Fittipaldi: 50 anos atrás, o F1 brasileiro entrava na pista
50 anos atrás, em um 12 de janeiro, o Copersucar-Fittipaldi FD-01 entrava na pista e marcava o início da jornada da equipe brasileira na F1
Dia 12 de janeiro deveria estar marcado com um carinho especial pelo fã brasileiro de automobilismo. Agora, em 2025, esta data tem mais significado: foi neste dia, 50 anos atrás, em que o Brasil entrou para um seleto grupo na F1: o de construtores.
A temporada 1975 da F1 começava na Argentina, em Buenos Aires. E para um grupo, era importante: a equipe Fittipaldi. Não era de hoje que os irmãos Wilson e Emerson também se dedicavam a serem construtores além de pilotos: começou com os Fitti-Vê no final da década de 60, passando pelo Fitti-Porsche e o Fitti-Volks de dois motores. Com o sucesso de Emerson na Inglaterra, este passo ficou um tanto congelado. Mas os irmãos sempre tiveram o sonho de construir o seu próprio F1.
Em 1973, Wilsinho estava em sua segunda temporada na F1 e na Brabham. Naquele tempo, a equipe havia sido recém-adquirida por Bernie Ecclestone e já havia a figura do piloto pagante. Embora fosse reconhecido como um piloto talentoso, Wilsinho pagava uma boa quantia para poder correr. Cansado de sofrer com tantos problemas e falta de atenção, ele se cansou e passou a pensar em uma coisa: construir o seu próprio F1.
Naquele tempo, as coisas eram razoavelmente mais fáceis: arranjava-se um Ford Cosworth V8, uma caixa de câmbio Hewland, alguns jogos de pneus e um festival de duralumínio. Mesmo assim, uma aventura dessa custava dinheiro e eram poucos que conseguiam tratar do processo de desenvolvimento e construção de um monoposto de F1.
Com a ideia em mente, Wilsinho mandou Ricardo Divilla, um engenheiro autodidata louco por carros e um parceiro de sempre nos projetos dos Fittipaldi, fazer uma pesquisa se a Indústria brasileira teria condições de fornecer peças para um F1. Após dois meses, Divilla disse que sim. No Natal de 1973, o projeto teve seu início oficial e Wilsinho deixava o posto de piloto. Ao menos temporariamente.
O investimento inicial saia do bolso dos Fittipaldi. Naquele momento, as coisas ficavam um pouco mais fáceis pelo fato de Emerson ser um belo chamariz de parceiros e um dos principais nomes do esporte brasileiro. A base foi montada perto de Interlagos e um grupo formado por Divilla, Yoshiatsu Itoh (japonês que trabalhava com Emerson na Lotus) e os mecânicos Darci, Adilson e Joel davam forma ao projeto. Alguns carros antigos que eram do Fittipaldi Show serviram como base.
Inicialmente, quem deu mais apoio técnico foi a Embraer. A empresa brasileira de aeronáutica tinha experiência em materiais nobres, bem como construção e desenvolvimento aerodinâmico. O uso do túnel de vento do CTA (Centro Técnico Aeroespacial) foi primordial para o desenvolvimento das linhas do carro.
Em paralelo, havia uma briga com a Argentina: ao mesmo tempo, Oreste Berta desenvolvia um F1 baseado no seu projeto de F5000 e incluía até mesmo um motor próprio. O objetivo era também entrar na F1 em 1975.
A imprensa especializada acompanhava com atenção o desenrolar do projeto, bem como acompanhava a luta de Emerson pelo título de 1974. Mas era preciso buscar patrocinadores. Como dito, o investimento inicial estava sendo custeado pelos Fittipaldi. Após algumas consultas a potenciais parceiros e sem retornos positivos, a esperança renasceu quando Wilsinho, assistindo às transmissões da Copa do Mundo de 1974, viu uma bandeirinha nacional espetada em um monte de açúcar. Nessa ele se vira para o pai, o jornalista Wilson Fittipaldi (o “Barão”), e diz: Pai, será que estes caras não topam patrocinar a gente?”
Através do publicitário P.A. Nascimento, foi feita a ponte com a Companhia Cooperativa dos Produtores de Açúcar do Estado de São Paulo. Ou simplesmente, Copersucar. Naquele momento, a empresa comandada por Wolney Atalla, vinha em um crescimento fulminante em diversos campos. Na esteira do “Brasil Grande”, aceitou conversar e após negociações, aceitou entrar na empreitada. Nascia aí a equipe Copersucar-Fittipaldi. Foi firmado um acordo de 3 temporadas, onde a equipe levaria o nome do patrocinador e teria um aporte aproximado de US$ 1 milhão/ano.
Isso deu mais tranquilidade para a equipe trabalhar. No final de 1974 começaram os treinos em Interlagos e em 6 de outubro de 1974, o FD-01) F de Fittipaldi e D de Divilla, o projetista) foi apresentado no Salão Negro do Congresso Nacional, em Brasília, com a presença de Emerson Fittipaldi e do Presidente Ernesto Geisel.
O carro chamou a atenção pela sua linha de cintura baixa, o motor todo carenado, uma frente larga e pelo radiador de água estar montado na traseira do carro. Mas a pintura cinza metálica, com o beija-flor estilizado pintado na lateral foi um dos detalhes que deixaram o FD-01 mais marcante.
A esta altura, um nome importante se juntou à trupe: o mexicano Jo Ramirez, que tinha bastante experiência em competição e seria o chefe de equipe. A preocupação agora era deixar o carro funcionando para poder fazer a estreia na Argentina.
Os testes de preparação em Interlagos, conduzidos por Wilsinho, que seria o piloto do time, mostraram um problema crônico na alimentação do motor, que falhava nas curvas para a esquerda. Emerson também andou no carro para dar suas impressões, mas as falhas prosseguiram. Somente no penúltimo dia de testes, ao andar no circuito externo pela contramão, se descobriu que havia uma falha no pescador do tanque de combustível.
Outro problema que deixou os Fittipaldi doidos foi a burocracia. Como era a primeira vez que um F1 era fabricado no Brasil e sairia para outro país, o Governo Brasileiro entendeu que se tratava de uma exportação e exigiu todo o procedimento necessário para tal. Levaria meses para resolver tudo e foi necessário que o Ministro da Fazenda Delfim Neto entrasse em ação para resolver o desembaraço do FD-01 para Buenos Aires.
Os treinos para o GP da Argentina foram muito atribulados para o time. Mais uma vez, os problemas de alimentação reapareceram e impediram que Wilsinho andasse o que planejou. Isso resultou que o FD-01 marcasse o 23º e último tempo, com 2:00,22. Basicamente 11 segundos atrás da pole position marcada por Jean Pierre Jarier (Shadow) e mais de 7 segundos atrás da BRM de Mike Wilds, o 22º lugar.
Naquele ensolarado 12 de janeiro de 1975, largar em último lugar pouco importava para Wilsinho. Naquele momento, ele se igualava a um dos seus ídolos, Jack Brabham. Como o próprio disse em várias entrevistas, ninguém poderia imaginar a sua felicidade naquele momento ao poder largar em um GP de F1 com o seu próprio carro.
Wilsinho já ganhava uma posição antes mesmo da prova começar pois Mike Wilds largaria dos boxes com a sua BRM. Antes do final da primeira volta, mais uma posição pelo abandono de Jarier, que nem largou com uma quebra de câmbio.
Aparentemente, o problema de alimentação havia passado e finalmente Wilsinho conseguia andar bem, com o carro melhorando de desempenho volta a volta. Tanto que na volta 9, ele conseguiu fazer sua melhor volta na prova, quase 3 segundos melhor do que o tempo marcado na classificação.
Isso foi dando mais confiança à Wilsinho. Porém, na 12ª volta, uma cruzeta da suspensão quebrou e fez perder o controle, batendo no guard-rail. Houve um princípio de incêndio, mas debelado. Era o fim do primeiro GP da Fittipaldi na F1.
Emerson viu o acidente e ficou preocupado, mas só sossegou após ver Wilsinho lhe acenando e dizendo que estava tudo bem. Algum tempo depois, Emerson conseguia a sua 13ª vitória na F1 e completava a alegria da familia Fittipaldi, embira houvesse a preocupação em se conseguiriam estar prontos para o GP do Brasil, duas semanas depois.
Aquele 12 de janeiro de 1975 marcou o primeiro dos 104 GPs e das 8 temporadas disputadas. Um projeto que foi extremamente desvalorizado e aos poucos, vem sendo dado o verdadeiro valor.