STF julga trabalho intermitente e acende alerta no governo
Equipe econômica teme que Supremo decida pela inconstitucionalidade da regra, que registra hoje quase 200 mil vínculos trabalhistas
Os rumos do julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a validade do trabalho intermitente, modalidade mais flexível de contratação aprovada na última reforma trabalhista, acenderam o alerta na equipe econômica, que passou a ver risco real de a Corte declarar inconstitucional esse tipo de vínculo. Caso isso aconteça, quase 200 mil postos desse tipo de emprego poderiam ser extintos sem garantia de recontratação.
Segundo apurou o Estadão/Broadcast, o governo teme que uma decisão desfavorável no STF acabe travando qualquer chance de discutir futuramente novas formas de trabalho, inclusive para profissionais que atuam em plataformas e aplicativos por demanda. Além disso, na visão da área econômica, os atuais trabalhadores intermitentes estariam ameaçados e poderiam perder o emprego, num momento em que o desemprego está em alta na esteira da pandemia da covid-19.
Dados oficiais apontam que havia, em outubro, 196.966 vínculos de trabalho intermitente no Brasil (um trabalhador pode ter mais de um vínculo). A modalidade é uma das poucas que registra saldo positivo em 2020, com 52,9 mil novos postos. No trabalho intermitente, criado em 2017, o profissional é contratado, mas recebe a remuneração de acordo com o número de horas trabalhadas, que pode variar de um mês para o outro.
O julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) que questionam o trabalho intermitente começou na última quarta-feira. O relator, ministro Edson Fachin, votou pela inconstitucionalidade do vínculo e frustrou o governo.
Na quinta-feira, os ministros Kássio Nunes Marques e Alexandre de Moraes abriram divergência e votaram pela validade do vínculo instituído pela reforma trabalhista. A Procuradoria-Geral da República (PGR) também havia dado parecer nesse sentido. O julgamento foi interrompido após um pedido de vista feito pela ministra Rosa Weber e não tem data para retornar à pauta.
As centrais sindicais, por sua vez, torcem justamente pela inversão do placar. O presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah,diz que o julgamento é importante para solucionar "uma série de inconstitucionalidades da lei trabalhista de 2017". "O trabalho intermitente num formato regrado, com convenção coletiva, é uma coisa. Interposto e facultado à empresa fazer o que quiser é comparável à escravidão", critica.
Setores como serviços e construção estão de olho no julgamento. O presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), Paulo Solmucci Jr., afirma que o contrato intermitente hoje é uma demanda do próprio trabalhador, que quer conciliar o emprego com outros compromissos. Segundo ele, se o STF declarar a modalidade inconstitucional, isso vai comprometer ainda mais o setor, que já sofre com a pandemia. Mais de 30% das empresas do segmento fecharam as portas e 53% estão operando no vermelho, segundo a associação.
O vice-presidente de Política de Relações Trabalhistas da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), Fernando Guedes, diz que o contrato intermitente é uma "evolução positiva" da legislação trabalhista, pois permitiu formalizar trabalhadores que antes não tinham nenhum tipo de proteção nem contribuíam à Previdência para assegurar uma futura aposentadoria.