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Reconstrução do RS: governo federal tributa a retomada

22 ago 2024 - 06h20
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Resumo
O Rio Grande do Sul sofreu com enchentes que impactaram fortemente a economia. O governo federal ofereceu financiamentos com juros subsidiados, mas um grupo formado por entidades tenta implementar desonerações fiscais para auxiliar na recuperação.
Foto: Reprodução

A tragédia das enchentes assolou parte relevante da capacidade econômica do Rio Grande do Sul (RS). Máquinas, prédios e estoques foram levados pela água, mas as obrigações assumidas perante fornecedores, instituições financeiras, colaboradores e fisco permaneceram.

A resposta do governo federal, até o momento, foi o oferecimento de financiamentos com juros subsidiados. Assim, além de pagar fornecedores pelo estoque perdido, reinvestir na reconstrução de ativos e assegurar o adimplemento de todos os demais compromissos relativos a um período em que sequer faturaram, os agentes econômicos atingidos pela maior tragédia climática da história gaúcha também despenderão recursos para o pagamento dos juros (pouco menores que os do mercado, é verdade) relativos aos novos empréstimos contraídos.

As obrigações tributárias, por sua vez, tiveram seus vencimentos meramente postergados, duplicando o peso fiscal nos meses em que essas exações serão recolhidas juntamente com os tributos correntes. Analogicamente, é como dar alta para um paciente internado há um mês na UTI e inscrevê-lo para participar de uma maratona no dia em que ele deixa o hospital.

A partir desse contexto, um grupo formado pela Fecomércio-RS, Fiergs, Federação de Entidades Empresariais do Rio Grande do Sul (Federasul), Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), Sebrae-RS e OAB-RS, denominado Resgate-RS, encampou um inovador projeto de estímulo à recuperação da atividade econômica gaúcha, por meio de desonerações fiscais pontuais. Essas medidas estão dispostas em sete projetos normativos, todos interligados.

Entre os instrumentos sugeridos, no plano federal, está a desoneração, por tempo limitado, dos seguintes tributos: PIS, COFINS, IRPJ, CSLL, Contribuição Previdenciária Patronal, IPI, IOF (nas operações de crédito), II e ITR, além do Simples Nacional. A fruição do benefício fiscal abrangerá somente as obrigações tributárias diretamente relacionadas aos estabelecimentos atingidos pelos eventos climáticos, localizados nos municípios que foram declarados em situação de emergência ou calamidade pública.

O projeto apresenta as seguintes características: horizontalidade, pois abrange todos os segmentos da economia, dispensando a multiplicidade de negociações setoriais; verticalidade, porquanto comporta medidas coerentemente alinhadas nos âmbitos federal, estadual e municipal; eficiência, já que o estímulo corresponderá aos próprios tributos que deixarão de ser repassados pelas empresas atingidas, por determinado tempo; e assertividade, uma vez que a fruição do regime tributário exigirá habilitação junto à Receita Federal do Brasil, o que facilitará a fiscalização e coibirá indesejados desvios na sua aplicação. Além disso, o projeto assegura a manutenção de empregos e estimula doações realizadas pelas empresas às famílias de menor renda, destinadas à reconstrução das suas casas.

O Decreto Legislativo 36, de 2024, diploma que reconheceu a ocorrência do estado de calamidade pública no Rio Grande do Sul, autoriza a União a não computar, no atingimento das metas fiscais, as despesas com as renúncias fiscais necessárias ao enfrentamento das consequências sociais e econômicas geradas pelas enchentes, para fins de atendimento da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Após o resgate de milhares de pessoas realizado durante as enchentes, o Rio Grande do Sul precisará, agora, do resgate dos agentes econômicos e dos empregos, o que exigirá o protagonismo do governo federal. É preciso que se compreenda, nessa análise, que a desoneração fiscal empregada na reconstrução de ativos destruídos não pode ser equiparada à mera transferência de recursos para despesas correntes, pois está ligada ao restabelecimento da capacidade econômica dos agentes, da qual o próprio estado será beneficiado com o incremento na arrecadação a médio e longo prazos.

Uma lição que se aprende com as tragédias é que a antecipação dos problemas está diretamente ligada à mitigação dos respectivos danos. A calamidade pública, infelizmente ocorrida, não pode ser potencializada pela "calamidade do poder público" na implementação de medidas fiscais necessárias e aplicadas, com êxito, na recuperação dos prejuízos causados pelos furacões Katrina e Sandy (EUA) e pelo tsunami de Tohoku (Japão), por exemplo.

Os modelos dos projetos normativos que abordam as matérias federais foram entregues pelos representantes do grupo Resgate-RS, ao presidente Lula em 15 de maio, ao vice-presidente Alckmin em 17 de maio e ao ministro Paulo Pimenta - cujas sugestões foram incorporadas ao texto - em 24 de maio. Tratando-se de medidas inegavelmente urgentes e relevantes, elas já deveriam ter sido implementadas por medida provisória.

Mas não foi o que aconteceu. Como o assunto não teve qualquer evolução junto ao Executivo, a proposta foi analisada e endossada pelo deputado federal Covatti Filho, fundamentando, atualmente, o PL 2265/24 e o PLP 109/24. As empresas, que hoje penam para honrar a folha de salários, enfrentarão, em breve, o dilema tributário para o qual a saída, entregue há quase sessenta dias ao Poder Executivo, chega agora ao Congresso Nacional.

Pior do que não repassar recursos necessários à recomposição do ambiente econômico no RS é exigir, sob a forma de tributos, participação nas comprometidas receitas dos agentes que retomarem suas atividades. A aprovação das medidas fiscais que chegaram ao Congresso é o antídoto sem o qual a União, pela primeira vez na sua história, acabará tributando a própria reconstrução de um estado federado.

(*) Rafael Pandolfo é advogado, coordenador do Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET) de Porto Alegre e coordenador técnico do programa Resgate-RS. 

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