MPT-MA apura se Outback obrigava funcionários a ajoelhar para atender clientes; prática é ilegal?
Caso ganhou repercussão após cliente denunciar prática nas redes sociais; empresa diz que orientação não era para funcionários se ajoelharem, mas sim para buscar contato visual com o cliente
O Ministério Público do Trabalho no Maranhão (MPT-MA) afirmou que recebeu uma denúncia contra a unidade de São Luís (MA) do Outback, sobre funcionários estarem atendendo clientes de joelhos. "A notícia de fato foi transformada em procedimento preparatório. A partir de agora, o MPT-MA vai requisitar e oficiar os envolvidos para obter mais informações", diz o órgão, em nota. "Conforme o andamento das investigações, o MPT-MA poderá instaurar inquérito civil ou arquivar o caso."
O caso ganhou repercussão após uma cliente postar um vídeo nas redes sociais, relatando que os funcionários da unidade em questão a atenderam de joelhos. "Eu falei 'moça, levanta, não precisa atender a gente assim'", diz a usuária identificada como Ana Beatriz Isaias no vídeo. Ela também relata que uma das funcionárias afirmou que aquilo era uma "tradição do Outback" e que seu joelho doía.
O Outback afirmou ao Estadão que a orientação nunca foi para os funcionários se ajoelharem, mas sim para buscar contato visual com o cliente, sentando-se à mesa ou se agachando. O objetivo seria criar proximidade e oferecer um ambiente hospitaleiro para clientes e funcionários. O procedimento "foi naturalmente se extinguindo", disse a empresa, principalmente em meio à pandemia, e se tornou opcional, persistindo pontualmente.
A rede de restaurantes destacou que determinou no último domingo, 19, um dia antes de o MPT-MA receber a denúncia, que vai extinguir a prática de agora em diante. "Temos orientado nossas unidades para que não seja mais adotada. Essa orientação será mais uma vez reforçada em todos os nossos restaurantes", disse o Outback, em nota (leia a íntegra da nota no fim da reportagem).
@anabeatrizisaias som original - Ana Beatriz | Advogada
"O eye level, termo em inglês que significa exatamente nível dos olhos, como é conhecida a prática empática de estar no mesmo patamar do cliente que está sendo atendido, nunca incluiu o ato de ajoelhar-se perante o cliente e está completamente desprovida de qualquer conotação de servidão, que é justamente o oposto da proximidade que buscamos criar", afirmou a empresa.
O Outback também informou que, até o momento, não foi procurado ou notificado pelo MPT-MA, mas está à disposição do órgão.
Segundo a advogada Karolen Gualda Beber, coordenadora Trabalhista do escritório Natal & Manssur Advogados, não há uma lei específica que determine se essa modalidade de atendimento é ilegal ou não. No entanto, o empregador deve ficar atento, pois ele é o responsável pela saúde e segurança do seu empregado.
"O empregador tem o dever legal, um dever constitucional, de garantir a segurança e a saúde dos seus empregados. E ele não pode colocar o empregado em circunstâncias que venham a prejudica-lo ou possam vir a causar algum transtorno, dor ou qualquer coisa nesse sentido", explica.
Além de saúde e segurança, Karolen aponta que a questão também pode envolver ética e moral. "Sabemos que a ideia era que o funcionário ficasse na altura dos olhos do cliente. Mas o cliente pode entender errado, como se o atendente estivesse se colocando um uma situação de submissão. Às vezes, essa prática que tinha o objetivo de acolher o cliente pode acabar virando uma situação muito delicada, que poderia ser vista como discriminatória", diz.
A advogada afirma que o MPT-MA agora vai apurar o caso, questionando o Outback e seus funcionários a respeito de como essa prática funcionava no dia a dia, se era colocada como uma sugestão ou uma obrigação.
"O Outback já afirmou que encerrou a prática, mas o MPT-MA poderia obrigá-lo a fazer isso e eventualmente até a pagar uma indenização por danos morais coletivos para os empregados. Também pode fazer o Outback assinar um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), para que ele não mais utilize essa forma de atendimento. Ou então, se o órgão entender que não havia nenhuma irregularidade nessa prática, ele pode determinar o arquivamento do processo", conclui Karolen.
Leia a nota do Outback na íntegra:
"O Outback Steakhouse reforça que não obriga que seus funcionários atendam os clientes em posição de joelhos. A empresa chegou ao Brasil há 26 anos com a proposta de inovar o mercado de restaurantes, tanto no cardápio como na ambientação e forma de atendimento. A intenção sempre foi a de buscar proximidade e oferecer um ambiente bastante hospitaleiro, tanto para clientes, como para nossos funcionários. Entre essas práticas, nossos atendentes costumam apresentar-se pelo nome, sorrir ao dar as boas-vindas e buscar contato visual com o cliente, algumas vezes na altura dos olhos, o que implica sentar-se à mesa ou agachar-se ao lado dele. O eye level, termo em inglês que significa exatamente nível dos olhos, como é conhecida a prática empática de estar no mesmo patamar do cliente que está sendo atendido, nunca incluiu o ato de ajoelhar-se perante o cliente e está completamente desprovida de qualquer conotação de servidão, que é justamente o oposto da proximidade que buscamos criar.
Recentemente, e especialmente após a pandemia, o procedimento de eye level foi naturalmente se extinguindo e se tornou opcional. O contato visual persistiu pontualmente, por ser opcional, mas temos orientado nossas unidades para que não seja mais adotada. Essa orientação será mais uma vez reforçada em todos os nossos restaurantes.
Reafirmamos nosso cuidado com as pessoas, compromisso que resulta no fato de que hoje a maioria dos sócios proprietários dos restaurantes começaram conosco, trabalhando na cozinha ou no salão. Reiteramos, portanto, que o Outback Steakhouse não obriga, tampouco recomenda, que seus funcionários atendam os clientes em posição de joelhos e reafirmamos nosso compromisso em continuar investindo em Nossas Pessoas como marca geradora de mais de 12 mil empregos no Brasil.
Comunicamos que, até o momento, não fomos procurados ou notificados pelo Ministério Público do Trabalho do Maranhão. Estamos à disposição do MPT/MA."