos pacientes.

“Existe muito ‘hype’ nesse tipo de tecnologia, como já aconteceu nas ondas anteriores, que foram seguidas de ‘invernos’. Apesar do grande alarde, ainda são poucas as aplicações da IA e ML em uso rotineiro na prática clínica”, deixa claro Sabbatini. E é aí, também, que mora a oportunidade.

Ainda que a tecnologia IA e ML já estejam presentes na Saúde, é fato que ainda carecemos de profissionais que entendam tanto da assistência como da gestão e do negócio em si. Trabalhando próximos aos desenvolvedores, eles devem ser capazes de otimizar soluções que, de fato, ajudem o setor a prosperar.  

“A Apple, a SAP e a IBM são exemplos de empresas de tecnologia que já estão investindo em Saúde, mesmo que o negócio primário deles seja outro. Resta aos players de Saúde fazer o caminho contrário – ou seja, investir em mais tecnologia – para que as duas partes se encontrem no meio do caminho em um futuro próximo”, recomenda Paulo Silvestre. 

Investir ainda é caro?

Sistemas de IA e ML avançados dependem de alta capacidade computacional e investimentos, isso é claro. E saber disso pode deixar muitas instituições receosas de transpassar essa barreira tecnológica para apostar na inovação – o que não faz mais sentido desde que o modelo de negócios da tecnologia mudou, como deixa claro Sabbatini: “A concorrência da AWS, Microsoft, Google e outras bigtechs em oferecer serviços de computação na nuvem para as áreas de IA e ML, como o Tensor Flow, tem deixado os custos mais acessíveis. Além disso, ferramentas de software e banco de dados para processamento hiperparalelo, bem como storage praticamente ilimitado na web, estão alavancando muitas iniciativas tecnológicas que teriam custo proibitivo no passado”.

Medicina, afinal, é arte

Mesmo com tanta inovação e vontade de mudar o status quo do setor, ainda há risco de novos negócios esbarrarem em questões culturais, como falta de capacitação dos profissionais de Saúde ou até mesmo a preferência do paciente pelo toque humano do médico em vez das análises feitas pela “máquina”: “Hipócrates já dizia que a medicina não é apenas ciência, mas também arte, a Ars Cvrandi, em latim. A capacitação dos profissionais no uso dessas tecnologias é essencial, no entanto ainda não temos cursos, disciplinas e professores em número suficiente para introduzir o tema nos currículos de graduação e pós-graduação”, alerta Sabbatini. 

Porém, os órgãos reguladores de tecnologias de saúde, como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), já estão avançando nesses aspectos, como demonstra a recente regulação RDC 657/2022 sobre Software como um Dispositivo Médico (Software as a Medical Device – SaMD), que será um enorme desafio para todos os desenvolvedores de soluções nos próximos anos.

Enquanto as aplicações da IA e ML têm potencializado soluções em Saúde, grande parte graças às iniciativas de healthtechs e/ou às ferramentas disponibilizadas pelas big techs, as barreiras éticas e culturais ainda se impõem e pedem por mais discussões de todos os atores envolvidos. Afinal, agora é a hora certa de investir – ainda mais – nesse tipo de solução. 

(*) Renata Armas é redatora do Unbox.

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