Semana mais curta de trabalho é estratégia para retenção de talentos
Num cenário de mercado aquecido em que sobram vagas e faltam profissionais, o benefício reduz rotatividade e aumenta a receita das empresas
A semana de quatro dias de trabalho tem se mostrado uma boa estratégia de retenção de talentos. Num cenário de mercado aquecido, como o de tecnologia, em que sobram vagas e faltam profissionais, ao oferecer um dia a mais de descanso como benefício, as empresas conseguem disputar mão de obra com companhias estrangeiras que têm salários maiores.
Na NovaHaus, essa redução da rotatividade já teve impacto nos custos. O presidente da empresa, Leandro Pires, diz que houve uma perda na entrega, mas não na produtividade. Ou seja, as pessoas diminuíram a jornada de trabalho em 20%, com a quarta-feira livre, mas deixaram de produzir somente 7%. "Todavia, essa porcentagem foi compensada com a queda da rotatividade e com um aumento de receita."
A redução da jornada de trabalho foi definida por meio de acordos individuais e, inicialmente, tem duração de oito meses contados a partir de março. Entre os benefícios ofertados aos funcionários, ainda consta um vale cultura, no valor de R$ 400, e duas assinaturas de streaming, os quais têm sido muito bem aproveitados por Alyne Passarelli, gerente de contas da NovaHaus.
"Faço várias coisas na quarta off, desde passeios, que no final de semana são mais concorridos, a maratona de séries. A ideia é ter uma pausa no meio da rotina turbulenta e não um final de semana prolongado."
Para medir o sucesso da estratégia, a NovaHaus adotou como indicadores de avaliação o comparativo de entregas, pesquisas internas para medir o nível de felicidade, valores dos projetos e a quantidade de faltas. "Os funcionários estão mais felizes, faltam menos e a receita aumentou."
Resultados semelhantes foram observados na Crawly, que instaurou a semana mais curta em março. "Tivemos um aumento de demanda por causa do comercial e do marketing e conseguimos entregar tudo sem atrasos", afirma a gerente financeira da empresa, Luisa Lana Stenner.
Tanto para Crawly quanto para a AAA Inovação, o sucesso da estratégia é atribuído, entre outros fatores, a uma reorganização dos processos internos. "Acabamos com o e-mail, grupos de whatsapp, e adotamos metodologias e ferramentas ágeis de gestão de projetos e comunicação interna, como Slack, Runrun.it e Discord", afirma o presidente da AAA Inovação, Juan Pablo Boeira.
A aceleradora de negócios adotou a jornada mais curta de trabalho em janeiro deste ano. Em cinco meses, foi constatado um crescimento de 120% do faturamento. "Quando a gente percebeu que estava mais eficiente, criamos o 'Reset Day' (dia de resetar) às sextas-feiras."
Além de monitorar semanalmente aspectos como entregas (performance), custos fixos, eficiência e saúde mental, a AAA Inovação mantém contato constante com os clientes para saber o nível de satisfação. "Muitos relataram que nem notaram a alteração na jornada de trabalho", diz o CEO, que também passou a receber cerca de 80 currículos por semana. "Antes, eram 30."
"A decisão de adotar a semana de quatro dias diz muito mais sobre como evoluir a sua produtividade e eficiência do que reduzir um dia de trabalho", afirma o presidente da Winnin, Gian Martinez. A empresa de tecnologia carioca adotou a sexta-feira livre em agosto do ano passado e já consegue mensurar aumento de bem-estar entre colaboradores, satisfação dos investidores e redução da rotatividade.
"A gente costuma gastar muita energia com atividades que não são tão importantes. A semana de quatro dias é um estímulo para repensar processos. Times focados entregam melhores resultados", explica o executivo, que revisou objetivos, metas e rituais de trabalho e investiu na comunicação assíncrona. Agora, por exemplo, as reuniões duram no máximo 30 minutos.
O primeiro passo para a redução da jornada envolveu um trabalho de educação junto aos trabalhadores. "Dedicamos um tempo para que todos estudassem o assunto e entendessem porque fazia sentido para o nosso contexto e como isso apontava para o futuro do trabalho", diz Martinez.
A startup observou, por meio de pesquisas internas de clima e felicidade, que o aumento do bem-estar dos colaboradores refletiu diretamente na produtividade. Inicialmente, o dia livre era usado para resolver pendências, como ida ao médico. Hoje, muitos dedicam o momento ao estudo, à leitura e realização de cursos, o que, segundo o executivo, têm trazido resultados positivos para o trabalho, os quais já são notados pelos investidores.
"Falamos muito do dia a menos e pouco de como as pessoas estão aproveitando esse dia a mais em suas vidas", ressalta ele, que acredita ser um processo de implementação e aprendizado constante porque envolve novas contratações.
Sete dicas para a implementar a semana de quatro dias na sua empresa
Na opinião de gestores ouvidos pela reportagem, empresas que queiram adotar a semana de trabalho mais curta, sem alteração de salário, precisam observar os seguintes aspectos:
1. Cultura organizacional: Verifique se a cultura interna contribui para a formação de pessoas engajadas, com vontade de fazer boas entregas e que estejam alinhadas aos valores e princípios da empresa.
2. Educação: Antes da redução da jornada de trabalho, dedique tempo para que todos, principalmente a liderança, estudem o novo modelo e entendam porque, de forma objetiva e prática, faz sentido para o contexto da empresa.
3. Legislação: Atente para as questões regulatórias, leis trabalhistas e orientações dos sindicatos para que a adoção da semana de quatro dias seja feita de forma correta e sem traumas futuros, caso seja necessário reverter a decisão.
4. Objetivos: Reveja os objetivos da empresa e sequencie o que for mais urgente. Mais do que resolver todos os desafios de uma vez, é importante focar no que realmente irá fazer a diferença.
5. Rituais: Repense os rituais e tarefas diárias para tornar os processos mais eficientes e aumentar a produtividade, por exemplo, a redução do tempo de reuniões.
6. Comunicação: mantenha as expectivas entre todos os envolvidos alinhadas antes da decisão oficial. Ferramentas de comunicação assíncrona, como o Slack, também são boas aliadas. Os colaboradores têm de estar cientes de que se trata de uma estratégia nova, que pode não dar certo futuramente.
7. Monitoramento: estabeleça indicadores de monitoramento e avaliação do sucesso da estratégia, tais como como entrega e produtividade, custos, receita, eficiência e níveis de felicidade entre os colaboradores.
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