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Um guia simples para entender o pacote de corte de gastos do governo aprovado no Congresso

Entenda os principais pontos do pacote de ajuste fiscal apresentado pelo governo Lula e aprovado com alterações por deputados e senadores

21 dez 2024 - 03h10
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O Congresso Nacional concluiu a votação do pacote de contenção de gastos apresentado pelo governo Lula. As medidas têm o objetivo de conter o crescimento das despesas, manter o arcabouço fiscal de pé e retomar a confiança no equilíbrio das contas públicas.

O pacote é composto por uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) e dois projetos de lei, todos aprovados pelo Congresso nesta semana. Os parlamentares, porém, desidrataram as medidas propostas pelo Ministério da Fazenda, fazendo com que o pacote, que já havia sido considerado insuficiente por muitos analistas, perdesse mais força.

Inicialmente, o governo estimou economia de R$ 71,9 bilhões até 2026 com as propostas, mas revisou a estimativa para R$ 69,8 bilhões após as modificações feitas pelo Congresso. Especialistas em contas públicas e instituições financeiras, porém, contestam o cálculo da Fazenda e preveem um impacto fiscal menor, da ordem de R$ 40 bilhões a R$ 50 bilhões.

Veja a seguir o que diz pacote fiscal aprovado pelo Congresso:

Congresso concluiu votação dos três projetos do pacote de corte de gastos apresentado pelo governo Lula
Congresso concluiu votação dos três projetos do pacote de corte de gastos apresentado pelo governo Lula
Foto: Dida Sampaio/Estadão / Estadão

Salário mínimo

O pacote limita o aumento real (acima da inflação) do salário mínimo. Hoje, o valor é reajustado pela inflação do ano anterior e o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos antes. Agora, haverá aumento garantido de 0,6% ao ano acima da inflação, independentemente do PIB, mas com limite de aumento de 2,5%.

Essa é a mudança de maior impacto no pacote, pois também afeta o crescimento das despesas atreladas ao salário mínimo, como parte dos benefícios previdenciários, o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e o seguro-desemprego.

Abono salarial

O pacote altera o abono salarial do Programa PIS/Pasep, espécie de "14º" pago a trabalhadores que ganham até dois salários mínimos. Com a proposta, haverá uma transição nos próximos anos para que o abono seja concedido a quem recebe até um salário mínimo e meio — o que, na previsão do governo, deve ocorrer em 2035.

O teto para o recebimento do benefício, hoje indexado à valorização do salário mínimo, passará a ser corrigido pela inflação a partir de 2026. A previsão de economia é de R$ 18,1 bilhões entre 2025 e 2030.

Supersalários

Alterações feitas no Congresso enfraqueceram o combate aos supersalários no funcionalismo público. A PEC proposta pelo governo previa que teria de ser enviado um projeto de lei complementar para definir quais "penduricalhos" (remunerações e auxílios extras ao salário) poderiam ser excluídos (ou seja, não seriam contabilizados) do teto remuneratório da administração pública, atualmente de R$ 44 mil mensais.

Os parlamentares enfraqueceram esse comando determinando que isso seria definido por um projeto de lei ordinária, que exige menos votos para aprovação e é mais fácil de ser alterada. Na prática, isso permitiria flexibilizações e, segundo especialistas, dá brecha para permitir a continuidade dos "penduricalhos" que não são contabilizados no teto e que levam aos supersalários.

Fundeb

O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização de Profissionais da Educação (Fundeb) é uma das principais fontes de financiamento da educação pública no País. O governo queria que até 20% dos recursos que coloca no Fundeb fossem destinados ao ensino em tempo integral. Desta maneira, o Fundeb bancaria um custo que hoje sai diretamente dos cofres do Tesouro. Com a mudança, o governo teria um alívio fiscal nas despesas públicas de R$ 11,6 bilhões no ano que vem.

A Câmara dos Deputados reduziu o porcentual para 10% e estabeleceu que o dinheiro da complementação da União no Fundeb será usado para ensino em tempo integral apenas em 2025, diminuindo o impacto nas contas públicas para R$ 5,8 bilhões. Mesmo com a redução estabelecida pelos deputados, o valor ainda é mais alto do que a economia anunciada inicialmente pelo governo para o ano que vem (R$ 4,8 bilhões).

A partir de 2026, os Estados e municípios terão de destinar 4% de recursos próprios que colocam no Fundeb para esse programa, aumentando o impacto fiscal entre R$ 10 bilhões e R$ 12 bilhões. Na prática, a União transfere a responsabilidade para os governos locais e espera economizar recursos com isso.

A economia efetiva de gastos para a União, no entanto, vai exigir que o governo federal diminua recursos do orçamento da Educação no mesmo valor. Ao cortar recursos, o governo federal deverá assumir o ônus político e ainda respeitar o piso constitucional da Educação exigido pela Constituição, que consome despesas não obrigatórias.

Benefício de Prestação Continuada (BPC)

O Benefício de Prestação Continuada (BPC) é a garantia do pagamento de um salário mínimo mensal a idosos e pessoas com deficiência de baixa renda. Na proposta feita pelo governo, o BPC seria reformulado, mas o o relator na Câmara fez dez mudanças no texto que afrouxaram a medida.

Haveria, por exemplo, mais restrições na definição de pessoa com deficiência, mas os parlamentares rejeitaram a limitação. O governo também queria impedir o acúmulo de benefícios em uma mesma família e levar em conta bens e patrimônio na avaliação para o acesso ao auxílio. Essas propostas não foram aprovadas.

Foi mantida a exigência proposta pelo governo de biometria e um recadastramento para a manutenção do benefício — mas uma mudança feita pelos parlamentares estabelece que uma pessoa que mora em local de difícil acesso não terá o pagamento cancelado se não fizer a biometria e que o governo terá de promover as condições de ir até o beneficiário e fazer o procedimento.

No Senado, o governo correu o risco de ter o projeto novamente alterado. Os senadores se levantaram contra a regra que restringia o BPC a pessoas com deficiência de grau moderado ou grave, já que o trecho abria margem para negativa do benefício a pessoas com deficiência de grau leve, como ocorre em alguns casos de autismo e síndrome de Down. Foi feito um acordo e o Palácio do Planalto se comprometeu a vetar o dispositivo.

Deputados governistas avaliam que o governo errou na estratégia ao mexer no pagamento de um auxílio a pessoas carentes em troca de uma economia que não era tão relevante para o pacote fiscal. A equipe econômica esperava economizar R$ 2 bilhões por ano com o BPC, totalizando R$ 12 bilhões até 2030.

O governo argumenta que apresentou mudanças no BPC não para tirar o benefício de pessoas que dependem do auxílio, mas para combater as fraudes e o que o ministro Fernando Haddad chamou de "indústria de liminares".

Reforços ao arcabouço fiscal

O pacote aprovado cria alguns "reforços" ao arcabouço fiscal. Um dos novos gatilhos prevê que, em caso de déficit primário (gastos maiores que as receitas do governo, sem levar em conta as despesas com juros) a partir de 2025, será proibida a concessão, a ampliação ou a prorrogação de benefícios tributários. Além disso, haverá limitação de crescimento no gasto com pessoal.

O aumento de despesas com pessoal só poderá ser de 0,6% ao ano acima da inflação - que é o piso geral do aumento de despesas estabelecido pelo novo arcabouço fiscal. Como o déficit será calculado em 2026, o gatilho valeria para 2027.

O gatilho para conter despesas de pessoal também pode ser acionado em outra situação. Caso haja redução das despesas discricionárias (aquelas que não são obrigatórios, como investimentos e custeio), o gatilho limita automaticamente a despesa com pessoal a um aumento anual de 0,6% acima da inflação. Esse gatilho também vale a partir de 2027.

A proposta aprovada também determina que a criação ou prorrogação de benefícios da seguridade social ficam limitadas às regras de crescimento do arcabouço, ou seja, com teto máximo de 2,5% ao ano.

Superávit de fundos públicos

Os parlamentares aprovaram que, entre 2025 e 2030, o superávit financeiro de fundos públicos poderá ser usado para amortizar a dívida pública — mas apenas para isso. O projeto original do governo previa que o uso dos recursos seria de livre aplicação, o que foi criticado por economistas por abrir margem para ampliar gastos.

Na proposta do governo, eram oito fundos listados, mas foram aprovados apenas cinco: os fundos de Defesa de Direitos Difusos (FDD), Nacional de Segurança e Educação de Trânsito (FUNSET), do Exército, Aeronáutico e Naval. Foram excluídos o Fundo Nacional Antidrogas (Funad), o Fundo da Marinha Mercante (FMM) e Fundo Nacional de Aviação Civil (FNAC), com a justificativa de que seus recursos "são utilizados para importantes investimentos". O impacto da desvinculação, com isso, caiu de R$ 38 bilhões para R$ 18 bilhões.

Emendas parlamentares

O Congresso derrubou a possibilidade de o governo federal cortar emendas impositivas (não obrigatórias) para cobrir gastos obrigatórios e cumprir o arcabouço fiscal. O governo queria uma autorização para bloquear até 15% das emendas impositivas, recursos indicados por deputados federais, senadores e bancadas estaduais no Orçamento e que o governo é obrigado a pagar conforme a indicação dos parlamentares.

Na última hora, os deputados aprovaram uma emenda que autoriza o bloqueio apenas de emendas não obrigatórias, como as emendas de comissão, herdeiras do orçamento secreto. Atualmente, esses recursos já podem ser bloqueados, mas agora o corte será limitado a 15% da verba.

Prorrogação da DRU

O pacote prorrogou a Desvinculação de Receitas da União (DRU), que terminaria neste ano até 2032. Na prática, a medida permite que o governo use recursos carimbados para outras finalidades, permitindo uma flexibilidade maior no Orçamento. O governo prevê arrecadar R$ 25,6 bilhões com a medida.

A DRU tira 30% da arrecadação de determinadas taxas e contribuições e permite que o governo use o dinheiro livremente, e não apenas em despesas carimbadas naquela arrecadação. Taxas de inspeção cobradas por agências reguladoras, por exemplo, não ficam integralmente para esses órgãos, mas uma parcela se desvincula do destino original para compor o Orçamento da União e bancar as despesas gerais do governo.

Além das contribuições sociais, das contribuições de intervenção no domínio econômico (Cide) e das taxas, a desvinculação alcançará ainda as receitas patrimoniais, que são aquelas obtidas pelo uso de patrimônio da União, como aluguéis, dividendos, compensações financeiras/royalties e direito real de uso, entre outras.

Bolsa Família e biometria

O pacote fiscal aprovou medidas consideradas como "pente-fino" por analistas, como ajustes nos parâmetros do Bolsa Família. Também foi definida a adoção de biometria para todos os benefícios da seguridade social, a renovação de cadastro no CadÚnico a cada 24 meses para receber programa de transferência de renda e fornecimento de dados para a União pelas concessionárias de serviços públicos.

Até 2030, o governo espera arrecadar R$ 17 bilhões com os ajustes no Bolsa Família e R$ 15 bilhões com a adoção de biometria nos programas sociais.

Pontos derrubados pelo Congresso

Entre os pontos derrubados pelo Congresso está a proposta que limitava a restituição de créditos tributários pelas empresas. O trecho enfrentava forte resistência de vários setores da economia, além de ter integrado uma Medida Provisória (MP) editada pelo governo em junho e que foi devolvida pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

O governo também queria corrigir os recursos do Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF) pela inflação, com uma previsão de economia de R$ 18,1 bilhões até2030. A ideia foi rejeitada pelos deputados, permanecendo a correção pela Receita Corrente Líquida.

O Congresso também rejeitou um dispositivo que tirava a obrigação de o Poder Executivo executar o Orçamento aprovado pelo Congresso Nacional. A obrigação, incluída na Constituição em 2019, impede o governo de cancelar, por exemplo, emendas parlamentares, que são direcionadas por deputados e senadores para redutos eleitorais. Revogar o dispositivo era uma aposta da equipe econômica para ter mais flexibilidade no Orçamento na hora de cumprir o teto de despesas.

Os deputados também revogaram a lei que instituiu o Seguro Obrigatório para Proteção de Vítimas de Acidentes de Trânsito (SPVAT), antigo DPVAT, diminuindo a capacidade de arrecadação do governo federal. /Com Agência Brasil e Agência Senado

Estadão
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