Ibovespa cai 0,82% e dólar vai a R$ 5,19 com novos ataques de Lula ao BC
Índice não acompanhou a melhora das referências de NY, que se ajustaram a novos comentários do presidente do Federal Reserve, bem recebidos pelos investidores globais
Sem ter mudado de sinal, o Ibovespa encerrou esta terça-feira, 7, em baixa de 0,82%, aos 107.829,73 pontos, em sessão, como ontem, de volume financeiro enfraquecido, hoje a R$ 22,5 bilhões. O principal índice da B3 acompanhou a alguma distância a melhora dos índices de Nova York, que se ajustaram em parte da tarde a novos comentários do presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, bem recebidos a princípio pelos investidores globais. O dólar emendou a terceira sessão consecutiva de valorização no mercado doméstico de câmbio, cotado a R$5,1998, maior valor de fechamento desde 23 de janeiro.
A mínima da moeda americana foi a R$ 5,1335 e máxima a R$ 5,2077, a divisa encerrou o pregão em alta de 0,50%. Em fevereiro, a moeda já acumula ganhos de 2,42%. Entre a mínima e a máxima do dia, o Ibovespa oscilou entre 107.233,94 (-1,37%), menor nível intradia desde 5 de janeiro, e 109.037,00 pontos, saindo de abertura aos 108.726,78. Na semana, o índice cede 0,64%; no mês, 4,94% e, no ano, 1,74%. O nível de fechamento também foi o menor desde o último dia 5 (107.641,32 pontos), vindo o Ibovespa, ontem, de leve ganho de 0,18% que havia interrompido série de três perdas, todas acima de 1%.
Nos Estados Unidos, os ganhos não se sustentaram em parte da etapa vespertina, mas as três referências de NY, após terem oscilado para mínimas da sessão no meio da tarde, também com Powell, conseguiram fechar o dia ainda em alta, de 0,78% (Dow Jones), 1,29% (S&P 500) e 1,90% (Nasdaq). Embora tenha ponderado que pode elevar os juros além do esperado pelo mercado caso a economia americana continue dando sinais fortes, Powell repetiu que o processo de desinflação está em curso, mesmo com o mercado de trabalho ainda bastante aquecido e disse esperar que 2023 seja um ano de "quedas significativas" da inflação.
Se, nos Estados Unidos, Powell falou em alguns momentos o que o mercado gostaria de ouvir, a pressão em base diária do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre o "cidadão" Roberto Campos Neto não passa despercebida aqui, mantendo os investidores na defensiva com relação à política monetária vis-à-vis a política fiscal, no que vai ganhando aspecto de queda de braço - e junto a alguém que, como Lula, tem mandato temporalmente definido.
Segundo operadores, os ataques ao BC promovidos pelo petista também impediram que o real acompanhasse o sinal de baixa da moeda americana frente a divisas emergentes pares, como peso mexicano, chileno e rand sul-africano, e de países exportadores de commodities.
Ataques ao Banco Central
Hoje, o PSOL, partido próximo ao governo, indicou que apresentará, ainda nesta terça, proposta para pôr fim à independência do BC. Líder do PSOL na Câmara, o deputado Guilherme Boulos (SP) afirmou hoje que o presidente do Banco Central é um "infiltrado" do ex-presidente Jair Bolsonaro - e que faria "boicote" à economia com a manutenção da Selic em nível alto.
Em encontro com a "mídia independente" hoje, ao mencionar a perspectiva de crescimento "pífio" este ano, Lula pareceu atribuir a situação a Campos Neto. Hoje, a ata do Copom, mais branda do que o comunicado sobre a decisão de política monetária da semana passada, quando o BC manteve a Selic em 13,75% ao ano, foi interpretada por parte dos analistas como um gesto de contemporização ao governo.
Mas não o suficiente para aplacar as críticas de Lula, que retomou a ofensiva nesta terça-feira, sugerindo que pode interferir na instituição. Lembrou que "temos duas pessoas no Conselho Monetário Nacional e tem mais gente para a gente indicar no Banco Central". Os mandatos de dois diretores expiram no fim do mês - o de Política Monetária, Bruno Serra, e o de Fiscalização, Paulo Souza.
"A ata do Copom não veio em tom tão duro quanto a impressão deixada pelo comunicado da semana passada", observa Camila Abdelmalack, economista-chefe da Veedha Investimentos. Contudo, "a ata mostra ainda preocupação com a orientação da política fiscal e a responsabiliza pela manutenção da taxa de juros elevada por período prolongado", acrescenta.
"Há muita incerteza com relação à coordenação entre as políticas fiscal e monetária, elevando a percepção de risco sobre a economia brasileira, o que se agrava com as críticas do presidente Lula sobre a independência do BC e o sistema de metas de inflação, refletindo-se nos prêmios para o financiamento da dívida do Tesouro", conclui a economista.
"O mercado segue atento aos palpites de Lula sobre o Banco Central, o que traz volatilidade. No meio da tarde, tivemos a fala do Powell, em que reforçou, em dado momento, que aumentos de juros podem ainda se fazer necessários, caso a inflação e a economia se mantenham fortes", diz Rodrigo Moliterno, head de renda variável da Veedha Investimentos.
Mercado vê possível interferência na Petrobras
Entre as empresas e os setores na B3, ele chama atenção para Petrobras na sessão, descolada da alta de mais de 3% para o Brent, refletindo o anúncio, pela estatal, de redução no preço do diesel A nas refinarias, de 8,8%, o que o "mercado interpretou como um começo de interferência do novo presidente", levando em conta que o petróleo se mantém em patamar elevado, assim como o dólar frente ao real. "Não faria tanto sentido essa redução agora", aponta Moliterno.
Para Dennis Esteves, especialista em renda variável da Blue3, a fala de Powell "foi um banho de água fria quanto à expectativa para os juros lá fora", depois da forte leitura da sexta-feira passada sobre a geração de vagas de trabalho nos Estados Unidos em janeiro, muito acima do esperado para o mês. "Powell disse hoje que se os dados do mercado de trabalho seguirem fortes, o pico das taxas de juros terá de ser mais alto", acrescenta Esteves, o que contribuiu também, aqui, para o avanço do dólar frente ao real na sessão, em alta de 0,50%, a R$ 5,1998.
No Brasil, além do prosseguimento das críticas de Lula apesar do tom "amigável" da ata do Copom, Esteves enfatiza o corte do diesel, interpretado por analistas como "precipitado" e sinal de "intervenção" do governo nos preços da Petrobras.
Na ponta perdedora do Ibovespa, destaque nesta terça-feira para Locaweb (-6,90%), BRF (-6,83%) e Marfrig (-5,15%), com Embraer (+3,10%), Minerva (+1,48%) e Gerdau (+1,43%) no lado oposto. Petrobras ON e PN cederam respectivamente 0,52% e 0,62%, enquanto Vale ON avançou 0,66%. As ações de grandes bancos encerraram o dia com perdas até 2,31%, em Itaú PN, antes da divulgação do balanço trimestral da instituição financeira.