Plano econômico de Temer tem 'sintonia' com projeto de Lula, diz Moreira Franco
Wellington Moreira Franco é ex-deputado federal, ex-governador do Rio de Janeiro e dono da façanha de, nos últimos anos, participar de todos os governos que o país teve: FHC, Lula, Dilma Rousseff e, agora, Michel Temer.
É um dos fundadores do PMDB e são dele as diretrizes econômicas adotadas pelo atual governo que, segundo ele próprio, estão em sintonia com a "Carta ao Povo Brasileiro" assinada por Lula em 2002, meses antes de se eleger presidente do Brasil.
O peemedebista se refere a grandes linhas macroeconômicas como meta de superávit, segurança jurídica e equilíbrio entre receitas e despesas - todas presentes no documento de 2002 em que Lula buscava acalmar o mercado financeiro diante da perspectiva de vitória do PT naquele ano.
Para Moreira Franco, ajustar a economia brasileira e assegurar a reeleição de Temer são tarefas incompatíveis. Por isso, afirmou que Temer - que é considerado ficha suja por ter sido condenado em segunda instância - não disputará nem tem como prioridade o pleito de 2018.
"A prioridade do governo Temer é a economia. Dentro da economia é a questão fiscal. Há incompatibilidade em se pensar em eleição e organizar medidas desse tamanho", disse nesta sexta em Londres, durante palestra a investidores na London Business School.
Questionado pela BBC Brasil, Moreira Franco justificou a importância da mensagem sobre Temer não concorrer à reeleição: "Porque é verdade e eu gosto da verdade".
No passado, Moreira Franco bateu de frente com Leonel Brizola (1922-2004), que o apelidou de "gato angorá" - não apenas pelos cabelos brancos, mas por ter a capacidade de pular "de colo em colo" de diferentes governos. "Gato, eu sou. E adoro um colo", disse à BBC Brasil.
Neste governo, ganhou o título de secretário-executivo do Programa de Parcerias de Investimento (PPI). Nas mãos dele, está a gestão do plano de concessões e privatizações anunciado para 2017 e 2018.
No governo Dilma, ele foi titular da Secretaria de Assuntos Estratégicos e da Secretaria de Aviação Civil e participou diretamente da concessão de aeroportos à iniciativa privada.
BBC Brasil - Está difícil convencer investidores nesse momento turbulento que o Brasil está passando principalmente na economia?
Moreira Franco - Não. O que vimos aqui é um ambiente que se repete e as perguntas são basicamente as mesmas nas reuniões com operadores que temos feito. Fizemos nos Estados Unidos e fizemos aqui três.
BBC Brasil - Há uma preocupação do governo em acenar que irá manter as contas em dia, gastar menos do que arrecada, fazer reformas. Mas quem quer colocar dinheiro no Brasil não irá esperar primeiro para ver se esses passos vão, de fato, começar a ser dados? Pode haver um hiato entre iniciar reformas e atrair investimento?
Moreira Franco - O professor Mário Henrique Simonsen (1935-1997) dizia que, para resolver uma questão econômica, 80% é confiança e 20% é teoria econômica. O que temos que fazer é reestabelecer a confiança.
Na medida em que as pessoas verem que o país está caminhando para uma direção correta, que pratica na economia o que as famílias praticam [em casa]... Sobretudo num ambiente que tem taxa de juros negativa, taxa de juros zero, se você tem a oportunidade de investimento no Brasil, eles virão.
BBC Brasil - O senhor falou com otimismo sobre a PEC 241 [que estabelece teto para os gastos públicos], sobretudo sobre a possibilidade de aprovação. Congelar os gastos por 20 anos não parece tempo demais ou o senhor acha que é o tempo necessário?
Moreira Franco - Não é, 20 anos é uma sinalização, uma referência. Não é que possa negociar, a própria lei... quer dizer, não pode [negociar o prazo], porque ela já está lá [no Congresso] que daqui a dez anos se faz uma revisão. Mas existe a possibilidade de o país crescer surpreendentemente, e esses fundamentos se incorporem com mais velocidade.
BBC Brasil - E aí revê a PEC?
Moreira Franco - É.
BBC Brasil - Muita gente critica a PEC, em especial por conta dos gastos com saúde e educação...
Moreira Franco - Está comprovado, pelo contrário. Com essa nova regra, se ela já estivesse sido aplicada, tanto saúde quanto educação mantendo o equilíbrio entre despesa e receita teriam esse ano mais recursos do que tiveram e terão mais recursos no ano que vem do que tiveram com a regra anterior.
BBC Brasil - Mas e o estudo da Fundação Getúlio Vargas indicando que o mínimo seria de R$ 400 se a PEC estivesse em vigor desde 1998?
Moreira Franco - Não é da FGV. O presidente da FGV divulgou uma nota dizendo que é um estudo de um economista. Não sei, não li.
BBC Brasil - Quem perderia potencialmente com a PEC?
Moreira Franco - Ninguém. Todo mundo ganha. O Brasil precisa de estabilidade. Perde a sociedade brasileira com os quase 12 milhões de desempregados, com projeções para quase 14 milhões de desempregados até o fim do ano, com déficit de R$ 170 bilhões, com governos estaduais não podendo pagar aposentadoria e atrasando salários, com o governo federal desequilibrado.
Essa é a realidade. Não estamos vivendo num mundo de sonho, a realidade é essa. Temos que enfrentá-la e resolver essa realidade. As pessoas estão perdendo conquistas que obtiveram por força da desorganização fiscal.
BBC Brasil - O senhor falou no evento que a prioridade do governo Michel Temer é a economia e, dentro da economia, o ajuste fiscal. Isso é incompatível com pensar em eleição porque as duas coisas não andam juntas. Isso foi uma declaração de que Temer não tenta reeleição?
Moreira Franco - Sim.
BBC Brasil - E por que o senhor acha que essa mensagem é importante para essa plateia?
Moreira Franco - Porque é verdade. Eu gosto da verdade.
BBC Brasil - O senhor já foi chamado de "gato angorá" [por Leonel Brizola], de camaleão político e mais recentemente de eminência parda do presidente Michel Temer.
Moreira Franco - Parda não... minha cabeça é branca.
BBC Brasil - O senhor já passou por todos os governos [desde a década de 1990]. Como o senhor se autodefiniria? O senhor concorda com essas definições?
Moreira Franco - Gato, eu acho que sou.
BBC Brasil - Mas angorá? Que gosta de um colo?
Moreira Franco - Adoro um colo. Eu sou do PMDB, eu milito no PMDB, sou dirigente do PMDB há muitos anos. Acompanho as decisões do PMDB e ele tem posição. Nós apresentamos ainda quando a presidente Dilma estava no governo um documento que é a Ponte para o Futuro, onde está contida a posição do partido. Essa posição está sendo cumprida agora.
Não há nenhum subterfúgio, nenhuma esperteza. Foi dito antes o que o país precisava. Ela achou que era traição, golpe, conspiração. Não aplicou, ao contrário, ficou percorrendo um outro caminho que só fez agravar a crise. O que nós estamos fazendo agora é aplicando o que dissemos que deveria ser aplicado para tirar o país da crise.
BBC Brasil - A gente pode esperar um momento similar ao primeiro mandato do governo Lula, em termos de medidas macroeconômicas? De tentar fazer superávit [espécie de poupança feita pelo governo federal para pagar ou abater juros da dívida pública], de tentar impor freio aos gastos públicos?
Moreira Franco - O que está contido na "Carta aos Brasileiros" (documento divulgado por Lula em junho de 2002) do ponto de vista de fundamentos macroeconômicos é o que acreditamos. É o que vai ser executado.