Senado aprova MP da subvenção do ICMS, principal aposta de Haddad para elevar arrecadação
Foram 48 votos a favor e 22 contra; proposta vai para sanção do presidente Lula
O Senado aprovou nesta quarta-feira, 20, a Medida Provisória (MP) da subvenção do ICMS, principal aposta do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para levantar receitas extras em 2024 e, com isso, tentar cumprir a meta de zerar o déficit das contas públicas ano que vem.
Foram 48 votos a favor e 22 contra. Após a análise de destaques (tentativas de mudança no texto-base), a proposta seguiu para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A aprovação da MP ocorre após uma série de impasses que travaram a análise no Senado na terça-feira, 19. Haddad acompanhou a votação no plenário. Após deixarem a sessão de promulgação da reforma tributária, os integrantes da equipe econômica foram conversar com senadores em uma antessala da presidência do Senado.
O Estadão/Broadcast apurou que Haddad conversou com o senador Laércio (PP-PE). Depois disso, deixou a sala e foi para o plenário do Senado conversar com Jaques Wagner (PT-BA), líder do governo na Casa. Ele estava acompanhado do secretário-executivo da pasta, Dario Durigan.
Durante a votação, partidos como MDB, PSD, PT, PDT e PSB apoiaram a MP. Já a oposição, representada por PL, Republicanos e Novo, orientou os senadores a rejeitarem a proposta. O PP, por sua vez, liberou a bancada para votar como quisesse.
A expectativa da Fazenda é arrecadar R$ 35,3 bilhões em 2024 com a proposta. A MP restringe o uso de benefícios fiscais por parte de grandes empresas, o que fará com que essas companhias recolham mais impostos à União.
Acordo para destravar a MP
Após a aprovação da MP, Haddad disse que o acordo feito com os senadores para destravar a proposta, na verdade, foi apenas um esclarecimento. O ministro se comprometeu a emitir parecer da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) para que não restem dúvidas sobre os pontos que haviam virado impasse na Casa.
O ponto principal dizia respeito à retroatividade, ou seja, à cobrança de dívidas passadas, que estão sendo cobradas na Justiça. Haddad afirmou que os litígios ligados ao crédito presumido (uma modalidade de incentivo) não serão cobrados, diferentemente das outras ações ligadas a outros temas da subvenção do ICMS, que terão desconto de até 80%.
"A preocupação dos senadores era de que aqueles 80% (de desconto) dissessem respeito a uma coisa que já havia sido julgada pelo STJ, que era o crédito presumido. Eu disse que não. Que a questão do crédito presumido já está julgada e que, portanto, o desconto é de 100%", afirmou Haddad, ao explicar o acordo para a votação no Senado.
Os abatimentos, frisou o ministro, são sobre os litígios que não tratam de crédito presumido. "Aí, sim, cabe o desconto de 80%, conforme a MP", afirmou. Para dar maior segurança jurídica à questão, no entanto, Haddad se comprometeu a emitir um parecer da PGFN.
Além disso, Haddad se comprometeu a aumentar o prazo de pagamento dessas dívidas passadas. Pelo texto da MP, as empresas poderiam pagar os 20% restantes (após a aplicação do desconto de 80%) em 12 parcelas mensais. O compromisso foi ampliar para um período de cinco anos, o que, segundo o ministro, pode ser garantido por meio de resolução.
"Vou discutir com a PGFN se nós podemos, no âmbito da transação (tributária), estender o prazo", disse. Segundo Haddad, a expectativa de arrecadação da MP se mantém em R$ 35,3 bilhões, apesar das mudanças, já que o foco da medida é no fluxo de pagamento futuro.
Questionado se já é possível garantir a meta de déficit zero no ano que vem, conforme estabelecido na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), Haddad disse que é necessário aguardar para ver se as projeções da Receita Federal e da PGFN vão se concretizar.
"Tenho que me fiar nas projeções deles. Eles podem errar? Podem. Se eles tiverem errado para mais, melhor. Se tiverem errado para menos, terei de tomar providências. É assim que funciona", afirmou.
Entenda a MP da subvenção
A MP foi aprovada no plenário da Câmara no último dia 15, após acertos políticos entre o Palácio do Planalto e o Centrão, que envolveram o compromisso do governo em não contingenciar emendas parlamentares de comissão e a derrubada de uma série de vetos presidenciais.
Durante a votação na comissão mista composta por deputados e senadores, etapa que antecedeu a votação nos plenários das duas Casas, o relator, deputado Luiz Fernando Faria (PSD-MG), manteve a previsão de que o crédito fiscal das empresas - em caso de benefícios ligados a investimentos - ficará restrito a 25% do Imposto de Renda Sobre Pessoa Jurídica (IRPJ).
Ou seja: pela proposta, as empresas precisarão recolher IRPJ, CSLL, PIS e Cofins (impostos federais) sobre o valor do incentivo estadual, e receberão de volta um crédito do Imposto de Renda. Mas apenas quando os recursos forem usados para investimento, não mais para custeio, como ocorria antes.
Na visão da equipe econômica, a nova sistemática irá coibir abusos nesse tipo de abatimento, os quais têm gerado uma "sangria" nos cofres do Tesouro Nacional.
Haddad reiterou nesta quarta-feira que a intenção do governo é "colocar ordem" no sistema tributário, e que isso não tem nenhuma relação com elevação de carga tributária. No caso da subvenção, ele voltou a dizer que o governo nunca teve intenção de atacar o estoque.
"O que nós estamos fazendo é condicionar os descontos ao pagamento regular a partir de 2024. A gente quer a garantia de que vamos subvencionar investimentos. A União está concordando com a subvenção do investimento, incentivada por um estado desde que o investimento ocorra. E não com acontecia no passado, em que qualquer tipo de gasto subtraía a base de cálculo do imposto de renda, isso não tem cabimento", criticou o ministro.
Do lado das empresas, porém, há reclamações de que as novas regras vão onerar os investimentos, representam uma mudança brusca de entendimento e serão, inevitavelmente, judicializadas. Para as companhias, elas restringem a decisão sobre o tema - adotada em maio pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) - e reforçam a insegurança jurídica que existe para investir no Brasil.
O líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RN), endossou as críticas à MP durante a votação no plenário. "Estamos fazendo a festa dos advogados tributaristas, porque estamos ferindo direitos adquiridos", declarou.
Juros sobre Capital Próprio
A MP também inclui mudanças no Juro sobre Capital Próprio (JCP), um tipo de remuneração feita pelas grandes empresas aos seus acionistas. Como antecipou o Estadão, porém, trata-se de uma versão "minimalista" em relação à proposta original.
Inicialmente, o governo pretendia acabar com o mecanismo, mas foi cedendo nas negociações com os parlamentares: de um meio termo entre a extinção e a manutenção do JCP, a atual proposta ataca apenas o planejamento tributário e deixa mudanças mais bruscas de lado - o que vai reduzir o impacto arrecadatório, originalmente calculado em R$ 10,5 bilhões.
Segundo Haddad, a queda na expectativa de arrecadação, com a desidratação da JCP, será compensada com medidas administrativas, que não passam pelo Congresso, ainda este ano.