24 Horas de Le Mans: quando o impossível acontece
Um grande resumo da aventura que começou em uma mensagem despretensiosa e que chegou a uma cobertura histórica da edição dos 100 anos
Escreva com o coração. Este é o mote que o Sergio Quintanilha, criador do Parabólica, colocou para aqueles que vinham para participar do projeto. Até hoje, buscamos seguir esta linha em cada texto que fazemos aqui, por mais simples que pareça o tema. E aqui não será diferente.
Mas este é mais do que especial. Sempre evitei artigos mais pessoais aqui. Só que desta vez, não tem como escapar. Tenho que fazer um relato mais pessoal de tudo que aconteceu até aqui e que culminou nesta jornada que foram as 24 Horas de Le Mans.
Se no início do ano alguém falasse que estaria fazendo oficialmente comentários no WEC e ainda aparecendo em TV, eu daria uma risada sensacional e diria que era uma loucura. Mas a loucura se concretizou. E começou quando em uma conversa muito despretensiosa com o Terra, ao definir a agenda de publicações para este ano.
O WEC foi um dos temas que gostaríamos de abordar. Afinal de contas, a Ferrari voltava à categoria principal depois de 50 anos e tínhamos os 100 anos de Le Mans. E na conversa lembramos que o campeonato não teria transmissão oficial para o Brasil este ano.
Daí, surgiu a pergunta: por que não entrar em contato com o WEC para saber como fazer algum jeito de transmitir para o Brasil?
Foi feito o contato, coisa de uma semana antes da abertura do campeonato, em março. Após uma troca de mensagens, surgiu a ideia de fazer uma transmissão pelo canal oficial do WEC em português. Seria um arranjo para dar um toque para o Brasil, que vinha negociando para a categoria voltar ao país.
Sebring era na sexta. A decisão saiu na quarta à tarde.
O sinal estava garantido. Mas...caramba? Como conseguir alguém para fazer essa? Então, veio o nome do Rodrigo Mattar. Com certeza, um dos caras que mais conhece de Endurance no Brasil. Numa conversa rápida, falei o que estava rolando e ele aceitou.
Simplesmente, com um único laptop, apoiado em uma tábua de passar, plugando e desplugando fones de ouvido, foram feitas 10 horas de transmissão.
O resultado em visualizações não foi lá estas coisas, mas marcou a presença. Um mês depois, Portimão. Não havia nada à frente. Todo caso, estava tentando ajudar a viabilizar a transmissão, conversando com várias pessoas. Mas o WEC bateu na porta e vamos fazer de novo?
Para esta, uma situação um pouco melhor: corremos atrás e o 2R Estúdios no Rio de Janeiro entrou em ação. Conseguimos fazer numa triangulação Rio (Mattar e eu), Curitiba (Felipe Meira) e Tocantins (Aldo Luiz).
Aliás, aqui entram duas pessoas sensacionais: Felipe Meira e Aldo Luiz. Meira é uma tremenda “mala sem alça” e é quase meu contraponto. Brigas são constantes. Mas é um cara do bem e conhece muito de automobilismo. E o Aldo veio através de uma dica dele, que fazia transmissões em Webradio.
Neste arquipélago digital, fizemos Portimão. Uma boa corrida e, com um pouco mais de divulgação, conseguimos melhorar um pouco nossos números de visualizações. Terminado, mais uma vez o questionamento: vai ter próxima?
A resposta veio logo: como Spa seria 15 dias depois, o WEC nos perguntou: podemos fazer novamente? A resposta foi sim, mas dentro de um outro contexto. A expectativa era razoável, já que teríamos uma Sprint Race da F1 pela frente no Azerbaijão.
Simplesmente triplicamos a nossa visualização no portal do WEC. E depois da citação feita na semana seguinte pelo Sergio Maurício nos treinos da F1 em Miami, a coisa foi no alto: 280 mil visualizações.
A próxima? Le Mans. A centenária prova e a cereja do bolo do campeonato.
Mais uma vez, a dúvida: vamos fazer ou não? Na dúvida, o planejamento foi iniciado e mapear possíveis nomes para fazer. A equipe básica permaneceria a mesma. E teríamos que buscar mais nomes. Início de mapeamento...
Porém, dependia tudo do WEC. Após Spa, o retorno foi muito positivo e houve o aceno de Le Mans. Em princípio, o esquema seguiria o mesmo, mas seria ainda concluído mais à frente. Enquanto isso, consultas à potenciais participantes e definição da escala. Afinal, era preciso saber como escalar o time para os momentos da prova.
As semanas passavam e uma estrutura estava pronta. E da França, somente silencio. Após muito esperar (e o Meira já me instigando), no fim de maio, mandamos mensagem para uma definição. A resposta: estamos vendo tudo. Até a próxima 6ª, temos definição.
Na 6ª, veio a dolorosa: estamos negociando um acordo com uma TV no Brasil para Le Mans. Até 3ª, temos uma posição final. Ela veio na segunda, dia 6: fechamos um acordo com o Band Sports.
Esta mensagem acabou por implodir toda uma situação que vinha sendo construída. Ok, o objetivo inicial havia sido concluído: ajudar a encontrar um meio do WEC aparecer para o público brasileiro numa temporada tão marcando.
Diante disso, o Whatsapp ficou intenso ligando para meio mundo avisando que tudo tinha ido para o espaço. Frustração é pouco para definir tudo.
Porém, a virada começava: logo depois, uma mensagem veio da França passando o contato do responsável do Band Sports e dizendo que haviam falado do trabalho que tínhamos feito até então. Após muita dúvida, escrevi para o Henrique Meira, responsável do Canal, parabenizando pelo acordo e colocando à disposição.
Nada como um dia após o outro com uma noite no meio. Dia 06/06, às 11:30h, tudo mudou. Em uma rápida conversa, ficou o acerto. Em princípio, nós faríamos a corrida no You Tube do Band Sports e haveria uma equipe separada para as entradas.
Voltamos ao jogo. Uma bola que foi tirada fora do gol.
Porém, uma série de situações foram sendo feitas: como agora confirmar com todo mundo em cima da hora? E se der certo, como juntar este arquipélago de gente tecnicamente?
Para vocês entenderem: a equipe foi composta por várias frentes. Mattar e eu viemos do Rio de Janeiro; Felipe Meira fica em Curitiba; André Bonomini, Blumenau (SC) e Aldo Luiz vem de Tocantins (sim, meus caros!). O restante estava em São Paulo, com exceção do Sergio Lago que faria remoto do Rio de Janeiro.
Esse foi um ponto tecnicamente. E pensamos: e se formos todos para São Paulo, resolveria a questão? Sim, respondeu o Band Sports. Então, vamos todos para SP.
Posto isso, nos colocamos a divulgar oficialmente. Algo que muita gente vinha querendo saber, finalmente veio à tona. A informação não estava sendo segura, mas simplesmente foi tudo decidido em cima da hora.
Muitas conversas sendo feitas, confirmações sendo dadas...e as condições mudando. Mas somente na 5ª feira é que tivemos o time totalmente confirmado. Na 6ª, o reconhecimento de área: visita à Band Sports, verificação de detalhes técnicos...e ainda uma participação no Primeiro Tempo...
Mas ao longo do dia, a coisa só melhorou: a corrida seria transmitida também nos sites da Band e do Band Sports e nos canais do Esporte na Band e Jogo Aberto. E a equipe faria a transmissão tanto na TV quanto na Internet. Era melhor do que se pensava.
Quando a corrida começou, a tensão foi imensa. Era como se estivéssemos na pista também. E o retorno foi impressionante: em dado momento, chegamos a 65 mil acessos simultâneos! Porém, os canais caíram e houve a preocupação de ir água abaixo. Tudo resolvido, sigamos em frente.
Tudo correndo bem e o retorno do publico sendo sensacional. Simplesmente, com a final da Champions pela proa, a hashtag #lemansnobandsports ficou entre as mais comentadas no Twitter no Brasil, chegando a 1º lugar em uma determinada hora. Mesmo na madrugada, quando a corrida entrava em uma fase menos movimentada, a audiência seguia muito boa.
E mais importante foi ver a coesão de todos. Gente que não precisava ficar após do seu turno, ficou ali. Resenhando, apoiando, ajudando. Eram todos ali imbuídos do espírito de fazer dar certo. A história vinha sendo escrita.
Quando a última janela na TV começou, a situação era sensacional. Até ali, tínhamos tido uma prova chega de nuances e que deu tudo o que uma corrida tem que ter: variação de clima, vários líderes, barbeiragens, ultrapassagens arriscadas e tudo mais. No final, um fecho sensacional: a Ferrari vencendo a edição de 100 anos das 24 Horas de Le Mans.
Quando “Lord” Sergio Lago anunciou a última volta, uma explosão de pensamentos veio à cabeça: mandar aquela mensagem despretensiosa para o WEC valeu à pena. Era o garoto de 7 anos de idade que viu a Brabham de Riccardo Patrese arrancar à sua frente em Jacarepaguá e ter a sua alma definitivamente “convertida” ao automobilismo. Era simplesmente a realização de um sonho. E as lágrimas vieram.
Um feito histórico havia sido concluído. Pela primeira vez, de modo oficial, as 24 Horas de Le Mans eram transmitidas na íntegra para o Brasil. Um grande trabalho havia sido feito e uma aposta imensa feita e se pagou.
Agradecimentos mais do que especiais:
- À Nathalie Fargier, responsável pela área de comunicação do WEC, que acreditou nesta loucura lá em Sebring;
- À Henrique Meira e toda a equipe do Band Sports, que nos recebeu muito bem e deixou tudo em nossas mãos, com carta branca;
- Rodrigo Mattar, Geferson Kern, Sergio Lago, Aldo Luiz, Deborah Almeida, Felipe Meira, Gabriel Lima, André Bonomini e Milton Rubinho. Vocês acreditaram neste projeto e deram tudo. Não fossem vocês, nada disso seria possível. Demonstração sensacional de companheirismo.
- Celso Itiberê, que deu a chance de colaborar no Tiba News no fim da década de 90; Wanderson Varca e o Paddock; Alexandre Odo; 90Goals, Ialdo Belo, Sergio Quintanilha, Lito Cavalcanti, Alessandra Alves, Reginaldo Leme, Sergio Maurício, Regii Silva, Sergio Lago, Rafael Lopes, José Roberto Julianelli, James Azevedo, Luis Gustavo Ramiro, Mario Borsalino e tantos outros. A caminhada foi longa e todas as dicas e puxões de orelhas tentaram ser aproveitadas.
- E principalmente a quem assistiu. O retorno que o público deu foi sensacional e tanta gente que elogiou. Claro que teve quem não gostou e faz parte do processo. Mas quantos relatos vieram e que encheram de orgulho não só a mim e a quem fez esse trabalho. Como gosto de dizer na Alternativa Esportes, é um trabalho feito de fã para fã.
Agora, é ver o que o futuro reserva. Mas o orgulho é enorme e dá a sensação do dever cumprido. Seguir em frente, pois outra corrida começou....
Um forte abraço,