Saúde, Cidades, Transportes e Educação são os mais atingidos por congelamento de gastos do governo
'Tesourada' atinge PAC, vitrine do governo Lula, e emendas parlamentares; decreto do presidente impõe contenção de despesas para cumprir regras fiscais
Os ministérios da Saúde, das Cidades, dos Transportes e da Educação foram os ministérios mais atingidos pelo congelamento de R$ 15 bilhões em gastos do governo federal no Orçamento de 2024. O decreto com a contenção de despesas, assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), foi publicado na noite desta terça-feira, 30, em edição extra do Diário Oficial da União.
O congelamento total no Ministério da Saúde, a área mais afetada, somou R$ 4,4 bilhões; o Ministério das Cidades foi atingido em R$ 2,1 bilhões; Transportes teve uma contenção de R$ 1,5 bilhão; o Ministério da Educação sofreu um congelamento de R$ 1,3 bilhão (veja lista completa abaixo).
O Programa de Aceleração do Crescimento (Novo PAC), vitrine do governo Lula que possui verba em vários ministérios, teve um congelamento de R$ 4,5 bilhões. Emendas parlamentares também foram atingidas. As emendas de comissão tiveram um congelamento de R$ 1,1 bilhão, enquanto as emendas de bancada sofreram uma contenção de R$ 153,6 milhões.
O governo congelou os gastos para cumprir o arcabouço e a meta fiscal após a arrecadação vir abaixo do esperado e os gastos obrigatórios dispararem. O valor foi dividido em R$ 11,2 bilhões bloqueados para cumprir o arcabouço fiscal e R$ 3,8 bilhões contingenciados devido à arrecadação menor do que o previsto (veja abaixo).
As duas medidas têm o efeito prático de congelar diversas programações no Orçamento, como a manutenção das atividades dos ministérios, serviços de saúde, educação, obras e ações de prevenção a desastres. Se a verba para a obra em uma estrada for afetada, por exemplo, o projeto fica parado por conta do bloqueio.
A contenção atingiu principalmente as despesas de custeio do Poder Executivo que ficam sob controle direto dos ministérios, no total de R$ 9,3 bilhões. Nesse caso, podem ser afetadas a manutenção dos órgãos federais e o custeio de serviços de saúde e educação.
O Ministério do Meio Ambiente foi a única pasta poupada da "tesourada" - embora o ministro da Casa Civil, Rui Costa, tivesse dito que todas as pastas seriam atingidas. O Ministério das Mulheres, por outro lado, foi o órgão que mais sentiu o congelamento, proporcionalmente ao seu orçamento, com uma contenção de R$ 62,7 milhões, 14% do total.
Os ministérios têm até o dia 6 de agosto para indicarem quais programas serão afetados. Mesmo com o congelamento, a equipe econômica projeta que as contas públicas fechem no vermelho em 2024, com um déficit de R$ 28,8 bilhões, cumprindo a meta fiscal zero no piso mínimo, com despesas batendo no teto permitido pelo arcabouço.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), anunciou o congelamento no dia 18 de julho. Conforme o Estadão revelou, os ministérios tentaram minimizar a tesourada e gastaram R$ 8,8 bilhões em uma semana após o anuncio.
Até segunda-feira, 29, os ministérios do governo Lula haviam comprometido (empenhado, no jargão técnico) 65% das despesas não obrigatórias do ano e havia um espaço de R$ 56,9 bilhões em gastos não empenhados. Tirando os pisos de saúde e educação, sobravam R$ 28,7 bilhões.
O bloqueio e o contingenciamento só podem ser desfeitos se o Executivo voltar a ficar com as contas em dia e verificar que não há mais risco para o arcabouço e para a meta. A dinâmica, porém, está na contramão, com arrecadação menor e gastos obrigatórios crescendo.
A equipe econômica quer transformar o congelamento em cortes definitivos para dar suporte ao crescimento dos gastos obrigatórios neste ano. O presidente Lula enviou um projeto de lei ao Congresso Nacional neste mês pedindo autorização para anular até 100% das ações congeladas. Hoje, a lei orçamentária autoriza cortar apenas 30% de cada programação para cobrir gastos obrigatórios.
Qual a diferença entre bloqueio e contingenciamento?
No contingenciamento, o governo congela despesas quando há frustração de receitas, a fim de cumprir a meta fiscal (saldo entre receitas e despesas, sem contar os juros da dívida). Para este ano e para 2025, a meta é de zerar o déficit das contas públicas.
Como a meta tem uma banda (intervalo de tolerância) de 0,25 ponto porcentual do PIB para cima e para baixo, o governo cumpre a meta desde que não extrapole o piso da banda - ou seja, um déficit de R$ 28,8 bilhões.
Já o bloqueio é realizado para cumprir o limite de despesas do arcabouço fiscal - de 2,5% ao ano acima da inflação. Assim, quando há aumento de gastos obrigatórios (como aposentarias, por exemplo), o governo bloqueia despesas não obrigatórias (como custeio e investimentos) para compensar.