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UE e Mercosul correm com acordo para liberar 90% do comércio

Do lado europeu, a grande resistência ao avanço das negociações provém principalmente do agronegócio francês e irlandês

17 mai 2014 - 11h00
(atualizado em 19/5/2014 às 10h24)
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<p>As exportações da UE estão concentradas em produtos de maior valor como azeite, vinhos, malte e outras bebidas</p>
As exportações da UE estão concentradas em produtos de maior valor como azeite, vinhos, malte e outras bebidas
Foto: Nacho Doce / Reuters

A União Europeia se prepara para uma "dança das cadeiras" na próxima semana, com a realização de processos eleitorais que devem decidir a nova composição do Parlamento Europeu, assim como o novo presidente da Comissão Europeia e o quadro executivo do bloco. Enquanto isso, a diplomacia brasileira corre contra o tempo e busca concluir uma proposta que avance as negociações para um acordo de livre comércio entre UE e Mercosul antes de junho.

Entre os dias 22 e 25 de maio, os europeus vão às urnas para escolher os eurodeputados. Em outubro, o Brasil se prepara para eleger um novo presidente. Consultado pelo Terra, o comissário europeu de Comércio, Karel de Gucht, reconhece que ambas as regiões estarão com o foco nos processos eleitorais nas próximas semanas e meses, mas que existe um “roteiro” para avançar baseado em um mandato jurídico claro. “Foi acordado em Santiago do Chile em janeiro de 2013 e reconfirmado em recente reunião dos principais negociadores em Bruxelas com vista à troca de ofertas de acesso a mercados”, declara.

O presidente da associação EUBrasil em Bruxelas, Luigi Gambardella, avalia que não deve haver “empecilhos” para essa troca de propostas, mas também acredita que se for feita até junho poderia representar um grande impulso às negociações. “A Comissão Europeia trocará os comissários e alguns cargos de alto escalão em novembro. Porém os técnicos que já trabalham dentro dos temas não são deslocados como regra geral”, explica. “Sabemos que faltam apenas alguns pontos para que um dos países do Mercosul consiga melhorar a oferta dele e aumentar a média do bloco, uma vez que todos os demais parceiros já colocaram sobre a mesa a liberalização de mais de 90% (do comércio), que é o mínimo acordado com a UE”, revela Gambardella.

Diversos analistas em todos os países do Mercosul já destacaram as dificuldades para a Argentina em liberalizar mais de 80% de seu comércio, mas o chanceler brasileiro, Luiz Alberto Figueiredo, colocou panos quentes nas críticas na semana passada e afirmou que o país vizinho está fazendo um “enorme esforço”. “É um mito dizer que existe um atraso por causa da Argentina ou de um país X. É um esforço técnico muito complexo e que está em sua última fase”, defendeu o ministro. 

Paris fica ainda mais cara após aumento de impostos:

Receio europeu

Do lado europeu, a grande resistência ao avanço das negociações provém principalmente do agronegócio francês e irlandês. Bernard Lannes, presidente da Coordenação Rural (CR) (segundo maior sindicato agrícola da França), reclama do silêncio da Comissão Europeia em torno à retomada de negociações com os Estados Unidos e com o Mercosul. “O Brasil, gigante agroalimentar, e a Argentina, terão tudo a ganhar com tal acordo”, exalta em artigo publicado nesta quinta-feira. “Esses países não tem sequer as mesmas normas que a UE em matéria de utilização de pesticidas e de organismos geneticamente modificados (OGM)”, protesta.

Já os irlandeses manifestaram preocupação com o possível aumento da importação de carnes do Mercosul. Para a Associação de Fazendeiros Irlandeses (Ifa), o acordo de livre comércio fechado entre UE e Canadá em outubro do ano passado já prejudicou muito o setor agrícola europeu e não deveria se repetir com EUA e a América do Sul. Sobre o Brasil, o secretário geral da Ifa, Pat Smith, ressalta que o preço da carne brasileira é 50% menor do que na Europa.

Por outro lado, as associações baseadas em Bruxelas para cooperação internacional apresentam a mesma face da moeda com mais otimismo. “O setor agroalimentar brasileiro é muito competitivo e poderá permitir um comércio mais equilibrado entre os blocos. As exportações da UE estão concentradas em produtos de maior valor como azeite, vinhos, malte e outras bebidas. Com o possível acordo, os produtos agroalimentares da UE também terão mais cota de mercado brasileiro e por consequência do Mercosul”, afirma o presidente da EUBrasil.

Arnaldo Abruzzini, secretário-geral da Eurochambres, associação de comércio que reúne cerca de 20 milhões de empresas na UE, também pondera que existe complementaridade e que  ambos blocos devem buscar uma situação em que todos ganham. “Ao considerar que a UE recentemente conseguiu reformar internamente sua Política Agrícola Comum (Pac), fico confiante de que a Europa também pode avançar deste lado das negociações (com o Mercosul)”, conclui.

Prestes a terminar o mandato de comissário europeu de Comércio, De Gucht também defende a continuidade da abertura do comércio internacional sobretudo em tempos de crise. “Nenhum país nunca se desenvolveu com fronteiras fechadas: economias abertas crescem mais rapidamente e tornam-se mais competitivas. Especialmente em tempos de crescimento lento em casa e as políticas orçamentais rigorosas, o comércio é uma maneira muito eficiente em termos de custo para impulsionar o crescimento”, argumenta.

Fim do Mercosul?

Dentro do Brasil, uma das maiores críticas ao avanço das negociações com a UE veio do ex-alto representante-geral do Mercosul, o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, que vaticinou em artigo publicado em abril que um acordo entre a UE e o Mercosul seria o “início do fim” do bloco do cone sul. Entre vários pontos, ele indica que como a tarifa média de 4% para produtos industriais na UE é muito mais baixa do que a tarifa média aplicada no Mercosul, de cerca de 12%, a União Europeia teria, no caso de uma eliminação recíproca de 90% das tarifas, uma vantagem muito maior do que o Brasil. “E o atual déficit brasileiro no comércio de produtos industriais com a Europa, que já é significativo e crônico, se agravaria ainda mais, mesmo com o período de desgravação de quinze anos”, opinou.

Fonte: Especial para Terra
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