O que é ESG e por que esse conceito ganhou importância no mundo dos negócios
Especialistas apontam que empresas com boas práticas socioambientais tiveram melhor desempenho durante crise do coronavírus; saiba como escolher investimentos ESG
A pandemia de covid-19 acelerou a busca por empresas que priorizem a pauta ESG, sigla em inglês para os aspectos ambiental, social e governança. Mas, na prática, como as companhias aplicam esses princípios nos negócios e por que esses temas ganharam mais importância agora?
Especialistas ouvidos pelo Estadão apontam que empresas que possuem pilares fortes de ESG apresentaram desempenho melhor durante a crise do que as que não tinham.
"O tema tem ganhado bastante força, e mudado o olhar com relação ao que é esperado pelo mercado. Você verifica quanto esses aspectos estão diretamente conectados com a governança corporativa das organizações, e isso afeta seu desempenho", afirma Eliete Martins, sócia de consultoria em ESG da KPMG.
O que é ESG?
O termo ESG refere-se a ativos que, além de aspectos financeiros, consideram os impactos ambientais, sociais e de governança. O conceito foi criado como uma métrica para avaliar o desempenho das companhias e ao mesmo tempo obter dados mais comparativos com relação aos indicadores de cada pilar, considerando o que é material para o negócio de cada uma delas.
Alguns exemplos de iniciativas são:
- E (Ambiental, na sigla em inglês): preocupa-se com a gestão das emissões de gases de efeito estufa, consumo de recursos naturais como água, energia, produção e descarte adequados de resíduos, entre outros;
- S (Social): observa a existência de diversidade de funcionários e em campanhas externas, segurança no trabalho, relacionamento com colaboradores e valores da companhia.
- G (Governança): verifica se a empresa possui políticas e práticas da companhia e controladas, diversidade nos conselhos, ética e práticas anticorrupção
"Os ratings (classificações de risco) ESG possuem um papel fundamental para as análises de como uma companhia está desempenhando nessas dimensões e qual o potencial de riscos financeiros para os investidores", afirma Gleice Donini, superintendente de Sustentabilidade da B3. "Também impulsionam e aceleram melhorias na gestão das práticas das companhias."
Por que os investimentos ESG ganharam maior importância durante a pandemia?
Para Ricardo Zibas, sócio-diretor de consultoria em ESG da KPMG, os investimentos ESG adquiriram maior relevância porque refletem quanto uma empresa está preparada para lidar com crises e impactos socioambientais.
"Os investidores perceberam que as empresas com boas práticas de ESG perderam menos durante a pandemia. Os investimentos ESG ainda são de nível, ou seja, ainda são minoria e, cada vez mais, os investidores querem ter ferramentas para mensurar o desempenho dos indicadores não financeiros, para sair da dimensão teórica para o lado pragmático da coisa", aponta.
Os especialistas explicam que companhias com práticas ESG tiveram melhor desempenho porque tendem a possuir pilares de governança mais fortes e cuidam bem dos próprios colaboradores, fatores que trazem estabilidade. Além disso, eles destacam a maior preocupação que surgiu com a desigualdade social durante a crise da covid-19.
"A própria pandemia reforçou as desigualdades e a urgência de medidas que considerem os aspectos sociais e ambientais para a retomada do crescimento", diz a superintendente da B3. "Isso está diretamente relacionado à percepção de risco do investidor em relação às companhias. Os investidores são um stakeholder (agente) fundamental para a mudança do mercado."
Gleice também acredita que a entrada de investidores mais jovens na Bolsa, entre 25 e 39 anos, contribuiu para que o tema ganhasse relevância, já que esse público costuma ter maior engajamento com investimentos sustentáveis. "Um estudo da Allianz, demonstrou que 77% dos investidores nessa faixa etária têm preocupações com as práticas de sustentabilidade das companhias. Esse investidor vai puxar esse mercado daqui para frente", diz.
Como procurar investimentos ESG?
A dica dos especialistas é avaliar se a companhia em que se quer investir participa de algum dos índices de sustentabilidade da Bolsa, como o ISE ou o ICO2 (leia mais abaixo), ou tem informações comprovadas de que segue práticas consolidadas de ESG.
"Uma das formas de você ter maior conforto é ver se essas informações estão sendo asseguradas por uma terceira parte independente, como auditorias", afirma Zibas. "Mesmo assim, existe ainda uma dificuldade de comparar esses indicadores e mensurar os impactos em diferentes setores, mas acredito que isso será solucionado no curto prazo com outras iniciativas do mercado."
Como o ESG pode crescer no Brasil?
De acordo com Eliete, apesar de o ESG ter ganhado importância no mercado, o Brasil precisa crescer mais no desenvolvimento dessas boas práticas, o que deve começar pelos gestores das companhias.
"Em um estudo que fizemos na KPMG, vimos que 55% das empresas listadas no Novo Mercado (nível de maior exigência de governança na B3) divulgam informações socioambientais. Na minha visão, é um porcentual ainda baixo", afirma a sócia. "Acho que ainda tem um processo de muita evolução, de fazer parte da pauta de discussão de um conselho de administração e dos agentes de governança da companhia."
Como funcionam os índices de sustentabilidade da B3?
A B3 tem dois índices específicos relacionados à sustentabilidade ambiental: O Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE) e o Índice Carbono Eficiente (ICO2).
O ISE foi o 4º índice de sustentabilidade criado no mundo, em 2005, do qual participam 30 empresas, com 36 ações, o que equivale a cerca de 40% do valor de mercado da B3.
As companhias detentoras das 200 ações mais líquidas da B3 são convidadas para participar e o processo pressupõe o preenchimento de um questionário composto por 7 dimensões: Econômico-Financeiro, Geral, Ambiental, Governança Corporativa, Social, Mudança do Clima e Natureza do Produto. Depois disso, um conselho do ISE seleciona até 40 empresas para compor a carteira do índice, com vigência anual.
O ICO2, é composto pelas ações das companhias participantes do índice IBrX-100 (100 mais líquidas) que aceitaram participar dessa iniciativa (voluntariamente) e que dão transparência às suas emissões de gases efeito estufa.
De maio a agosto, a carteira tem 26 empresas, com 28 ações, correspondendo a cerca de 52% do valor de mercado da B3.
Existem outros tipos de investimentos ESG?
A B3 também tem outros dois produtos que são caracterizados como investimentos verdes, ou seja, que valorizam aspectos ambientais de negócios:
- Green Bonds: instrumentos de dívida emitidos por empresas, governos e entidades multilaterais negociados nos mercados de capitais com o objetivo de atrair capital para projetos socioambientais.
- Crédito de Descarbonização (CBio): é uma das ferramentas adotadas pela Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio) para atingir metas anuais de descarbonização para o setor de combustíveis. Esses créditos são emitidos por produtores e importadores de biocombustíveis e, em contrapartida, os distribuidores de combustíveis fósseis têm metas anuais de descarbonização calculadas com base na proporção de combustíveis fósseis que comercializam. De acordo com a B3, adquirir CBIOs é a única forma de atingimento dessas metas.
Como praticar o ESG na minha empresa?
Para implementar práticas ESG nas companhias, Gleice sugere que se utilizem parâmetros já existentes para avaliar quais são as metas prioritárias e estruturar um plano de acordo com as demandas do mercado.
"É muito importante que as companhias utilizem as diretrizes ESG como uma referência de boas práticas. Tanto o ISE quanto o ICO2 servem como um referencial teórico das práticas das companhias e auxiliam os investidores em suas estratégias de investimento", aponta a superintendente da B3.
Para o sócio-diretor de consultoria em ESG da KPMG, boa parte das empresas já conta com iniciativas importantes, mas é preciso estruturá-las de forma unificada, o que possibilita a análise completa de todos os três aspectos.
"Muitas vezes, as empresas e os fundos já têm uma série de práticas alinhadas com o ESG, talvez com outro nome ou não estejam estruturadas. Acho que temos um bom caminho já percorrido, e o que está faltando é o próximo passo: mensurar esses impactos e estruturar de uma forma mais holística, integrada a todos esses fatores", afirma Zibas.