Os pontos em que Milei precisou ceder para ter 1ª grande vitória no Congresso argentino
Para conquistar votos necessários no Congresso, onde está longe de ter maioria, governo Milei reduziu bruscamente o número de artigos da 'Lei Ómnibus' e diminuiu seus planos de ter 'poderes extraordinários'. Após vitória na Câmara, projeto seguirá para o Senado.
Com um número ligeiramente maior de votos do que precisava, o governo de Javier Milei conseguiu na noite dessa sexta-feira (02/02) aprovar na Câmara dos Deputados da Argentina a "Lei de Bases e Pontos de Partida para a Liberdade dos Argentinos" — mais conhecida como "Lei Ómnibus" (em português, algo como "Lei de Todas as Coisas"), por conta da sua abrangência.
Após três dias de debates, o projeto foi aprovado por 144 votos a 109 — eram necessários 129 votos favoráveis.
Na próxima terça-feira (13), detalhes sobre os artigos serão discutidos pelos deputados, e depois o conjunto de leis propostas seguem para votação no Senado.
Apesar de ser uma clara vitória de Milei, cujo partido La Libertad Avanza está longe de ter maioria no Congresso — mais precisamente, tem 15% dos assentos nas duas casas legislativas —, seu governo teve que fazer várias concessões para ver o projeto aprovado por deputados.
Para começar, o projeto original tinha mais de 660 artigos. Com as negociações, chegou a 380.
A proposta mais polêmica era a declaração de "emergência pública" em várias áreas, como financeira, sanitária e de segurança — o que daria ao presidente "poderes extraordinários" para decidir sobre esses assuntos sem passar pelo Congresso.
O governo aceitou reduzir as áreas de "emergência" em mais de metade para que o pacote fosse aprovado.
O tempo de duração deste poder extraordinário também foi encurtado: inicialmente, foi proposto que durasse dois anos, prorrogável por mais dois por decisão do próprio Executivo. Ou seja, poderia se estender por todo o mandato de Milei.
A atual proposta reduziu esse prazo para um ano, com possibilidade de prorrogação por mais um ano — mas com necessidade de aprovação pelo Congresso.
Outra área em que Milei fez concessões foi nos planos de privatização.
O pacote original propunha declarar todas as empresas do setor público "sujeitas à privatização", incluindo aquelas mistas ou com participação majoritária do Estado.
Isto afetaria 36 empresas, incluindo a petrolífera estatal Yacimientos Petrolófilos Fiscales (YPF).
O texto atual reduziu para 27 o número de companhias elegíveis para privatização.
Entre elas estão Aerolíneas Argentinas, Correo Argentino, aquelas que administram ferrovias, a agência oficial de notícias Télam, Fabricaciones Militares e a empresa de água AySA.
Outra novidade é que foi determinado que, para cada privatização, uma comissão parlamentar mista deve analisar a demanda.
Em um comunicado para a imprensa, o gabinete da presidência agradeceu aos deputados que votaram a favor do projeto, citando nominalmente o nome de alguns líderes de bancadas.
"A história lembrará com honra de todos aqueles que compreenderam o contexto histórico e escolheram acabar com os privilégios da casta e da república corporativa em favor do povo, que foi empobrecido e esformeado por anos pela classe política", diz a nota.
Partidos de centro e direita não diretamente alinhados ao governo, conhecidos como a "oposição dialoguista", permitiram a vitória.
A "Lei Ómnibus" foi definida por Milei como o "mais profundo" dos três pacotes de reformas que apresentou nos seus primeiros 20 dias no poder — os outros dois foram suas dez medidas de "emergência" e o "decretaço".
O conjunto de leis proposto envolve áreas que, segundo a Constituição, só podem ser modificadas pelo Congresso.
As reformas têm oposição dos principais sindicatos — que já organizaram uma greve geral — e dos partidos de oposição.
Nos protestos de rua, tem havido fortes confrontos com a polícia, em meio a um endurecimento contra manifestações também como iniciativa do governo Milei.
Os confrontos aumentaram e se tornaram violentos na noite de quinta-feira (01).
A polícia disparou balas de borracha, gás lacrimogéneo e canhões de água contra manifestantes. Várias pessoas ficaram feridas, incluindo jornalistas e um assessor parlamentar.