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Por que nem sempre é bom ter certeza no trabalho - as vantagens de manter ideias contraditórias

"Muitas mãos tornam o trabalho mais leve," mas "cozinheiros demais estragam o caldo." O mundo dos negócios está cheio de conselhos e perspectivas contraditórios. Mas pode valer a pena ter duas visões conflitantes ao mesmo tempo.

28 nov 2017 - 20h29
(atualizado em 29/11/2017 às 07h24)
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O premiado musical Hamilton entrou em praticamente todas as listas das melhores experiências teatrais dos últimos dois anos. As performances esgotadas continuam abalando Nova York enquanto a peça estreia com empolgação em Londres. Até que me senti compelido a ir. E eu... não gostei. Como eu poderia gostar? Depois de toda a promoção exagerada, nenhuma peça estaria à altura das minhas expectativas.

Ter perspectivas múltiplas sobre qualquer desafio é algo necessário no mundo dos negócios, onde a situação pode mudar em um instante
Ter perspectivas múltiplas sobre qualquer desafio é algo necessário no mundo dos negócios, onde a situação pode mudar em um instante
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

A lição? Eu deveria ter ido com baixas expectativas. Aliás, a filosofia budista diz que a chave para a felicidade é manter as expectativas baixas. Eis que essa ideia se traduz de uma maneira bastante prática nos negócios. Que gerente nunca ouviu o conselho: menos promessa e mais entrega?

Mas espere um pouco! Será que pode ser realmente bom ter expectativas baixas? Não de acordo com Carol Dweck, uma professora de psicologia da Universidade de Stanford. Segundo Dweck, a felicidade vem para aqueles que estão sempre aprendendo e se esforçando para melhorar. Não se acomode fazendo menos nem espere menos de si mesmo. Quanto maiores suas expectativas, maior sua felicidade. Mais uma vez, a tradução para os negócios é evidente: líderes precisam de uma mentalidade voltada para o crescimento para conseguir fazer sua empresa prosperar.

Todas essas ideias fazem sentido, são lógicas, fáceis de se identificar... e completamente contraditórias. Muitos leitores provavelmente estão de acordo com ambas.

Decisões em forma de curva têm uma má reputação, mas às vezes é essencial ser versátil
Decisões em forma de curva têm uma má reputação, mas às vezes é essencial ser versátil
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Ser inconsistente virou um pecado cardinal com o passar dos anos. Mudar de ideia em relação a qualquer assunto é uma acusação que dá medo a muitos políticos. Mas manter duas ideias opostas nas nossas mentes e escolher favorecer uma sobre a outra em momentos diferentes não nos torna necessariamente volúveis. É como todos nós pensamos e reconhecer essa dualidade é uma habilidade crítica de liderança.

Mantendo-se ágil

O gerente com uma mentalidade simples procura por consistência. O gerente sábio fica confortável com o paradoxo.

Os melhores gerentes ficam satisfeitos em manter duas ou mais visões opostas em uma questão porque eles sabem que o mundo é complexo. E, nos negócios, é crucial ser capaz de reagir ao mundo com toda sua contraditória complexidade.

Limitar suas ideias, observações e críticas para se manter consistente com uma única lógica pode ser atraente por sua simplicidade e sua firmeza, mas isso limita desnecessariamente algumas opções para resolver problemas. E, mais importante que isso, você não precisa se conformar com a realidade.

Pensar de maneiras contraditórias pode ajudar um gerente a evitar a "visão de túnel"
Pensar de maneiras contraditórias pode ajudar um gerente a evitar a "visão de túnel"
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

As pessoas e os problemas que elas criam (para, em seguida, tentar resolver) podem chegar até você de maneiras imprevisíveis - por que deixar uma mente fechada dificultar ainda mais o seu trabalho?

Ainda precisa ser convencido? Já ouviu falar que "semelhante atrai semelhante" ou que "opostos se atraem"? Ou que "muitas mãos tornam o trabalho leve," mas "cozinheiros demais estragam o caldo"?

Eu poderia continuar com os aforismos, mas vamos ao ponto.

Quando eu treino gerentes e os peço para descrever seus chefes, eles invariavelmente usam palavras como "microgerenciador" ou "delegador". Gostamos de rotular as pessoas de uma maneira exata, mas quando o fazemos perdemos algo sutil porém importante: rótulos simples não apenas nos enganam como também reduzem nossas oportunidades para aprender.

A tendência de muitas pessoas que eu treino de definir seus chefes torna mais difícil a tarefa de entender que ser chefe é uma habilidade cheia de prioridades conflitantes e pressões que mudam o tempo todo.

Um bom chefe não é nem muito prático nem muito delegador o tempo todo. A chefia eficiente exige um movimento constante entre dar direções ao trabalho e permitir a independência que os subordinados precisam para florescer, dando feedback quando necessário.

Pode ser uma verdade difícil para se lidar, mas os melhores chefes são aqueles que navegam o paradoxo de acordo com as circunstâncias variáveis de uma tarefa ou de um projeto. Eles realmente criam oportunidades para membros da equipe ao delegar responsabilidade, mas não abandonam a equipe à própria sorte depois de dar ordens. Eles prestam atenção constantemente.

Reconhecer as danças muitas vezes contraditórias que qualquer chefe precisa fazer entre esses dois deveres ajuda as pessoas que eu treino a resolver problemas de uma maneira muito mais eficiente do que a que eles teriam escolhido se não fosse o treinamento.

Se isso parecer muito difícil para você, siga estas dicas:

- Mesmo que os paradoxos e as contradições se mantenham constantes em nossas vidas, duas ideias opostas não precisam ser necessariamente verdade ao mesmo tempo. Em termos práticos: uma ideia que falhou há três anos pode ser a ideia certa agora. Assistentes pessoais digitais foram grandes fracassos nos anos 1980, mas nos celulares dos anos 2010 elas são centrais para a maneira como trabalhamos e vivemos.

- O que faz sentido para mim pode não fazer sentido para você. Nenhuma ideia consegue 100% das ações de mercado, o que significa que alguma customização em relação a como trabalhamos é perfeitamente natural. E inteligente. Então enquanto delegação e gerência ativas podem, e muitas vezes devem, coexistir, o meu estilo de liderança ou a natureza da minha equipe ou até mesmo a natureza do projeto em que estamos trabalhando - tudo pode impactar na decisão entre delegar e dirigir.

- O pior erro de todos é negar o paradoxo e a contradição. Fingir que isso não caracteriza como as coisas realmente são não faz com que elas mudem. Mas significa que você tem um senso afunilado do que está acontecendo e isso nunca é uma boa ideia. Então, não importa o quanto você acredite que algo seja verdade, pergunte a si mesmo se o oposto pode ter alguma validade. Você não precisa decidir pelo oposto, mas esse tipo de mente aberta o ajuda a identificar possíveis riscos em seu caminho preferido de ação e reduz riscos.

- Não subestime a capacidade das pessoas de ter duas ideias na cabeça ao mesmo tempo. Fazer isso pode exigir que você mude o circuito do seu cérebro para aceitar que ambos podem ser verdade, mas é isso o que bons gerentes fazem. Gastamos tanta energia buscando a consistência, enquanto abraçar a realidade do paradoxo é muito mais poderoso.

Vivemos em um mundo tão polarizado agora que é difícil aceitar que qualquer um poderia acreditar em duas visões opostas ao mesmo tempo. Mas é possível. E necessário.

Apesar dos nossos esforços para ter a mentalidade mais restrita posível, nossos cérebros têm a capacidade de se envolver com duas visões opostas simultaneamente. E se isso não transmitir esperança, eu não sei o que pode transmitir.

Sydney Finkelstein é professor de gerência e diretor do Centro de Liderança do centro de negócios da Faculdade de Darthmouth. Seu livro mais recente se chama "Superbosses: How Exceptional Leaders Manage the Flow of Talent" ("Superchefes: Como Líderes Excepcionais Lidam com o Fluxo de Talento", em tradução livre).

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