RS vai ao STF para revisar contrato de dívida com a União
O governo do Rio Grande do Sul ingressou na quarta-feira (23) no Supremo Tribunal Federal (STF) com uma ação de revisão geral do contrato da dívida com a União assinado em 1997, questionando sua constitucionalidade. Com isso, o RS se torna o primeiro Estado do País a solicitar judicialmente a revisão. O anúncio foi feito pelo governador José Ivo Sartori (PMDB), um dia após ele conseguir aprovar na Assembleia Legislativa, por um voto, um impopular projeto de aumento das tarifas do ICMS.
Enquanto em solo gaúcho o governo anunciava a ação, em Brasília o Tribunal de Contas da União (TCU) abriu um processo de auditoria da dívida do RS, a partir de solicitação feita pela Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados. A dívida do Estado com a União é hoje de aproximadamente R$ 50 bilhões. Em 1997, quando assinou a renegociação, o RS tomou R$ 10 bilhões. Até agora, pagou R$ 22 bilhões. Mas a conta, ao invés de diminuir, só cresceu.
Entenda o cálculo da dívida
Os fatores que permitem a multiplicação dos valores estão na base do questionamento jurídico feito pelo governo gaúcho, que usa três principais argumentos na ação: reequilíbrio econômico-financeiro, taxas e indexadores aplicados e princípios da administração pública. O fato de a lei 9.496/97, que permitiu a renegociação, ter estabelecido parâmetros diferentes para os devedores, já abre espaço às objeções feitas pelo Estado. O contrato também não possui cláusula com previsão de equilíbrio econômico-financeiro, item obrigatório nos contratos administrativos de longo prazo. E, além disso, faz uma combinação entre a tabela Price para a correção e o IGP-DI como indexador, acrescentada de detalhes contratuais que alavancam os valores, resultando em um modelo que os economistas conhecem como de juros capitalizados e aumentando o chamado resíduo da dívida. “Em uma relação entre dois entes federados, não se pode pensar em buscar o lucro”, argumenta o procurador-geral do Estado, Euzébio Ruschel.
Hoje, para o RS, os chamados serviços da dívida (a parcela mensal de amortização e juros) correspondem a 13% da Receita Líquida Real (RCL). Em valores, o percentual representa um desembolso mensal que varia de R$ 260 milhões a R$ 280 milhões. Nos dois últimos meses, sob o argumento da crise nas finanças, o governo gaúcho atrasou os pagamentos das parcelas. Com isso, seguindo o estabelecido no contrato, a União reteve valores de contas do Estado até estes atingirem os totais das parcelas devidas.
Novo round na disputa no STF
No mês de agosto o Estado já havia ingressado no STF com uma ação cautelar, preparatória à ação principal da terça-feira, na qual solicitava em caráter liminar a nulidade de algumas cláusulas do contrato; a suspensão das parcelas mensais; e o não bloqueio de valores caso o Estado atrasasse pagamentos. Na metade de setembro a liminar foi negada pelo ministro Marco Aurélio Mello, a quem caberá também a análise da ação principal. Ontem, ao anunciar a ação principal, o governo gaúcho informou que na próxima segunda-feira, 28, vai recorrer da primeira decisão de Marco Aurélio. Além de questionar todo o contrato, o objetivo do Executivo no curto prazo com a ação é ter sustentação jurídica para a continuidade do atraso das parcelas mensais.
Caso o STF não acolha o pedido da revisão geral do contrato, o RS vai pleitear que entre em vigor o que determina a lei complementar 148/2014. A lei alterou a taxa de juros para 4% ao ano sobre o saldo devedor e mudou o indexador para o IPCA, limitando os encargos à taxa Selic. O texto também prevê que a União dê descontos sobre saldos devedores dos contratos em valores equivalentes à diferença entre o saldo devedor de janeiro de 2013 e o apurado a partir da variação acumulada da taxa Selic desde a assinatura dos documentos. Neste ano, contudo, a lei complementar 151/2015 deu um fôlego à União, permitindo que faça os aditivos contratuais até 31 de janeiro de 2016. As prefeituras do Rio de Janeiro e de São Paulo obtiveram liminares favoráveis no STF para reduzir os valores das parcelas da dívida. Para o RS a revisão estabelecida na 148 permite a redução não das parcelas, mas sim do resíduo da dívida, aumentando a capacidade de endividamento. Na prática, significa que o Estado poderá contrair novos empréstimos.