F1: Revoltado, CEO da Alpine cobra melhorias e dá ultimato
Indignado com o fraco desempenho em 2023, Laurent Rossi, CEO da Alpine F1, solta o verbo contra a própria equipe: “Haverá consequências!”
A Alpine é uma das grandes decepções de 2023. A equipe, que já vinha em uma tendência de estagnação nos últimos anos, quando foi incapaz de deixar o pelotão intermediário, parece ter dado um passo atrás. Atualmente, a equipe francesa ocupa o 6º lugar entre os Construtores, empatada com a McLaren em 14 pontos, e muito distante das quatro equipes mais fortes do campeonato.
E ninguém parece mais incomodado com o fraco desempenho que o próprio CEO da equipe, Laurent Rossi. Tudo começou na semana entre os GPs do Azerbaijão e de Miami, quando Rossi declarou à imprensa francesa que os investimentos da Renault na equipe não estavam valendo a pena. Depois, o gestor subiu o tom em entrevista bombástica ao site da Fórmula 1, em que não poupou críticas ao trabalho de seu time.
Rossi esbravejou contra os membros da equipe, que ele entende ter apresentado “muitas desculpas para a performance fraca e a falta de excelência operacional”.
Sem meias palavras, o chefão apontou o dedo para seus subordinados: “Preciso que o time esteja ciente que são eles que precisam fazer isso, já que não mais está comigo. Está nas mãos deles, eles têm que fazer. É responsabilidade deles.” E seguiu: “Espero que eles [membros da equipe] possam fazer o mesmo diagnóstico. Vou deixar claro para eles que essa é a situação e que eles precisam consertar.”
Otmar na mira?
Quando se critica “o time”, naturalmente os holofotes apontam para quem está a cargo da operação. E esse alguém é Otmar Szafnauer, que chegou em 2022 justamente para colocar ordem na casa. O veterano comandante foi contratado depois deum período de desmandos sem a figura tradicional de um chefe de equipe - e com o próprio Laurent Rossi mais envolvido no dia-a-dia.
Rossi não esquivou de falar diretamente sobre seu homem forte na operação da Alpine F1: “Ele é o responsável pelo desempenho da equipe, é seu trabalho”, afirmou. “Otmar foi contratado para orientar a equipe, ao longo dessa temporada e das próximas, em direção ao nosso objetivo, que é progredir constantemente e chegar aos pódios.” E concluiu: “Sendo assim, é a missão dele reverter a situação e trazer a performance que queremos.”
Questionado se sua paciência com Otmar está se esgotando, ele não respondeu diretamente, mas não deixou muita margem para dúvida: “Todos começam com um capital de confiança, e depois vão gerenciando isso. E todos pode dizer se você está indo na direção certa ou não. Isso impacta diretamente no seu capital de confiança. Otmar é muito capaz, mas ele tem uma tarefa grande em suas mãos.”
Batata quente
Ao longo do fim de semana de atividades em Miami, como não poderia deixar de ser, Otmar foi questionado sobre as declarações de seu patrão. E desconversou: “Eu vi umas manchetes, mas não tive tempo de ler”, disso ao portal The Race.
De qualquer modo, o chefe de equipe se apressou em explicar alguns dos motivos da baixa pontuação do time: “Veja, nós tivemos uma performance ruim em Baku, os pilotos bateram um no outro na Austrália, na primeira corrida tivemos uma miríade de punições com o Esteban. Não tem sido um começo fácil. Não sei, talvez seja sobre isso que ele tenha falado, vou ler depois.”
No melhor estilo “batata quente”, Szafnauer tratou de explicar que os problemas da equipe não estão somente na pista, onde ele tem o controle, mas nas operações de fábrica, onde o carro é concebido e aperfeiçoado: “Temos que entender que a performance definitiva que o carro mostra não acontece aqui. Esse é um ponto. Mas as falhas acontecem aqui, e então temos que consertar esses dois lados.”
“A coisa mais difícil da Fórmula 1 é garantir que o carro tenha essa performance máxima. E isso não acontece aqui. Somos só 100 pessoas aqui [na pista], mas há 1000 com a base. 900 estão trabalhando com performance, e dos 100, só metade se dedica a extrair performance.”
Vale lembrar que a Alpine trabalha com duas fábricas, uma na Inglaterra e uma na França. A unidade inglesa, em Enstone, é responsável pelo desenvolvimento do chassi, enquanto a francesa, em Viry, cuida dos motores.
“A maior parte do trabalho para o desempenho do carro é em Enstone e Viry. Isso aqui [na pista] é apenas garantir que não cometamos erros, não haja incêndios no motor, não tenhamos ajustes errados em uma corrida em que você só tem uma hora de treino”, justificou Otmar.
Aston Martin é referência
Em seu ataque de fúria, Laurent Rossi usou a boa temporada da Aston Martin como base para suas críticas aos resultados de seu próprio time. Para ele, é inaceitável uma equipe com menos recursos apresentar uma evolução tão mais vistosa.
“Eles têm menos engenheiros que nós, pelo que sei. Eles ainda não têm um túnel de vento, a fábrica nova deles ainda está em construção. Eles otimizaram a o desenvolvimento ao ter as pessoas certas com eles. Isso mostra que tudo se resume a criatividade e eficiência. Essa é a regra do jogo, sabemos como funciona. Então, me desculpe, mas eu não aceito a desculpa da falta de recursos.”
Não custa lembrar que uma das pessoas que se juntou à Aston em 2023 é um egresso da própria Alpine: Fernando Alonso, que se cansou da falta de evolução da equipe francesa e lhe aplicou um chapéu, fechando com a Aston Martin.
O episódio, inclusive, expôs o caos dos bastidores da equipe, que anunciou Oscar Piastri e passou pela humilhação pública de ser desmentida pelo jovem australiano. Uma novela se formou até a confirmação de Pierre Gasly como dupla de Esteban Ocon.
Já que citamos os pilotos, Rossi fez questão de poupá-los das granadas atiradas, mencionando uma “dívida” da Alpine para com seus condutores: “O time deve um nível de performance melhor para os dois”.
Ultimato
Em sua manifestação pública de insatisfação, Rossi deixou claro que não vai aliviar na cobrança e que não aceitará uma mudança na meta que pôs para a equipe somente para se adequar ao desempenho atual.
“Não quero dar conforto às pessoas. Não entro numa competição e ajusto meu objetivo porque é mais fácil. Esse time já conseguiu ser 4º. Tem os meios necessários para ser 4º, até mais que outros”, se referindo, novamente, à Aston. “Eu quero que seja 4º. Se não for, será um fracasso.”
Para ele, o esforço do time será um fator determinante para as decisões que virão – e elas podem acontecer ainda no decorrer da temporada.
“Se eles falharem dando 500% de seu melhor ao tentar virar esse navio, haverá um atenuante e boas perspectivas para o futuro. Se não, é a regra dos negócios, haverá consequências. E eu não vou esperar até o fim do ano.”
Rossi conclui suas declarações bombásticas de maneira pouco otimista, para dizer o mínimo: “A trajetória não é boa. Precisamos mudar a mentalidade do time o quanto antes.”
Laurent Rossi assumiu a função de CEO da Alpine quando da saída de Cyril Abiteboul, em 2020. Sob seu comando, a equipe tem se notabilizado pelas frequentes trocas em cargos chave. Além dele próprio, que fez as vezes de chefe de equipe em dado momento, já passaram pelos quadros do time nomes como Marcin Budkowski, Davide Brivio, Otmar Szafnauer e até Alain Prost, em uma função consultiva. Ainda nos últimos anos, a parte técnica agregou figurões como Pat Fry e Bruno Famin.
Mudar toda a parte de cima do organograma não tem se mostrado efetivo para a Alpine. A falta de estabilidade da estrutura e a pouca paciência de Rossi tem sido mais negativos que positivos para o time, que se vê estagnado. É de se observar até que ponto vai a paciência do alto escalão do grupo Renault com sua equipe de Fórmula 1. Ou com quem a comanda...