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Mercado se opõe à retirada do Auxílio do teto de gastos; decisão ganha força na equipe de Lula

Analistas financeiros alertam que retirada de programa da regra fiscal, que equipe de Lula discute com o Congresso na forma de PEC, coloca em risco as contas públicas

10 nov 2022 - 05h10
(atualizado às 10h53)
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Lei aprovada em agosto prevê oferta do consignado a beneficiários do Auxílio Brasil.
Lei aprovada em agosto prevê oferta do consignado a beneficiários do Auxílio Brasil.
Foto: Marcello Casal Jr/ Agência Brasil / Estadão

BRASÍLIA - Investidores do mercado financeiro reagiram mal à alternativa em avaliação pela equipe do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de retirar de forma permanente as despesas do programa de transferência de renda do teto de gastos, a regra que limita o crescimento das despesas à inflação. A medida é uma das opções na mesa para viabilizar o Auxílio Brasil (que deve voltar a se chamar Bolsa Família) de R$ 600 no ano que vem.

A preocupação se dá porque a alternativa vem ganhando força na equipe de transição nos últimos dias - que, há poucos dias, priorizava apenas criar o chamado "waiver", uma licença para gastar, por meio da PEC da Transição. Nesta quarta-feira, 9, o deputado federal reeleito e líder do PT na Câmara, Reginaldo Lopes (MG), defendeu a retirada do programa social do teto de forma permanente. Na terça, o presidente da Comissão Mista de Orçamento, deputado Celso Sabino (União-PA), falou em "excepcionalizar" o programa da regra fiscal.

Para o mercado, a saída que vem sendo negociada pela equipe de transição, que também teria de ser feita via PEC, pode deteriorar a trajetória de sustentabilidade da dívida pública. "Tirar os programas sociais do teto, para mim, é a pior das possibilidades. Não que os programas sociais não sejam importantes, pelo contrário. São muito importantes e têm ganhado espaço no Orçamento. Mas, à medida que você tira uma classe de gastos do teto, ele passa a não ter referência para frente", afirma Caio Megale, economista-chefe da XP Investimentos. "Sem regra, o gasto vai poder crescer sem precisar cortar de outro lugar. É uma alternativa que fragiliza muito a gestão da política fiscal para frente, a previsibilidade da política fiscal."

A retirada do programa social do governo sempre foi um desejo do mundo político, sobretudo depois da pandemia da covid-19, quando a elevação das despesas do Auxílio Brasil comprimiram ainda mais o espaço orçamentário para outras políticas, pelas amarras do teto de gastos.

Excluir do teto os gastos de R$ 175 bilhões do programa abriria um espaço no Orçamento de 2023 para outras despesas, como o aumento do salário mínimo, em R$ 105 bilhões. A diferença se deve ao incremento do Bolsa Família com as promessas feitas por Lula na campanha, como a manutenção dos R$ 600 (R$ 52 bilhões) e R$ 150 para famílias com crianças de até seis anos (R$ 18 bilhões).

"Tirar esse gasto social do teto cria dois problemas: primeiro que você vai encher o teto com outras despesas; depois, o programa que sai do teto fica ilimitado daqui para frente", diz Megale. "Quanto mais medidas você tira do teto, mais difícil vai ficando controlar as despesas e, portanto, controlar a dívida, que ao fim e ao cabo é onde nós estamos querendo chegar: uma previsibilidade da evolução do endividamento público brasileiro."

Luiz Fernando Figueiredo, ex-diretor de política monetária do Banco Central e presidente da gestora Mauá Capital, também avalia que zelar pela trajetória da dívida pública deve ser uma prioridade. "Nós precisamos em algum momento ter um superávit primário da ordem de 2% a 2,5% do PIB, e não pode demorar muito. Sem isso, nós não teremos uma dívida/PIB estável com uma pequena tendência de redução, que é o que o Brasil precisa. O que você pode é temporariamente fugir desse número, mas não permanentemente", afirma.

Ele ainda defende que o chamado "waiver", a licença para gastar, fique na casa dos R$ 100 bilhões. "O waiver é nessa direção: gerar uma folga fiscal para você poder trabalhar o resultado fiscal para que ele melhore nos anos seguintes. Uma coisa muito diferente disso é muito problemática. Qualquer medida que não cuide de estabilizar a dívida/PIB no tempo vai ter um custo muito alto. O mercado vai ficar muito estressado - e com razão. O Brasil já tem a maior dívida dentre todos os emergentes, não dá para brincar. Um pouco mais e ela se torna impagável", diz Figueiredo.

Na avaliação de outra fonte do mercado, a medida em estudo abre uma magnitude para novas despesas tão grande que, depois, o País não conseguiria mais gerar fechar as contas no azul.

Integrantes da equipe de Lula avaliam, segundo apurou o Estadão, que a medida é a mais viável entre as propostas cotadas pois tem a vantagem da previsibilidade, embora vá mexer com o mercado de juros e de câmbio num primeiro momento. Segundo fontes, as despesas públicas aumentariam de 19% para 19,3% do PIB e deveriam ser acompanhadas por propostas de aumento de receitas - o que é difícil no início de governo, admitem.

Estadão
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