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'Temos de tornar tarifas e cobranças do cartão de crédito visíveis para a população', diz secretário

Secretário de Reformas Econômicas do Ministério da Fazenda, Marcos Barbosa Pinto, dá indicações de como o governo pretende estimular um processo de queda de juros no rotativo

27 jun 2023 - 14h41
(atualizado às 16h31)
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Solução não passa, garante Barbosa Pinto, pela limitação das taxas do rotativo do cartão ou pelo fim do parcelado sem juros.
Solução não passa, garante Barbosa Pinto, pela limitação das taxas do rotativo do cartão ou pelo fim do parcelado sem juros.
Foto: Wilton Júnior/Estadão / Estadão

BRASÍLIA- O secretário de Reformas Econômicas do Ministério da Fazenda, Marcos Barbosa Pinto, avalia que o nível de competição das operações do rotativo do cartão de crédito é muito baixo. Essa é uma das razões dos juros altos nesse mercado no Brasil.

Em entrevista ao Broadcast/Estadão, ele explica como funciona o subsídio cruzado e dá indicações de como o governo pretende encaminhar a solução do problema para estimular um processo de queda de juros no rotativo. A solução não passa, garante Barbosa Pinto, pela limitação das taxas ou pelo fim do parcelado sem juros, muito utilizado no comércio no Brasil.

O diretor do BC Renato Gomes falou que o BC e o governo estão estudando mecanismos para dar mais transparência ao rotativo do cartão de crédito, como a fatura ter mais transparência da taxa e a melhorar a portabilidade. É suficiente?

O que mais me preocupa e acho que preocupa também o BC são os juros elevados do rotativo. Segundo dados do BC, são juros maiores que 400% ao ano. Temos estudado junto com o BC e o mercado uma solução para esse problema, mas não é um problema simples. Existem tarifas sendo cobradas em toda essa cadeia. Se mexer em um lado só da cadeia, pode mexer no equilíbrio do mercado como um todo.

A questão é que o problema está no que é cobrado de quem não está pagando juros?

Olha, o que parece haver é um subsídio cruzado entre o pagamento do cartão à vista e o pagamento do cartão de forma parcelada. É menos claro o impacto que isso tem nos juros do rotativo. Mas o sistema como um todo é formado por tarifas que se equilibram. O que temos que fazer no longo prazo é tornar essas tarifas e cobranças visíveis para a população, para que a competição possa se dar de forma transparente para o consumidor.

Pode explicar melhor o que seria esse subsídio cruzado?

Quando você faz uma compra no parcelado sem juros, pelo simples fato do prazo que aquela fatura fica em aberto, o risco do emissor do cartão é maior, porque o risco de inadimplência é maior. E, por outro lado, o banco não está cobrando juros naquela fatura. E quando ele cobra à vista, ele recebe o valor equivalente, correndo menos risco. Então, muitas vezes acontece que a inadimplência é maior nas parcelas alongadas do que nas parcelas mais curtas ou à vista. E se cria o subsídio cruzado. O resultado é que hoje já tem um sistema no Brasil com muita inadimplência e os juros do rotativo também estão muito elevados. Acredito que existe uma oportunidade muito grande de a gente reduzir esses juros com medidas adequadas.

São medidas adicionais ao que o diretor do BC Renato Gomes falou?

Não vamos resolver o problema com uma medida só. Vai ser um conjunto de medidas visando atacar o problema sem desequilibrar o sistema.

O parcelado tem mais risco para o banco e o à vista, menos risco; mas o custo da venda é a mesma. É isso?

Exatamente. Em geral, os juros serviriam para remunerar diferentes níveis de risco. Mas, como não está cobrando juros, não está fazendo diferenciação entre os riscos entre as duas operações.

Mas o problema é o parcelado sem juros? Por que há informações de que os bancos gostariam de limitar o parcelado sem juros, mas tem o problema do varejo…

Então, mas não é só isso. O parcelado sem juros tem outra questão que é muito importante. Ninguém proíbe os bancos de cobrarem juros, nem obriga que o parcelado sem juros ocorra. É algo que é resultado das forças de mercado. Pode ser que, por força disso, tenha se instalado um subsídio cruzado, mas não foi o governo que levou a essa situação, não foi ninguém, foi a própria dinâmica do mercado que levou a essa situação. Não nos parece que o problema seja o parcelado sem juros, mas os juros elevadíssimos do cartão de crédito do rotativo.

Mas é elevado por quê?

É resultado do sistema. Outra coisa que é muito verdadeira e que precisa ser dita é que o nível de competição do rotativo é muito baixo. Isso é um ponto importante. Porque, uma vez que houve a inadimplência, nenhum banco vai querer financiar aquela dívida do rotativo. Não há mais competição naquele momento em que houve inadimplência. O cliente fica sujeito aos juros que são cobrados pelo emissor do cartão. E o cliente não percebe ex-ante, no momento em que pega o cartão, qual vai ser os juros do rotativo depois. Esse é um problema relevante.

A portabilidade ajuda nisso?

Pode ajudar, na medida em que você pode transferir o saldo do cartão de um banco para o outro. Mas a gente precisa saber também que a portabilidade não vai resolver o problema, porque, se o cliente já inadimpliu a fatura, é de risco alto, então vai ser difícil arranjar um banco que esteja interessado em receber o crédito dele e que não queira cobrar taxas bastante elevadas também.

Mas a ideia não é proibir o parcelado?

Não é essa a ideia.

Nem tabelar os juros do rotativo?

Não pensamos em limitar o parcelado sem juros nem em tabelar os juros do cartão.

Nem acabar com o rotativo?

Não quero especular sobre outras medidas, não. Porque acho que a gente tem que sentar na mesa, discutir a fundo os problemas. Existe uma pressão legítima da sociedade com relação a esse nível de juros.

Quando o sr. fala de transparência, seria ter as tarifas bem discriminadas na fatura?

Acho que essa é uma das direções. Mas acho importante dar não só mecanismos tradicionais de informação. Fatura ninguém usa mais. Temos que fazer hoje o digital e uma comunicação clara, que destaque para a população não só o valor nominal desse juro, mas também o impacto que pode ter na vida das pessoas. É importante se comunicar com a população de uma maneira correta, de modo que possa entender que esses juros de 400% ao ano podem inviabilizar toda a situação econômica de uma família. Precisamos comunicar o problema de forma clara.

Essa é uma preocupação do ministro Haddad?

É uma preocupação de todo o governo.

O que entra nesse jogo quando o pagamento é à vista? Já tem um juro embutido? Quando se paga à vista, se está pagando a inadimplência dos outros?

Isso é outro subsídio que existe. Quem financia o parcelado sem juros, na verdade, é o lojista, porque ele só recebe na medida em que cada parcela vai sendo paga. O risco de crédito é do banco, mas os recursos são do lojista. Ele só vai receber na medida em que forem vencendo as parcelas. É claro que o lojista tem custo financeiro com isso. Em tese, poderia oferecer preço mais baixo para quem paga à vista, mas, na prática, isso não acontece. Isso incentiva as pessoas que, a princípio, comprariam à vista, a comprarem a prazo.

Se não fosse o subsídio cruzado, poderia ter a pechincha, o desconto à vista?

O desconto à vista é permitido hoje na legislação. É um pouco difícil no processo de venda dos varejistas encaixar esse desconto à vista. Eles preferem simplificar esse processo de venda e fazer um preço único. Mas eles podem hoje diferenciar preço. Isso tem acontecido mais. Com o Pix, por exemplo, que não tem os mesmos custos do arranjo de pagamentos do cartão, os lojistas, muito frequentemente, oferecem descontos à vista.

Estadão
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