Petrobras perde R$ 126 bi em valor de mercado desde início da greve dos caminhoneiros
Investidores veem medidas anunciadas pelo governo como ameaça à política de preços praticada pela empresa nos últimos dois anos e um risco de que volte a haver ingerência do governo na companhia.
Maio deveria ter sido um mês de resultados históricos para a Petrobras, mas a greve dos caminhoneiros frustrou essa previsão ao fazê-la perder mais de R$ 126 bilhões em valor de mercado em questão de dias, de acordo com levantamento feito por Einar Rivero, gerente de relacionamento institucional da empresa de informações financeiras Economatica.
Esse montante perdido é equivalente ao valor de mercado do banco Santander no Brasil, de R$ 125,8 bilhões.
A estatal vinha embalada recentemente pela alta do preço do petróleo e por bons resultados financeiros, com o anúncio de seu maior lucro trimestral desde 2013. Isso deu confiança aos investidores e fez suas ações se valorizarem.
A Petrobras retomou, assim, no último dia 10, o posto de maior empresa de brasileira de capital aberto em valor de mercado, ao ultrapassar a marca de R$ 358,89 bilhões, posição que havia perdido em outubro de 2014.
O número chegou a R$ 388,85 bilhões no dia 16, o maior para a companhia desde abril de 2011, e estava em R$ 368,08 bilhões no dia 21, quando teve início a paralisação dos caminhoneiros. O valor das ações despencou desde então.
Oitavo pregão seguido de queda
Só nesta segunda-feira, quando o governo federal disse estar atendendo a "praticamente todas" as exigências dos grevistas, o recuo no valor das ações chegou a 14,6%, enquanto o Ibovespa teve uma queda de 4,49% - a maior baixa percentual diária da Bolsa desde 18 de maio de 2017, quando vieram à tona as gravações envolvendo Temer e o empresário Joesley Batista.
Entre as medidas anunciadas, está uma redução, por 60 dias, de R$ 0,46 no preço do litro do diesel - as perdas da estatal serão compensadas pelo governo - graças à isenção de tributos como PIS/Cofins e a Cide. Após o prazo estipulado, haverá reajustes mensais.
Ainda serão editadas medidas provisórias para atender a outras exigências da categoria, como a isenção da cobrança pelo eixo suspenso em pedágios e uma tabela de preço mínimo para o frete.
Mas os pontos do acordo que afetam a Petrobras não foram bem recebidos pelo mercado. O dia de hoje marcou o oitavo pregão seguido de queda das ações da estatal.
Perda da liderança
Desde o dia 18, a queda acumulada é de 33,9% para as ações preferenciais (sem direito a voto, mas com preferência na distribuição de dividendos e mais negociadas), de R$ 25,60 para R$ 16,91, e de 34,25%, de R$ 30,10 para R$ 19,79, para ações ordinárias (com direito a voto nas assembleias da empresa).
Com isso, a Petrobras fechou o dia valendo R$ 242 bilhões - R$ 126 bilhões a menos do que na segunda-feira passada - e voltou a perder posições no ranking das empresas brasileiras mais valiosas.
A companhia já havia sido desbancada da liderança pela Ambev na quarta-feira passada. Agora, ocupa a quarta posição da lista, atrás do banco Itaú Unibanco e da siderúrgica Vale, como mostram dados da Economatica.
Sinal de recuo
Einar Rivero, gerente de relacionamento institucional da Economatica, explica que o mercado avaliava a Petrobras como uma empresa que "estava começando a entrar nos eixos".
Isso porque acionistas acusavam o governo Dilma de usar a companhia como instrumento de política macroeconômica para controlar a inflação ao controlar e atrasar o repasse dos preços internacionais aos combustíveis no mercado interno.
Ao praticar preços abaixo do mercado, a empresa evitava que a elevação do preço dos combustíveis se disseminasse pela economia, mas isso gerava prejuízos à estatal.
Em 2016, após Michel Temer assumir o governo, Pedro Parente foi empossado como presidente da Petrobras e afirmou que a política de preços passaria a ser guiada pelos interesses da empresa - sem influência do governo e de acordo com a tendência do mercado internacional.
Com a nova política, as revisões de preços passaram a ser feitas a princípio mensalmente e, depois, a qualquer momento, chegando a reajustes diários.
Agora, as medidas anunciadas para debelar a greve foram interpretadas por investidores como um sinal de um possível um recuo do governo nessa independência da companhia.
Mais risco
"A Petrobras vinha com um mix de resultados expressivos e o petróleo atingindo níveis elevados, porque o Parente vinha fazendo um trabalho positivo e recuperando a companhia. Isso trazia alento", diz Rivero.
"Mas aí vem a greve e surge a dúvida se a intervenção do governo vai voltar. O mercado vê aumentar o risco de que isso ocorra e faça com que a companhia tenha prejuízos. Mesmo com o governo dizendo que vai cobrir (os prejuízos), há uma incerteza grande. Isso faz com que se perca toda aquela recuperação."
Karel Luketic, analista-chefe da corretora XP Investimentos, avalia que a política de preços da Petrobras seguia "padrões internacionais" e estava em linha com o praticado em "qualquer país com uma política tradicional aberta de preços".
"Isso fez a ingerência do governo sair de pauta nos últimos dois anos e reconstruiu a imagem da empresa. Agora, voltamos a discutir se isso vai ocorrer", diz Luketic.
Combinação de fatores
O analista diz que o tamanho da crise criada pela greve obrigou o governo a tomar medidas "que lamentavelmente afetam a Petrobras".
"Uma coisa é dizer que vai ter correção mensal, mas vai ter limite de preço? Qual será a base de cálculo do governo para compensar as perdas da Petrobras? Não temos resposta para isso hoje."
A isso, diz o analista, se junta uma combinação de fatores que geram incerteza, como a falta de apoio político ao governo, estarmos um ano eleitoral e haver uma dúvida sobre qual será o próximo governo.
"O investidor internacional olha para a Petrobras e compara com (outras empresas do setor de petróleo e gás como) a Exxon Mobil, a Shell, a Chevron e vê que não precisa se submeter a esse risco."