Receita Federal vai monitorar transações acima de R$ 5 mil no Pix; o que muda na prática?
Para especialista, medida deve atingir apenas aqueles que estão irregulares com a Receita e "já rodam embaixo da lei"
As transações via Pix feitas a partir de 1º de janeiro poderão ser monitoradas pela Receita Federal. A medida considera quem receba um volume mensal maior que R$ 5 mil sendo pessoa física, e maior que R$ 15 mil, sendo pessoa jurídica. Na prática, o que esse monitoramento visa alcançar e o que muda para o usuário do Pix?
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Especialistas ouvidos pelo Terra explicam que a medida visa impedir sonegação fiscal e se trata de uma atualização de um monitoramento que já era feito com outros tipos de transação.
"A Receita Federal, com base na Lei Complementar 105 de 2001, já tinha um sistema de acompanhamento periódico das movimentações financeiras das pessoas físicas e jurídicas. Cartões de crédito e débito eram obrigados a entregar mensalmente a alimentação de seus clientes, as instituições financeiras eram obrigadas a entregar o saldo das contas", afirma André Felix Ricotta, professor doutor em Direito Tributário e sócio da Felix Ricotta Advocacia.
Com uma instrução normativa estabelecida no final de 2024, foi atualizado que o Pix passaria a fazer parte desse monitoramento também.
"É importante dizer que não se trata de cobrança efetiva de tributo. O que a Receita quer analisar é a movimentação financeira, tanto de pessoas físicas quanto de pessoas jurídicas, para saber se a pessoa está declarando de forma correta, dentro daquele grande cruzamento de dados que ela faz com outras informações também que ela possui", complementa o advogado tributarista Carlos Marcelo Gouveia, do escritório Almeida Prado & Hoffmann.
Renan Basso, co-fundador e diretor de negócios da empresa de tecnologia MB Labs, acrescenta que as instituições financeiras já possuem a obrigação de enviar informações sobre o Pix para o Banco Central. Mas o órgão não tem o dever de fiscalizar o recolhimento de impostos, papel da Receita Federal, que passará a ter acesso a esses dados.
Quem deve ser atingido pelo monitoramento?
Para Basso, quem deve se preocupar com a medida são aqueles que "já rodam embaixo da lei". Ou seja, quem não tem o costume de declarar o que ganha e sonega impostos à Receita Federal.
"Tem uma série de MEIs que rodam acima do limite. Mas aí ele passa um pouquinho para a conta da mãe, ele passa um pouquinho para a conta do pai... Aí ele fica combinando tudo isso para tentar realmente meio que, entre aspas, se esconder e pagar o menor imposto possível", exemplifica Basso.
Nesse cenário, os vendedores informais também devem ser os mais afetados pelo monitoramento. Isso porque, caso eles não declaressem os ganhos, muitas transações via Pix podiam passar despercebidas pela Receita.
"Não era 100%, mas até então tinham algumas possibilidades de ocultar isso do fisco", considera o tributarista Carlos Gouveia.
Vale ressaltar que as instituições financeiras irão fazer o envio das informações de forma semestral à Receita Federal e, cada mês que passar dos R$ 5 mil, para pessoa física, será monitorado.
"Se uma pessoa teve um mês de janeiro, uma movimentação superior na sua conta, saldo superior a R$ 5 mil, e fevereiro, meses subsequentes, valores inferiores, por causa de um mês, a gestão financeira é obrigada a enviar essa informação para a Receita Federal", diz o tributarista André Felix Ricotta.
Transações via Pix podem diminuir?
Já se tornou difícil imaginar nossa vida sem Pix. Mas, a depender do impacto que essa fiscalização possa trazer aos comerciantes, o diretor de negócios Renan Basso acredita que pode, sim, voltar a preferência por dinheiro físico.
"Brasileiros são pessoas criativas. Ele sempre vai atrás de uma alternativa", brinca. "Se a Receita Federal começar a pegar no pé das pessoas e atuar mesmo, eu acho que pode ter um movimento de volta do papel com mais intensidade, às vezes até o comerciante dando desconto pra quem tá pagando em dinheiro em papel", considera.
No geral, por ser da área da tecnologia, Basso vê de forma positiva o monitoramento. Para ele, a medida faz parte do processo de atualização e inovação do mercado financeiro brasileiro, com maior abertura de informações.