Passivos tributários e o aumento da insolvência no Brasil
É estratégico enxergar o processo de recuperação judicial como mecanismo válido para acessar opções de renegociação
Já não fosse preocupante o recém-noticiado aumento dos casos de insolvência e recuperação judicial no Brasil (Estadão, 31/10/2024), esses números parecem não capturar diretamente uma outra variável que atormenta as empresas brasileiras: o seu grau de endividamento com o Estado.
Afinal, o Código Tributário Nacional prescreve que a cobrança do crédito tributário não está sujeita ao processo de recuperação judicial, dando a falsa impressão de que tais dívidas deveriam ser administradas fora desse tipo de ação.
Não é incomum, por isso, ver planos de recuperação desatentos à renegociação da dívida tributária, limitando-se o devedor a buscar subterfúgios para comprovar momentaneamente a sua regularidade fiscal, o que é exigido para a aprovação do plano de recuperação. Depois, deixa-se de pagar ao Fisco para satisfazer os demais credores. Tampa-se um buraco, cavando-se outro.
Desde 2014, contamos com parcelamento especial de débitos com a Fazenda Nacional para empresas em recuperação judicial. Em 2020, a transação tributária surge como opção para, no âmbito federal, renegociar o passivo fiscal com descontos de até 70%, parcelamento em mais de dez anos, uso de prejuízo fiscal, base negativa da CSLL, precatórios e direitos creditórios.
Com isso, importantes grupos econômicos conseguiram transacionar débitos tributários até então impagáveis. A Fazenda começou a transformar dívida ativa em efetivo ingresso de caixa. Passou-se, finalmente, a sedimentar-se a ideia de que não adianta "matar a galinha dos ovos de ouro": o empresário precisa ser ajudado no momento de maior dificuldade.
Essa mudança vem levando o poder público a lançar programas de transação atentos às crises de calamidades públicas, a exemplo da pandemia e das enchentes no Rio Grande do Sul. Outros níveis da Federação vêm igualmente abrindo oportunidades de negociação para as empresas em recuperação, a exemplo do que recentemente fez o governo paulista.
Diante disso, é estratégico enxergar o processo de recuperação judicial como mecanismo válido para acessar essas opções de renegociação, ainda que seja o passivo fiscal a principal ou exclusiva causa da crise de solvência enfrentada.
Esse pode ser o único caminho, necessário e inevitável, para assegurar a sobrevivência da empresa e a manutenção da sua atividade econômica, objetivos expressamente perseguidos pela Lei n.º 11.101/2005.