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"O desafio é superar estereótipos e preconceitos arraigados", diz primeiro diretor negro da Bolsa

Apenas 12% dos cargos de liderança da B3 são ocupados por pessoas negras; Alexandre Nascimento é um deles

5 jul 2023 - 11h24
(atualizado às 11h35)
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Formado em Administração de Empresas , Alexandre Nascimento assumiu recentemente o cargo de diretor de governança da B3
Formado em Administração de Empresas , Alexandre Nascimento assumiu recentemente o cargo de diretor de governança da B3
Foto: Divulgação

Primeiro diretor negro da B3, a Bolsa de Valores do Brasil, Alexandre Nascimento, 47 anos, vê com otimismo os movimentos na sociedade e no mercado que buscam romper barreiras e abrir oportunidades para a próxima geração de líderes negros. Formado em Administração de Empresas e com MBA em Finanças Corporativas, o executivo assumiu recentemente o cargo de diretor de governança da bolsa brasileira.

Em entrevista ao Terra, Nascimento contou sobre suas origens, trajetória e os principais desafios que terá pela frente na companhia. “A presença de uma pessoa negra em um cargo de destaque muitas vezes implica em enfrentar o desafio adicional de superar estereótipos e preconceitos arraigados”, diz o executivo.

Na B3, 12% dos cargos de liderança da companhia são ocupados por pessoas negras. Segundo Nascimento, já há, no entanto, diversas iniciativas internas para ampliar cada vez mais essa representatividade. “A ascensão de pessoas negras a cargos de liderança pode inspirar outras pessoas negras a acreditarem em seu próprio potencial”, afirma.

Como diretor de governança da B3, Alexandre Nascimento será responsável pelas funções de controles internos, compliance, gerenciamento de riscos, melhoria contínua, continuidade de negócios e gestão de crises. “É essencial compreender que em um mercado cada vez mais desafiador, as organizações precisam contar com as funções de governança para garantir sua estabilidade e crescimento”. [Leia mais na entrevista a seguir]

Alexandre Moysés Vargas Nascimento é diretor de governança da B3
Alexandre Moysés Vargas Nascimento é diretor de governança da B3
Foto: Divulgação/B3

Quem é Alexandre Nascimento? Quais são suas origens?

AN: Sou um pai orgulhoso de três meninas, com idades de 17, 15 e 13 anos, e estou casado há 20 anos. Em relação à formação acadêmica, obtive o título de Mestre em Ciências Contábeis e Atuariais pela PUC-SP, além de possuir um MBA em Finanças Corporativas pela FGV. A minha graduação foi em Administração de Empresas, também pela PUC. Minha trajetória tem raízes na cidade de São Paulo, onde nasci e cresci. Desde cedo, meus pais valorizaram a importância da educação. Eles me incentivaram a estudar, buscar conhecimento e desenvolver minhas habilidades. Acredito que a educação é a chave para romper as barreiras e construir um futuro promissor. Durante minha trajetória profissional desenvolvi habilidades nas áreas de auditoria, gestão de riscos e mercado financeiro. Essa jornada teve início com um estágio no Banco GM; em seguida, atuei como auditor focado em instituições financeiras na Ernst & Young. Posteriormente, ingressei na Deloitte Touche Tohmatsu, na função de consultor da área de gerenciamento de riscos.

Quando ingressou na B3? Quais os cargos que ocupou na companhia?

AN: Ingressei na B3 em março de 2012. Tive a oportunidade de assumir diferentes posições na empresa, cada uma delas contribuindo para minha evolução profissional e pessoal. Funções como gerente e, posteriormente, superintendente de Auditoria de Processos e Secretário do Comitê de Auditoria me deram oportunidade de aprimorar habilidades e conhecimentos no campo da governança corporativa. Em dezembro de 2020, assumi o cargo de Superintendente de Melhoria Contínua e Riscos Corporativos e atualmente, ocupo o cargo de Diretor de Governança na B3, sendo responsável pelas funções de controles internos, compliance, gerenciamento de riscos, melhoria contínua, continuidade de negócios e gestão de crises. Fui também Co-Líder do BL4CK, o Núcleo de Diversidade com Foco em Raça e Etnia na B3, e recentemente, em abril de 2023, assumi o papel de Sponsor do núcleo. Ser parte desse movimento tem sido uma oportunidade enriquecedora para promover uma cultura organizacional mais inclusiva e equitativa.

Quais foram os principais desafios ao longo da vida?  

AN: Ao longo da minha jornada, enfrentei muitos desafios relacionados à representatividade e inclusão. Ser uma minoria em ambientes educacionais e profissionais predominantemente brancos foi uma constante na minha vida. Estudar em escolas particulares me colocou como uma exceção, sendo o único ou um dos poucos negros nas salas de aula. Essa falta de diversidade continuou na faculdade, no MBA e no mestrado. A luta para conseguir meu primeiro emprego foi uma batalha árdua, enfrentando inúmeras entrevistas.

Ao ingressar no mercado de trabalho, senti e vivenciei uma constante sensação de não representatividade, como se aquele lugar não fosse feito para mim e que eu era uma exceção. Além disso, a presença de uma pessoa negra em um cargo de destaque muitas vezes implica em enfrentar o desafio adicional de superar estereótipos e preconceitos arraigados. Infelizmente, ainda persiste a percepção equivocada de que indivíduos negros podem ser subestimados em relação às suas habilidades e competências, o que gera uma pressão constante para provar-se além das expectativas. Essa pressão adicional é resultado de um contexto histórico de desigualdade e exclusão, onde as pessoas negras têm sido sub-representadas em posições de poder e influência.

Portanto, quando uma pessoa negra ocupa um cargo de liderança e de destaque, é comum que ela precise enfrentar barreiras que surgem devido aos estereótipos raciais arraigados na sociedade. No entanto, atualmente, observo com animação os movimentos no mercado e na sociedade que buscam romper barreiras e abrir oportunidades para a próxima geração de líderes negros. Essas iniciativas têm o objetivo de diminuir percepções equivocadas e promover a equidade, proporcionando um ambiente mais inclusivo e justo.

O que representa para você ser o primeiro negro a ocupar um cargo de liderança na B3? Qual o simbolismo disso?

AN: Atualmente, ser um diretor negro representa um avanço positivo na luta pela diversidade e inclusão em espaços de poder e influência. A representatividade é fundamental, pois permite que diferentes perspectivas e experiências sejam incluídas nas decisões e direcionamentos estratégicos. Ao ter uma liderança diversificada, as empresas podem beneficiar-se da criatividade, inovação e resolução de problemas provenientes de uma gama mais ampla de experiências de vida e conhecimentos diversos.

Na B3, 12% dos cargos de liderança da companhia são ocupados por pessoas negras, e temos diversas iniciativas internas para ampliar cada vez mais essa representatividade. A ascensão de pessoas negras a cargos de liderança pode inspirar outras pessoas negras a acreditarem em seu próprio potencial. Essas conquistas quebram barreiras, desafiam estereótipos e demonstram que o talento não tem relação com a cor da pele. A representatividade também envia uma mensagem poderosa à sociedade em geral, reforçando a importância de oportunidades igualitárias e da valorização da diversidade em todos os setores. Pode contribuir para a conscientização sobre a necessidade de superar as disparidades históricas e promover justiça social.

No entanto, é importante ressaltar também que a representatividade por si só não resolve todos os problemas relacionados à equidade e inclusão. É necessário um esforço contínuo para criar ambientes inclusivos, eliminar preconceitos e garantir oportunidades justas para todos e todas. A conquista de cada pessoa negra em um cargo de liderança é um passo importante nessa jornada, mas ainda há muito trabalho a ser feito para alcançar uma sociedade verdadeiramente equitativa.

Qual a importância da diversidade e inclusão dentro da B3? Como o Alexandre pode contribuir com isso? 

AN: Após a fusão que originou a B3 em 2017, decidimos que a nova organização que estava surgindo teria um compromisso sólido com Diversidade, Equidade e Inclusão (DEI). Construir e ampliar a diversidade nas companhias é um exercício complexo, e quanto mais discutirmos e fomentarmos as boas práticas, mais o mercado absorverá e evoluirá, gerando impacto em toda a sociedade. Costumamos dizer que, como empresa responsável pela infraestrutura do mercado, a B3 tem um “duplo chapéu” nessa jornada, o que significa buscar implantar de forma consistente as melhores práticas ESG (contemplando as áreas Ambiental, Social e de Governança) dentro de casa, além de fomentar e induzir a adoção dessas iniciativas em todo o ecossistema.

A minha contribuição é trabalhar incansavelmente para promover a diversidade e inclusão por meio de ações que sejam consistentes e transformadoras, valores que são muito importantes para mim e para a B3 e que sempre estiveram presentes em minha história profissional.

Qual o legado que pretende deixar nesta área e na B3? 

AN: Estou no início de uma nova jornada e acredito que o legado se constrói ao longo do tempo por meio de ações consistentes. Com isso em mente, gostaria de alcançar uma governança digital, ágil e inovadora com base em valores éticos, transparência e responsabilidade que atue cada vez mais como um suporte às áreas de negócios e aos administradores na tomada de decisões. Uma governança que promove a adoção de novas abordagens e tecnologias digitais.

Sei da importância de explorar soluções inovadoras, como plataformas digitais, análise de dados e automação de processos, para otimizar a eficiência, a qualidade e a acessibilidade das informações de governança. Acredito que essas ferramentas podem desempenhar um papel fundamental em ajudar a B3 a atingir seus objetivos.

Outro ponto relevante é investir em pessoas e na formação de talentos. Ao investir no desenvolvimento das pessoas, construímos uma equipe cada vez mais resiliente, preparada para enfrentar os desafios do presente e do futuro. Isso será muito positivo para colaboradores, para a área e para a companhia. Nesse processo, daremos ênfase à promoção da diversidade e inclusão, reconhecendo que equipes diversas trazem diferentes perspectivas e enriquecem nosso trabalho. Por fim, quero contribuir além dos limites da empresa, inspirando, em conjunto com a B3, outras organizações a adotarem práticas de diversidade e inclusão consistentes e impulsionando a transformação para uma sociedade mais justa.

Fonte: Redação Terra
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