São Paulo – Em um passado recente, o poderoso e popular Flamengo, clube de maior torcida do país, e o pobre e derrotado Íbis, de Recife, viviam realidades antagônicas. Um, orgulhava-se de ser o time que mais venceu o Campeonato Brasileiro (cinco vezes) e ostentava o pomposo título mundial de 1981, o mais importante de sua história. O outro, contentava-se com a notoriedade conquistada pelo status de pior time de futebol do país e, depois, do mundo.

Mas, os anos de crise, má administrações e dívidas na Gávea aproximaram os dois clubes. Depois de quase cair para a Segunda Divisão do Campeonato Brasileiro, as estatísticas apontam a gravidade da decadência rubro-negra: levando em conta as campanhas de todas as equipes que vão disputar a Primeira Divisão do Brasileiro de 2002, o time carioca acumula a pior, com sobras. Em suma, o Flamengo é hoje uma espécie de Íbis da elite do futebol do país.

Os números são terríveis. Em 32 jogos disputados este ano, o Flamengo conta nos dedos de uma mão os que venceu: cinco. Perder, no entanto, virou rotina. Por 18 vezes o time deixou o campo derrotado em 2002. Eliminado da Libertadores, como lanterna do grupo, eliminado do Rio-São Paulo e lanterna do primeiro turno da Taça Guanabara, só resta no primeiro semestre lutar por uma reação honrosa no desacreditado Estadual. Assim mesmo, será difícil promover o retrospecto de pífio a razoável.

Comparar a campanha do Flamengo com os times considerados grandes do país seria uma covardia. Para se ter uma idéia, dos 26 que disputarão o Campeonato Brasileiro no segundo semestre, apenas três também perderam mais que venceram em 2002: Coritiba, Ponte Preta e Juventude. Nem mesmo os recém-chegados Figueirense e Paysandu, que vieram da Segunda Divisão, fazem companhia ao Flamengo na desastrosa façanha.

O Juventude, pior entre os três, acumula 20 jogos, sete vitórias, 12 derrotas e um empate entre partidas pela Copa Sul-Minas e Copa do Brasil. O aproveitamento é de 36,6%. Mas nada que se compare aos vergonhosos 25% do Flamengo, que, em média, vem disputando seis partidas para conseguir uma única vitória. O Coritiba perdeu oito jogos e venceu seis dos 16 que disputou, e a Ponte Preta venceu seis e perdeu sete nas 18 vezes que entrou em campo.

Cacos - A missão de tentar juntar os cacos do que sobrou no Flamengo é de Walter Oaquim, que reassume hoje a vice-presidência de futebol. A solução, no momento, é recuperar o abalado time com um discurso otimista: ''Temos de inverter isso. Nossa campanha precisa ser de 18 vitórias, nove empates e, no máximo, cinco derrotas. O lado psicológico influencia muito e temos de recuperar a auto-estima dos jogadores.''

Além de palavras de apoio, Oaquim sonha reforçar o Flamengo com três jogadores (dois atacantes e um meia) para o segundo semestre. A torcida, entretanto, não deve se animar. A folha salarial, que já foi de R$ 3 milhões, não passará de R$ 1 milhão. E a formação de um time capaz de ser campeão brasileiro parece ser tão improvável quanto o Íbis tornar-se uma potência do futebol pernambucano.

Só houve uma temporada, em 70 anos de profissionalismo, que o Flamengo perdeu mais jogos do que ganhou. Foi em 1967, quando o clube obteve 22 vitórias e 14 empates, contra 28 derrotas. No ano passado, o rubro-negro chegou próximo: perdeu 26 vezes, mas ganhou 34.

O PIOR ANO - Em 1967, o time disputou 64 jogos, distribuídos por amistosos (21), Campeonato Carioca (18), Torneio Roberto Gomes Pedrosa (14), Taça Guanabara (5), Taça Rivadávia Correia Meyer (2), Torneio Internacional de Badajoz (2) e Torneio Quadrangular de Salvador (2). Não conquistou um único título.

Foi uma catastrófica excursão à Europa, realizada entre 20 de maio e 26 de junho, que ajudou a agravar a situação. O Flamengo disputou, no período, 10 partidas. E só venceu duas: 1 a 0 sobre o Neftyannik Baku, do Azerbaijão, e 1 a 0 sobre o Barcelona, da Espanha. Perdeu os outros oito jogos. Chegou a apanhar duas vezes da seleção olímpica da Alemanha Oriental.

O técnico era o argentino Armando Renganeschi e o time-base era Marco Aurélio, Murilo, Ditão, Jaime e Paulo Henrique; Carlinhos e Reyes; Pedrinho, Almir, Ademar e Osvaldo. Também integravam o elenco o goleiro Valdomiro, os defensores Merrinho, Gílson, León, Itamar e Altair; os apoiadores Nelsinho, Américo, Jarbas e Válter; e os atacantes Mendoza, Fio, Aírton, Jair Pereira e Rodrigues.

No Carioca, o Flamengo de 1967 perdeu para Bonsucesso (2 a 1) e Olaria (2 a 1), duas vezes para o Bangu (4 a 1 e 3 a 1), sofreu goleadas para o Vasco (4 a 0 e 3 a 0) e empatou em duas ocasiões em 3 a 3 com o Campo Grande, uma delas após estar vencendo por 3 a 0, em plena Gávea.

Em outras cinco temporadas, ao longo de sua trajetória no profissionalismo, o Flamengo também sofreu mais de 20 derrotas: em 1973 (23), em 1993 (21), em 1995 (23), em 2000 (21) e no já citado 2001 (26). Mas sempre venceu mais do que perdeu. De qualquer forma, 2002 caminha para superar o recorde de 1967. Ou para fazê-lo companhia.

JB Online