Quanto custa a comida que as companhias aéreas servem nos aviões?
Quando, em 1987, o então presidente da American Airlines Bob Crandall decidiu deixar de servir uma azeitona no cardápio da primeira classe, a companhia começou a economizar US$ 40 mil (R$ 144 mil, em valores atuais) por ano.
A história já foi contada tantas vezes que virou mito. Alguns dizem que a cifra é muito maior; outros, que a economia foi resultado de um menor custo do combustível devido à redução do peso total das azeitonas nos voos.
Há até os que discutem se a azeitona também foi retirada das saladas e martínis.
Ao contrário de antigamente, voar já não é mais uma experiência glamourosa e restrita a um seleto grupo de indivíduos.
A multiplicação das companhias aéreas de baixo custo teve um papel fundamental nessa transformação. E as mudanças na área da aviação civil podem ser observadas de várias formas, a começar pela mesinha que fica à frente do assento.
Nos anos 1950, companhias como a americana PanAm prometiam "comida deliciosa (...) preparada em quatro cozinhas que operam simultaneamente".
Mas, no começo do século 21, empresas como a British Airways ou a American Airlines reduziram suas ofertas a lanches e passaram a cobrar separadamente por eles.
E isso é explicado pelo impacto do aumento do preço dos combustíveis, entre outros motivos.
Falência
Entre 2008 e 2011, oito companhias aéreas internacionais declararam falência.
Muitas empresas lançaram mão, assim, de dois recursos clássicos: eliminar tudo o que é considerado supérfluo e cobrar por tudo que seja indispensável.
Mas, com a queda no preço do petróleo, essa tendência pode estar se revertendo.
Em fevereiro deste ano, a United Airlines e a American Airlines voltaram a oferecer lanches "gratuitos" ─ incluídos no preço da passagem ─ em certos voos.
A American Airlines também anunciou que restabeleceria o serviço de refeições completas em determinadas rotas de distância média.
"(Antes) a questão era como sobreviver. O que mudou é que as empresas aéreas conseguiram arrumar seus negócios e retomar a capacidade de reinvestir em nossos clientes", disse Fernand Fernández, vice-presidente de mercado global da American Airlines, à BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC.
Quanto custa a comida?
No entanto, o custo das refeições a bordo ainda é um tabu para a maior parte das companhias aéreas.
"Não temos permissão para discutir isso", disse à BBC Mundo uma porta-voz da SkyChefs, uma das principais fornecedoras mundiais de refeições e lanches para empresas aéreas.
"De fato, não falamos sobre o custo de nossos alimentos ou bebidas a bordo", respondeu por e-mail Boris Ogursky, porta-voz da Lufthansa, uma das únicas duas companhias aéreas (de um total de oito) que responderam ao pedido de entrevista da reportagem.
A colombiana Avianca, uma das maiores da América Latina concordou em falar sobre os custos.
"Para a Avianca (o custo por passageiro para servir uma refeição na classe econômica) varia de US$ 1 a US$ 13 (R$ 3,60 a R$ 46,60), dependendo da distância do voo", afirmou Claudia Arenas, diretora internacional de comunicação e assuntos corporativos da empresa.
Ela ressalva que os custos para a classe executiva ou primeira classe são mais elevados, "entre US$ 5 e US$ 30" (R$ 18 e R$ 107,60).
As cifras coincidem com os dados enviados à BBC Mundo pelo Bureau de Estatísticas de Transportes (BTS, na sigla em inglês) do Departamento de Transportes dos Estados Unidos.
Segundo o órgão, o gasto médio em 2014 das dez companhias estudadas em todas as classes e distâncias foi de US$ 3,61 por pessoa (R$ 12,95).
A que mais investiu na área foi a American Airlines (US$ 6,43 ou R$ 23) e a que menos investiu foi a Spirit, uma companhia aérea de baixo custo, com apenas US$ 0,26 (R$ 0,93).
Altos e baixos
De acordo com o BTS, desde 2001, houve uma queda de 25% nos recursos investidos nesse tipo de serviço.
As estatísticas não englobam outros custos associados à alimentação nos aviões, entre eles: transporte, armazenamento, serviço e descarte de lixo.
Contudo, não é possível evitá-los, ainda que as companhias queiram cobrá-los à parte: os aviões precisam ter os produtos à bordo e à disposição dos passageiros.
Esse pode ser um dos motivos pelos quais os preços sejam tão altos: um levantamento realizado em 2013 por um site de comparação de preços na Grã-Bretanha descobriu que, em média, comprar comida e bebida em um avião era pelo menos 241% mais caro do que no supermercado.
Por isso, economizar pouco mais de US$ 3 (R$ 10,76) por passageiro (e, em teoria, no preço da passagem) não parece muito.
A pergunta é se faz sentido, em termos financeiros, excluir a alimentação do preço da passagem.
"Faz sentido, e ao fazê-lo, reduz-se o preço ─ que é ponto de entrada ─ aumentando a demanda", disse à BBC Mundo Bob Mann, consultor de serviços para o setor aéreo baseado em Washington.
"Não podemos nos esquecer, contudo, que a concorrência é muito forte nesse setor. Assim, muitas vezes, é preciso oferecer comida e bebida gratuitamente para atrair o passageiro", acrescentou.
Outro questionamento comum é se a redução da oferta deste tipo de serviço teve um impacto negativo no público, como um sinônimo de uma queda na qualidade do serviço.
"Não. É irônico, mas, antigamente, as refeições eram depreciadas porque eram gratuitas. Agora, no entanto, têm um outro tipo de valor agregado para os clientes e acabam representando um dividendo para as empresas aéreas", disse Mann.
"O único caso em que houve um impacto na venda de passagens foi quando as empresas aéreas começaram a cobrar pela água a bordo. A reação foi tão negativa que a iniciativa foi abandonada", acrescentou ele.
"Eu imagino que não há uma razão para (afirmar que) as empresas aéreas 'deveriam' oferecer refeições como parte da passagem; é um avião, não é um restaurante", disse à BBC Mundo Marco Hart, do site AirlineMeals.net, que se dedica a documentar o que é servido em aviões com fotografias da comida, cardápios e outros.
"Acho que você recebe aquilo que está disposto a pagar. Algumas empresas aéreas vendem passagens em uma tarifa 'regular' e a comida está incluída (...). Outras vendem passagens baratas para pessoas que querem um voo barato. Se você quer comer, paga à parte, e acho que assim está tudo bem", disse.
No Brasil, no entanto, a queda no preço internacional do petróleo não permitiu o mesmo alívio financeiro já que a crise econômica e a alta no dólar elevam os custos e o endividamento das empresas, apontam especialistas.
Mas no mundo, para Hart, a situação está melhorando.
"Há mais opções, novos conceitos com ingredientes frescos, melhores técnicas e infraestrutura. O futuro parece bom", afirmou.