Empresária deixa projeto da ONU para modernizar alambique
Dona da Cachaça da Quinta trocou trabalho como fonoaudióloga e consultora das Nações Unidas para administrar empresa da família
Até 2000, Katia Alves Espírito Santo tinha uma carreira de sucesso como fonoaudióloga, atuando até como consultora da ONU em programas de assistência a crianças vítimas de guerra em Angola e Moçambique. Nessa época, porém, seu pai, já adoentado, a convenceu a assumir o alambique da família, localizado na região serrana do Rio de Janeiro. Katia aceitou o desafio e hoje não só modernizou a fábrica da Cachaça da Quinta como é presidente da Associação dos Produtores de Cachaça do Estado do Rio de Janeiro (Apacerj).
“Sou a terceira geração a produzir a Cachaça da Quinta. Sempre tive uma relação de afeto com a fábrica da família, e um dia meu pai falou ‘bem que você podia cuidar da organização da fábrica, você é boa para essas coisas.’ No início conciliava com o trabalho de fonoaudióloga, depois me dediquei totalmente à fabrica e hoje sou presidente da Apacerj”, conta Katia.
A empresária explica que sua família começou a produzir cachaça quando seu avô português comprou uma propriedade rural no município de Carmo, na região serrana do Rio de Janeiro, em 1923. Junto com ela veio a fábrica de cachaça, hoje principal atividade da propriedade. “Ele veio cedo para o Brasil e antes de comprar a fazenda já se interessava pelo sistema de produção. Naquela época era um saber que circulava mais facilmente, a própria mão de obra já conhecia o processo. Havia funcionários que estavam na produção havia muitos anos. Ele adaptou, organizou e se destacava por adotar padrões sanitários mais exigentes do que o que vigorava na época”, afirma a empresária. O negócio passou para o seu pai e, finalmente, para ela.
Gestão e pesquisa
Katia começou a administrar a fábrica em 2000 e deu início a um processo de modernização do negócio. Como fonoaudióloga, ela havia se especializado em metodologia de pesquisa e em gestão social, e aplicou parte desses conhecimentos em gestão e pesquisa nos negócios. Na falta de uma bibliografia especializada sobre a produção de cachaça, foi buscar ajuda em quatro consultores, cursos e até na literatura da produção de outros destilados. “Cada destilado tem suas particularidades mas todos eles têm uma base comum.” Ela acredita que as empresas suprem a demanda do conhecimento de nicho que a academia não consegue. “É por isso que o setor tem se modernizado e crescido”.
Depois de reunir conhecimentos sobre a produção da cachaça, Katia começou a implantá-los na fábrica ao automatizar o processo de fabricação. Em 2007 produziu a primeira safra com o novo método, que começou a ser comercializada em 2009. Foi sob a supervisão de Katia que a produção ultrapassou o mercado regional e hoje chega a grandes centros em mercados gourmets, restaurantes e bares do Rio de Janeiro e São Paulo, e até destinos internacionais como Taiwan e Estados Unidos.
Medalha de ouro
A fama do alambique já vinha desde os tempos do avô, mas foi durante a gestão de Katia que a empresa alçou voos mais altos. A Cachaça da Quinta Amburana acaba de ganhar a medalha de ouro no Concurso Mundial de Bruxelas – Spirits Selection, espécie de Oscar dos destilados, que, apesar do nome, este ano foi realizado em Florianópolis.
O evento foi patrocinado pelo Sebrae, que isentou as inscrições para pequenos produtores de cachaça parceiros da entidade. “Conseguimos que os produtores enviassem as amostras sem pagar os 300 euros de inscrição. Não é um valor muito alto, mas faz falta para muitos pequenos produtores”, explica Enio Queijada, gerente de Agronegócios do Sebrae. Segundo ele, o evento aumenta a visibilidade das marcas que não teriam dinheiro para divulgar a marca de outra maneira, como com propaganda.
Hoje, a Cachaça da Quinta produz de 50 a 60 mil litros por ano – de 100 a 120 mil garrafas – e três rótulos: a cachaça branca, envelhecida em tonel de aço inox por 10 a 12 meses; a carvalho, armazenada em tonel de carvalho por dois anos; e a amburana, envelhecida em tonel de amburana por dois anos. Todas as cachaças têm certificados de produção orgânica e selo de qualidade do Inmetro. Segundo a empresária, esse é o grande destaque da produção fluminense.