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Reforma tributária sem reforma administrativa?

Servidores públicos brasileiros ganham, em média, 57% acima dos profissionais de formação equivalente do setor privado

27 ago 2020 - 04h10
(atualizado às 07h48)
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Everardo Maciel, uma referência mundial em matéria tributária, costuma dizer: para saber se a carga tributária deve aumentar ou diminuir, é preciso conhecer o montante de gastos que o governo tem pela frente.

Os gastos com pessoal da União, de Estados e municípios e dos Três Poderes consomem quase R$ 1 trilhão por ano. A Lei de Responsabilidade Fiscal foi um grande passo para conter os gastos com pessoal. Apesar disso, em 2019, nove Estados ultrapassaram os seus limites (Rio Grande do Norte, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Tocantins, Rio de Janeiro, Acre, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Paraíba).

Vários estudos indicam que os salários de servidores estatutários crescem muito mais rapidamente que os de não estatutários. E, entre os estatutários, os salários de categorias organizadas sobem mais do que os dos demais servidores estatutários (Cláudio Hamilton M. dos Santos e colaboradores, Indicadores da política salarial das administrações públicas estaduais brasileiras, Ipea, Carta de Conjuntura, 23 de abril de 2020).

Disputa acirrada pela vaga de Alcolumbre deve dificultar também a votação da reforma administrativa.
Disputa acirrada pela vaga de Alcolumbre deve dificultar também a votação da reforma administrativa.
Foto: Pedro França/Agência Senado / Estadão Conteúdo

Os servidores públicos brasileiros ganham, em média, 57% acima dos profissionais de formação equivalente do setor privado. Entre as dez ocupações mais bem pagas do Brasil, seis são exercidas por servidores do Ministério Público, do Poder Judiciário, do Tribunal de Contas, por funcionários dos bancos federais, diplomatas e advogados e procuradores da Fazenda, de autarquias e fundações públicas. A maioria dos servidores públicos é contemplada com estabilidade, progressões automáticas, prêmios e abonos que são incorporados na sua remuneração.

A reforma administrativa, apesar de inadiável, enfrenta grandes resistências. Colocada em consulta pública pela internet, a PEC 186 (Emergencial), que busca controlar gastos com pessoal, recebeu 3.235 opiniões favoráveis e 159.012 desfavoráveis (dados de 25/8/2020). No meio da catástrofe da covid-19, o Senado Federal autorizou aumento de salário para os servidores públicos em 2021, em boa hora invalidado pela Câmara dos Deputados. Em outra frente, o Supremo Tribunal Federal decidiu que os servidores públicos não podem ter redução de jornada e salário nem contrato de trabalho suspenso, o que ocorre com mais de 10 milhões de empregados do setor privado.

Quais são os pontos-chave de uma reforma administrativa?

  1. Reduzir as 300 carreiras hoje existentes no serviço público para 20 ou 30.
  2. Introduzir critérios objetivos de avaliação de desempenho que possibilitem até mesmo a demissão do servidor estável.
  3. Basear as promoções em avaliações de mérito, desempenho e capacitação e eliminar o regime de promoção automática por antiguidade.
  4. Conceder estabilidade depois de vários anos e mediante uma avaliação de desempenho.
  5. Limitar a estabilidade apenas às carreiras de Estado (Receita Federal, Polícia Federal, Relações Exteriores e poucas outras).
  6. Reduzir o salário inicial das diversas carreiras (há proposta de R$ 5 mil mensais) a fim de evitar a chegada rápida (dez anos em média) e onerosa no final das carreiras.
  7. Investir permanentemente na formação e capacitação dos servidores públicos.

Ao tomar conhecimento dessas propostas, o presidente Jair Bolsonaro disse: "Essa reforma mata 40 milhões de votos. Vamos deixá-la para mais tarde". Se assim for, haja impostos para cobrir tantas despesas! A lógica é meridiana: os parlamentares encarregados de aprovar a reforma tributária precisam saber quanto o Estado precisará daqui para a frente.

*PROFESSOR DA FEA-USP, MEMBRO DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS, É PRESIDENTE DO CONSELHO DE EMPREGO E RELAÇÕES DO TRABALHO DA FECOMERCIO-SP

Estadão
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