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O que o Barcelona e um time indígena do Equador têm em comum?

Além de aproximar os clubes de suas comunidades, o cooperativismo é positivo como modelo de negócios

9 set 2023 - 06h20
(atualizado em 11/9/2023 às 17h59)
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Foto: John Cooper

O futebol brasileiro vive um processo de mudança no modelo de negócios. Os tradicionais clubes associativos agora precisam disputar com os clubes-empresas, impulsionados pela criação das SAFs (Sociedade Anônima do Futebol). Grandes times, como Botafogo, Vasco e Bahia, e Cruzeiro já constituíram suas SAFs.

Mas já que o futebol é um esporte tão popular no Brasil tanto em termos de economia quanto de cultura, será que não há espaço para que clubes adotem o cooperativismo? Além disso, esse modelo já existe em outros países?

Cooperativismo e futebol no mundo

De início, cooperativismo e futebol já apresentam algo em comum: ambos surgiram no Reino Unido durante o no século 19 e se tornaram relevantes no mundo todo. E de lá vem um dos casos mais icônicos da união entre futebol e cooperativismo.

O Wimbledon F.C. era um pequeno mas tradicional clube de Londres até que, em 2002, seus dirigentes optaram por levá-lo a outra cidade em busca de aumentar a atratividade mercadológica da equipe, o que também resultou na mudança de nome para Milton Keynes Dons. Os torcedores, como era de se esperar, não gostaram muito da ideia e fundaram o AFC Wimbledon, uma espécie de sucessor espiritual do clube que amavam.

O novo time milita nas divisões inferiores do futebol inglês, mas conta com uma torcida muito presente. O diferencial? São eles que mantêm o clube por meio de um modelo de gestão cooperativista que conta com adesão livre e voluntária, gestão democrática e interesse pela comunidade.

Mas a ideia de clubes cooperativistas não fica só restrito a clubes pacatos, como no caso do Wimbledon. Rivais, os gigantes espanhóis Real Madrid e Barcelona operam no modelo fan owned (propriedade dos torcedores), que tem tudo a ver com o cooperativismo, uma vez que os torcedores podem se associar livremente, de forma a votar no conselho de administração e integralizar cotas-parte dos clubes.

Na América Latina também há clubes cooperativistas. O time equatoriano Mushuc Runa foi fundado por uma cooperativa de crédito que surgiu para atender uma comunidade indígena e hoje joga a primeira divisão local. O Cruz Azul, um dos gigantes do México, é ligado à Cooperativa La Cruz Azul, uma das maiores produtoras de cimento do país.

E no Brasil?

O cooperativismo brasileiro é uma potência global. Os dados mais recentes do AnuárioCoop, produzido pelo Sistema OCB, revelam que o país conta com 4.693 cooperativas ativas, reunindo mais de 20 milhões de cooperados.  Diante disso, é possível presumir alguma conexão entre cooperativismo e futebol, não?

Acontece que o Brasil já teve, sim, uma cooperativa de futebol - ao menos no nome. A Cooperativa Manchester de Futebol foi fundada em 1994, unindo esforços dos três times da cidade mineira de Juiz de Fora – Tupi, Tupynambas e Sport – que passavam por um mau momento.

O início foi até promissor e, no mesmo ano, a Cooperativa Manchester subiu para a primeira divisão estadual. No ano seguinte, no entanto, a coisa ficou feia: o time foi rebaixado com apenas três vitórias em 22 jogos e o projeto acabou. Apesar do nome, porém, a gestão do clube era muito pouco cooperativa e os torcedores dos três times locais não se empolgaram com a aventura.

Se nenhum clube cooperativista de fato surgiu até então, o cooperativismo dá as caras no futebol nacional de outras formas. A Cooparb (Cooperativa de Árbitros de Rio Branco), por exemplo, reúne árbitros e bandeirinhas acrianos que atuam tanto no quadro nacional da CBF quanto na federação local de futebol.

Além disso, as cooperativas cumprem um papel importante no futebol regional por meio do apoio a clubes locais via patrocínio. O maior exemplo disso é a longeva relação entre a Chapecoense e a Aurora Coop, uma das gigantes do agronegócio nacional.

A saída para um futebol mais cooperativo

Além de aproximar os clubes de suas comunidades, o cooperativismo é positivo como modelo de negócios. É isso que diz a professora Maria de Fátima Ribeiro, da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa. Ela argumenta que o controle privado tradicional está causando problemas financeiros provocados pela má gestão nos clubes portugueses, e a solução é cooperativa.

“No futebol, a participação dos torcedores é fundamental para o sucesso dos negócios”, escreve a acadêmica. Assim, se os torcedores têm confiança na gestão do clube e podem tomar parte nas decisões, eles estarão mais propensos a investir na equipe. “A estrutura de governança cooperativa promove essa sensação de confiança ao mesmo tempo em que garante os níveis de profissionalismo”.

Por fim, não podemos esquecer de que o futebol é uma importante ferramenta de expressão cultural popular. Um ano após a dolorosa derrota do Brasil para a Hungria na Copa do Mundo de 1954, o sociólogo Gilberto Freyre escreveu que: “Para efeitos práticos de vitórias nos torneios de hoje, caracterizados por uma nítida predominância de padrões anglo-saxônicos, melhor fora que a tendência brasileira de jogo fosse cooperativista”.

(*) Gustavo Bezerra é redator da Coonecta e jornalista pós-graduado em Jornalismo Contemporâneo e Digital.

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