Mercedes e o W14: as alterações que tentam salvar 2023
As mudanças maiores que a Mercedes usaria em Imola para começar a "salvar" o W14 serão usadas em Mônaco. E as explicamos aqui.
Quem lê o Parabólica sabe que falamos bastante sobre o W14 e suas dinâmicas, bem como as atualizações que estão em curso. Até restringimos falar sobre isso para não parecer que este espaço seja especial de determinada equipe.
Falando especificamente do pacote de atualizações do W14, que muitos dizem merecer até ser batizado de W14B, tínhamos dito que as mudanças viriam a partir de Baku. E começaram a vir aos poucos. Além das adaptações para a pista, a Mercedes começou a levar algumas pequenas modificações nas suspensões.
Já no Bahrein, tínhamos dito que não bastava somente mudar as laterais para que o carro funcionasse (ver aqui). A base do W14 não soa tão complicada quanto foi a do ano passado e alguns problemas foram resolvidos, como a questão da resistência do ar. Mas para resolver alguns problemas, foi preciso além do esperado (também explicamos aqui) Entretanto, para uma vencedora como a Mercedes, é preciso mais.
Em outros tempos, seria bem mais fácil fazer uma mudança em um carro ruim. Em tempos sem limites de orçamento e desenvolvimento, o céu era o limite. Na década de 90 e no início dos 2000, a Ferrari praticamente colocava o túnel de vento funcionava sem descanso e pistas de testes eram usadas ao extremo.
Hoje, qualquer mudança tem que ser bem pensada justamente pelos limites estabelecidos. E aqui foi o ponto do time de Brackley. As alterações começaram a ser pensadas no início do ano e para serem consolidadas leva tempo. É estranho, mas temos 3 meses que os trabalhos da F1 começaram este ano.
A questão é que a Mercedes, por mais que queira mudar, se vê presa a um conceito básico de monocoque. Nós explicamos o porquê disso aqui e a cópia pura e simples não resolve.
Dianteira
A equipe capitaneada agora por James Allison vai fazer uma mudança a atacado para poder alterar este comportamento. A frente será mexida, juntamente com a geometria da suspensão. Aqui não se vê somente o fluxo de ar. O spoiler dianteiro é o primeiro ponto de contato do ar com o carro e direciona a direção dele.
Mudar o conceito de montagem da suspensão dianteira implicaria em ter que construir um novo monocoque. A Red Bull usa o método pullrod (vindo da parte de baixo do carro) enquanto boa parte dos times, incluindo a Mercedes, usa o esquema pushrod (sai da parte de cima do bico). Envolveria muitos testes para chegar a um ponto certo.
Além disso, é determinante para o tratamento de temperatura dos pneus. Neste ano, a Mercedes tem agravado mais um problema de aquecimento que já aparecia anteriormente, o que torna o funcionamento do carro mais complicado. Se o pneu demora a aquecer, mais o carro sofre para andar em um bom ritmo. Sem contar a possibilidade de deteriorá-los, tornando-os granulados (o chamado graining).
Outro ponto que merece a revisão da geometria é justamente o comportamento do carro. Um dos pontos altos da Red Bull é como o RB19 se comporta. Com o novo regulamento, o objetivo é que os carros oscilem o menos possível para que a altura fique constante e gere o máximo de apoio aerodinâmico.
Este foi um ponto em que Adrian Newey se dedicou bastante. Com essa necessidade de pouca oscilação, as suspensões ficaram duras e com baixo curso de trabalho. Fazer que elas funcionem em conjunto (dianteira e traseira) é o segredo e a Red Bull achou um diferencial aqui.
Laterais
Aqui são os famosos “sidepods”. Desde o ano passado, a Mercedes veio com um conceito bastante extremo, os “zeropods”, deixando as laterais basicamente restritas ao que pede o regulamento em termos de segurança (falamos nisso aqui).
A intenção da equipe técnica da Mercedes era reduzir o arrasto ao extremo, confiando bastante na questão de que uma área menor de contato do ar daria mais velocidade, sem prejudicar a geração do efeito solo (afinal de contas, um dos objetivos é lançar o ar por baixo do carro mais rápido para deixá-lo mais colado ao solo). Em tese, uma bela estratégia.
Porém, o W13 não cumpriu e o desenvolvimento ao longo do ano foi feito para tentar salvar o projeto (até fizemos um paralelo com o Lotus 72 aqui). O carro melhorou e venceu em Interlagos com George Russell. Ali deu a certeza ao time que valia a pena insistir.
O W14 quando foi apresentado mostrou uma espécie de meio termo. A Mercedes trouxe uma lateral enxuta, mas tentando incorporar alguns conceitos que Red Bull e Ferrari trouxeram ano passado (nós falamos nesta situação aqui).
A questão é que, mesmo esta mudança, embora tenha resolvido parte do problema de arrasto, ainda não resolve o problema. A questão é as laterais consideradas “normais”, acabam ajudando no direcionamento do ar, especialmente para “fora” do carro (também chamado de “outwash”). E ajuda em parte a selar a parte de baixo, potencializando a geração do efeito solo.
Para agora, será mostrada uma forma mais "convencional", de modo a usar as ferramentas dos demais carros para direcionar o ar para a parte traseira e melhorar o desempenho do difusor. Não será um Red Bull, mas a ideia será bem semelhante.
Assoalho
Aqui é o segredo da coisa. No regulamento atual, mais de 60% da pressão aerodinâmica do carro vem do assoalho. Aqui, ir mais além. Pois o pacote pega não só os tuneis previstos pelo regulamento, mas também o difusor (parte final).
Ano passado, a Mercedes trabalhou bastante neste ponto. Mas o resultado só veio depois após uma correção de um problema sério de diferença dos dados obtidos na fábrica com os de pista (a famosa correlação).
Este ano, mesmo com todo o trabalho desenvolvido, o assoalho não vem gerando o apoio necessário. O W14 até tem tido bons resultados em curvas lentas, porém não tem entregado em curvas de média e alta velocidade. E aqui tem sido o grande problema da Mercedes em relação aos seus concorrentes.
Mais uma revisão será feita nesta peça. E aqui mostra o porque de pensar conjuntamente. Como a lateral "convencional" jogará mais ar em volta do carro, este ponto ajuda a criar uma 'parede" natural, ajudando a selar o ar que passa pelo fundo. Em tese, ajudaria a criar mais pressão e deixar o carro mais estável.
Como vocês podem perceber, não adianta atacar só um ponto. O carro de F1 é um conjunto de pontos que estão totalmente ligados. Resolver um problema pode prejudicar outro. Todo caso, a Mercedes trabalha para salvar 2023 e ter esperanças em 2024.