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Risco político é temor dos investidores

Avaliação é de que 'caiu a ficha' entre os investidores de que está mais difícil para um candidato de centro e reformista vencer as eleições

7 jun 2018 - 16h29
(atualizado às 22h02)
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A disparada do dólar nos últimos dias foi motivada pelo desfecho que teve a greve dos caminhoneiros, associada ao retrocesso da economia e às dúvidas sobre o rumo da política econômica após as eleições - quase uma tempestade perfeita, na avaliação de economistas. O temor dos investidores é que o quadro eleitoral que vem se desenhando nas pesquisas - sem um candidato de centro no segundo turno - se confirme.

"Tudo está vinculado às eleições, sendo que as pesquisas eleitorais apontam para um segundo turno com dois extremos, um de direita e outro de esquerda. Algo a que o investidor, principalmente o externo, tem forte rejeição, especialmente com o histórico da América Latina", diz o ex-presidente do Banco Central e diretor do Centro de Economia Mundial da Fundação Getulio Vargas (FGV), Carlos Langoni. "O risco político domina a formação do risco do País."

Uma pesquisa da XP Investimentos feita entre os dias 4 e 5 de junho, e publicada nesta quinta-feira, 07, mostra que 44% dos investidores acreditam em um segundo turno com Jair Bolsonaro e Ciro Gomes - e 48% veem uma vitória de Bolsonaro.

Segundo o ex-diretor do Banco Central (BC) e chefe do Centro de Estudos Monetários do Ibre/FGV, José Júlio Senna, as condições financeiras internacionais, que foram favoráveis ao Brasil durante dois anos, começaram a piorar em janeiro e estão estáveis desde maio. A partir daí, o que houve de piora está ligado ao ambiente doméstico, com destaque para a paralisação dos caminhoneiros. "No momento em que percebemos que existe uma espécie de identificação de um governo impopular com uma agenda de reformas, os eleitores tendem a rejeitar candidatos que falem de reformas. É isso o que o mercado está vivendo agora. Está caindo a ficha", afirmou o ex-diretor do BC.

Embora o cenário atual remeta aos meses que antecederam as eleições de 2002, quando o dólar atingiu o patamar de R$ 3,99, o economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central, diz que o movimento de saída dos investidores guarda diferenças importantes com o que se viu naquele ano. Naquele momento, as contas externas brasileiras estavam ruins, além de as empresas estarem mais endividadas em dólar. Havia em 2002 uma "espiral que realimentava a crise", diz o economista, que agora se reduziu. Já as constas fiscais agora estão muito piores do que em 2002 e mais difíceis de serem corrigidas, ressalta Schwartsman. Com o fiscal tão ruim, ele afirma que cresce a expectativa por um candidato com perfil mais reformista.

Sem essa alternativa, a avaliação de Luis Eduardo Assis, ex-diretor de Política Monetária do Banco Central, é de que a volatilidade deve aumentar até as eleições de outubro. "Até a semana passada, o dólar refletia muito a turbulência internacional. Agora, em cima disso, vem uma percepção crescente do mercado de que talvez não exista um candidato de centro que seja viável", afirma. "Sobram o Jair Bolsonaro, o Ciro Gomes e, eventualmente, um candidato do PT; tudo isso é muito ruim para o mercado." Segundo Assis, ainda que haja simpatizantes do economistas Paulo Guedes (responsável pelo programa econômico de Bolsonaro), os investidores estão se acostumando com a ideia de um processo eleitoral que vai ser mais difícil e que talvez tenha um segundo turno em que nenhum dos dois candidatos levante a bandeira das reformas que o mercado defende.

O economista-chefe da Mapfre Investimentos, Luis Afonso Lima, pondera que o forte movimento de venda de ativos brasileiros é uma reação atrasada do mercado. "O mercado comprou um cenário muito positivo, de muita tranquilidade. E essa volatilidade veio pra ficar, ao sabor das pesquisas eleitorais", disse Lima. Ele rejeita a tese de que o mercado está em meio a um ataque especulativo e defende que se trata de um movimento de proteção dos investidores. "No mundo o dólar está perdendo em relação a outras moedas. Só perante o real que está ganhando. Isso sinaliza uma desconfiança, uma insegurança em relação ao Brasil."

Pressão. Em meio à tensão dos mercados e disparada da cotação do dólar nesta semana, analistas questionam uma resposta do Banco Central. O economista-chefe da Garde Asset Management, Daniel Weeks, cobrou que o presidente do BC, Ilan Goldfajn, apresente alguma comunicação o mais rápido possível. "Estamos no terceiro dia com o mercado disfuncional e o Ilan não aparece para dar uma entrevista. É um silêncio ensurdecedor", disse.

Weeks reconhece que o fundamento piorou um pouco no Brasil, em razão da crise causada pela greve dos caminhoneiros, mas considera que parte do comportamento do mercado se deve a uma percepção de que o BC está com a "mão fraca" no câmbio.

"Ontem (quarta-feira) o BC fez intervenção no meio do dia de US$ 1,5 bilhão, não foi suficiente e depois ele não fez nada. É como se ele tivesse ido para a briga, tomado um soco e depois desistido. Hoje (quinta) o BC fez isso de novo. Veio com mais US$ 2 bilhões e não foi suficiente", disse. "Há uma percepção de que o BC está sempre fazendo pouco e pedindo desculpas depois. O mercado vê que o BC está com mão fraca no câmbio e por isso está testando", acrescentou.

Na opinião de Weeks, a melhor forma de o BC lidar com a situação seria anunciando um programa para atuar no câmbio até o fim do ano. "Se o BC não age no câmbio, terá de fazer um choque de juros, como fizeram Turquia e Argentina. Mas é insanidade colocar o Brasil no mesmo grupo desses dois países que têm contas externas horrorosas. É insanidade tomar ataque especulativo na moeda sem ter déficit em conta corrente e com US$ 380 bilhões de reservas", disse.

Nessa linha, o economista considera que o atual cenário, embora inclua o risco eleitoral, é diferente do de 2002. "Em 2002 nós éramos muito mais parecidos com Argentina. Tínhamos 4% de déficit em conta corrente, que hoje é zero. Tínhamos 6% do PIB de reservas e hoje são quase 20%. Tínhamos inflação em cima da meta e hoje temos inflação abaixo do piso. Hoje temos uma linha de defesa. Se o BC não fizer nada, amanhã vai abrir pior", disse.

As projeções da Garde, por enquanto, são de 1,5% para crescimento do PIB em 2018, dólar a R$ 3,80 no fim do ano, IPCA a 3,85% em 2018 e manutenção da Selic na próxima reunião do Copom. As previsões, no entanto, podem ser alteradas, a depender da resposta que o BC dará ao nervosismo do mercado.

'Armas'. Entre as "armas" à disposição do BC, o economista-chefe da ModalMais, Álvaro Bandeira , citou as reservas internacionais brasileiras, na casa dos US$ 382 bilhões, e vendas à vista, as operações de swap cambial, que recentemente voltaram a ser lançadas com maior frequência, e leilões de linha de dólares com compromisso de recompra.

O economista ressaltou que, para interpretar o movimento nos mercados, é preciso ter em mente o cenário externo e interno. "Temos que considerar duas coisas. Primeiro, temos o dólar forte no mundo - aqui está um pouco mais forte, pois a economia está desequilibrada, temos um déficit fiscal enorme, um endividamento muito alto em relação ao PIB e a economia desacelerada", comentou o economista.

"Além disso tudo, temos todo o processo eleitoral, que está muito incerto. A percepção de risco se reflete sobre a precificação dos ativos", explicou. "É um quadro bastante conturbado, mas não dá para dizer que é um ataque especulativo", afirmou Bandeira, para quem o desempenho do Ibovespa nesta tarde, que chegou a recuar mais de 7% e ameaçar a marca dos 71 mil pontos, "é um retrato" deste contexto.

Em relação ao horizonte próximo, o economista avalia que a inflação deverá ser impactada. "Temos boas chances de a inflação começar a subir, mas ainda está longe do centro da meta e há algum espaço", explicou. Justamente por isso, apontou Bandeira, o Comitê de Política Monetária (Copom) deverá manter, ao menos na próxima reunião (19 e 20 de junho) a taxa básica de juros da economia brasileira em 6,50% ao ano. "Acho que a elevação dos juros é inevitável, mas agora não. Pode ser que [a Selic] seja elevada nos próximos encontros", disse.

Estadão
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