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Congresso deve segurar reformas e priorizar Orçamento

Percepção é a de que atos de teor antidemocrático do 7 de Setembro devem escantear de vez a agenda econômica de Paulo Guedes

9 set 2021 - 17h01
(atualizado às 17h27)
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O agravamento da crise política e institucional, após as manifestações de teor antidemocrático no 7 de Setembro, deve escantear de vez a agenda econômica do ministro Paulo Guedes da pauta do Congresso Nacional. Os parlamentares vão centrar esforços na aprovação do Orçamento de 2022, que precisa ser votado para não comprometer a execução de despesas no ano que vem, mas a tarefa não será fácil. Economistas do mercado estimam que a proposta enviada pela equipe econômica tem um "buraco" de cerca de R$ 70 bilhões.  

Vista do prédio do Congresso Nacional em Brasília
25/07/2017 REUTERS/Paulo Whitaker
Vista do prédio do Congresso Nacional em Brasília 25/07/2017 REUTERS/Paulo Whitaker
Foto: Reuters

O valor descoberto inclui a ampliação do Bolsa Família, ainda sem espaço certo no Orçamento, a fatura adicional provocada pela repercussão da inflação maior sobre benefícios pagos pelo governo e negociações políticas, como a renovação da política de desoneração da folha para empresas e maior volume de emendas parlamentares. A dúvida agora é quanto o Congresso vai abrir de espaço para novos gastos em ano eleitoral, o que provoca volatilidade adicional no mercado financeiro.

Segundo parlamentares, o governo dificilmente terá condições de conseguir aprovar na Câmara e no Senado propostas antes consideradas prioritárias pela equipe econômica, como o projeto que muda o Imposto de Renda e as reformas administrativa e tributária.

Os ataques disparados pelo presidente Jair Bolsonaro, que defendeu inclusive o descumprimento de decisões do STF, empurraram partidos como MDB, Solidariedade, Cidadania, PSDB e PSD para uma postura mais refratária aos projetos do governo. Várias dessas legendas passaram a discutir o impeachment de Bolsonaro, e o PSDB anunciou que a partir de agora será oposição ao governo.

Sem essas siglas, será bem mais difícil o governo formar maioria para aprovar os projetos, e mais ainda para passar as Propostas de Emenda à Constituição, que precisam de quórum de 3/5 para aprovação em dois turnos de votação. São PECs a reforma administrativa e a proposta para mudar o pagamento de precatórios. Mesmo sem parcelamento, uma PEC para resolver o "meteoro" de R$ 89,1 bilhões em dívidas judiciais voltou como alternativa depois de Bolsonaro queimar a "ponte" para uma solução via Judiciário.

O vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM), afirma que o presidente da Casa, Arthur Lira (Progressistas-AL), "perde cartuchos" para aprovar as pautas de interesse do governo. "Diante de tantas trapalhadas e tanto descumprimento de compromissos por parte do governo, o presidente Lira, que até aqui tem usado todo o seu prestígio, vai perdendo os seus cartuchos para garantir sozinho as votações, que até hoje são total e exclusivamente fruto da liderança dele", diz. Para ele, o ano legislativo morreu para o governo após os atos do último feriado.

Com o novo cenário depois das manifestações, o vice-presidente da Câmara avalia se apresenta ou não uma PEC para retirar as despesas com precatórios do teto de gastos, a regra que limita o crescimento das despesas à inflação. O texto da proposta está praticamente pronto e daria uma folga de R$ 20 bilhões ao governo, o que viabilizaria a implementação do Auxílio Brasil com um benefício médio de R$ 300, como quer Bolsonaro. A animosidade das manifestações do presidente da República, porém, tem deixado lideranças do Congresso reticentes em adotar uma medida para ajudá-lo, embora a revisão da política social seja considerada meritória.

O tamanho do Bolsa Família é hoje o fator de maior incerteza para os agentes do mercado, que nesta quarta-feira, 8, reagiu negativamente à escalada da crise com o STF. A Bolsa brasileira (B3) fechou em forte queda de 3,78%, aos 113.412,84 pontos, no menor nível desde março. Já o dólar registrou ganho de 2,89%, encerrando na máxima do dia, a R$ 5,3261 - maior valor desde 23 de agosto.

Agenda econômica

O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (Progressistas-PR), minimiza o impacto do acirramento de tensões sobre a agenda econômica. Segundo ele, as pautas devem continuar sendo votadas normalmente. Mas Barros reconhece que o clima pode continuar ruim. Crítico do STF, ele diz ao Estadão/Broadcast que, com as manifestações, o "recado está dado" ao Supremo e, sem mudanças na postura da Corte, "vamos continuar com a corda esticando". "Acho que vai continuar como está. O ambiente não é bom", afirma.

Um termômetro do apoio ao governo poderá ser observado durante audiência na Câmara para debater a PEC dos precatórios, marcada para esta quinta-feira, 9, e que terá a presença de integrantes do Ministério da Economia.

No Senado, onde o governo já vem acumulando derrotas expressivas, lideranças aliadas do Palácio do Planalto fizeram um apelo ao presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), para que projetos da agenda econômica sejam pautados, como a reforma do Imposto de Renda e a privatização dos Correios. Não houve, porém, compromisso definitivo com avanços.

O presidente do MDB, deputado Baleia Rossi (SP), diz que "não há uma agenda certa" para o pós-manifestações. "Acho que há clima para aprovar o Refis (parcelamento de débitos tributários), e dificilmente passa o projeto do Imposto de Renda no Senado, pois o projeto é muito ruim", diz. Segundo ele, uma solução para os precatórios que implique num calote é improvável. "Já o Orçamento acho que o próprio Congresso tem interesse, senão não executa no início de 2022", avalia.

Mercado

Há uma percepção no próprio mercado que é melhor focar no Orçamento do que seguir aprovando projetos considerados ruins, como a reforma do Imposto de Renda. Ainda assim, segundo apurou o Estadão, o nervosismo do mercado é maior porque, mesmo com uma solução para os precatórios, o Orçamento continuará muito apertado para tantas demandas eleitorais. Só a alta recente da inflação deve elevar o custo com benefícios sociais em R$ 17 bilhões, devido ao maior reajuste que terá de ser dado. Além disso, não foram previstos recursos para as chamadas emendas de relator, pelas quais os parlamentares enviam recursos adicionais às suas bases eleitorais e que têm crescido nos últimos anos. O mercado teme a repetição do filme de 2021, em que houve maquiagem de despesas obrigatórias para acomodar interesses políticos.

Depois do duro pronunciamento do presidente do STF, Luiz Fux, em resposta a Bolsonaro, o mercado também passou a ver risco de a Corte prejudicar o processo de privatização da Eletrobras. Partidos de oposição ao governo ingressaram com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) para tentar derrubar a lei que autoriza a operação.

A economista e colunista do Estadão, Ana Carla Abrão, alerta para o risco de o Congresso aprovar reformas com mais retrocessos e esvaziamento, como a administrativa, cujo parecer foi apresentado na semana passada. "Essa boiada está passando", diz ela, que considera que o relator, deputado Arthur Maia (DEM-BA), cedeu às pressões das corporações de servidores e esvaziou o texto.

Conheça a agenda econômica do governo no Legislativo:

  • PEC dos precatórios:

O governo precisa de solução para "meteoro" de R$ 89,1 bilhões em dívidas judiciais previstas para serem quitadas em 2022, sob pena de não ter espaço para outras políticas em ano eleitoral. Solução via Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ficou mais difícil diante de embates entre o presidente Jair Bolsonaro e o STF.

  • Auxílio Brasil:

Versão turbinada do Bolsa Família, precisa sair do papel ainda neste ano para não esbarrar nas limitações da lei eleitoral. No entanto, reajustes previstos nos benefícios dependem da solução dos precatórios.

  • Orçamento de 2022:

Única medida com maior chance de avançar, carrega, porém, dificuldades, como a própria fatura dos precatórios e a falta de espaço para o Auxílio Brasil.

  • Reforma do IR:

Aprovada na Câmara dos Deputados, deve enfrentar resistência no Senado e acumula críticas de especialistas por distorcer ainda mais a tributação sobre a renda no País.

  • Reforma tributária:

Reúne mudanças para além do IR, também depende de maior consenso entre parlamentares, o que pode ser difícil em meio a ambiente político conturbado.

  • Reforma administrativa:

Muda as regras no serviço público, mas não foi aprovada nem na Câmara nem no Senado. Pode acabar perdendo força.

Estadão
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