Mercedes W14: não é só mudar o zeropod que o fará vencedor
Após uma discreta corrida no Bahrein, as luzes de alerta piscam na Mercedes em relação ao W14. Mudanças estão à vista, mas é preciso calma.
A esperança para esta temporada era grande. A Mercedes sabia que havia errado em 2022 no W13 com a sua abordagem ao novo regulamento e fez um tremendo esforço, dentro dos limites orçamentários e de desenvolvimento, para tentar salvar o carro. No fim da temporada, notou-se que ainda faltava algo, mas que poderia pensar em dias melhores.
Quando o W14 apareceu na pista, muitos ficaram ressabiados pois não queriam cair mais uma vez no blefe da equipe de apresentar um carro e iniciar a temporada com outro cheio de novidades. Porém, com uma pré-temporada extremamente curta, não era possível lançar uma estratégia dessa.
O W14 chamou a atenção por manter a filosofia do “zeropod”. Embora o conceito permaneça, a abordagem é outra. Olhando no detalhe, a equipe capitaneada por Mike Eliott resolveu olhar o que a concorrência fez, mas adaptando às suas ideias.
Muita gente se pergunta: por que a Mercedes não copiou o que os outros fizeram? Red Bull e Ferrari tiveram as melhores soluções para este novo regulamento e usar o que dá certo como “inspiração” não é algo novo na F1.
Porém, a Mercedes resolveu ser original. Em um momento de mudança radical de regulamento, achar um diferencial passa a ser quase uma obrigação, ainda mais com a necessidade de se manter à frente. Neste caso, aqui também se aplica o velho conceito financeiro: quanto maior o risco, maior o retorno...
O W13 foi uma tremenda aposta em que a premissa era muito interessante: procurar reduzir a área de contato do ar e usar e abusar do efeito Coanda, quando o ar adquire a forma da superfície em que passa, dependendo das pressões aplicadas. No túnel de vento, a coisa funcionou maravilhosamente. Porém, quando foi para a pista, foi o que vimos...
Mas não é algo inédito. A lateral esculpida da Red Bull RB19 relembra a Ferrari F92A de 1992, que tinha fundo duplo e não andou nada. Então, nem sempre a boa ideia da fábrica é um usignificado de sucesso. Porém, vale o risco.
Voltando ao W14. A Mercedes trabalhou duro e colocou o W13 em condições de disputa no final do campeonato de 2022. Como parecia que as circunstâncias estavam controladas, poderia se investir no conceito. Afinal, entendemos como funciona o fundo e conseguimos reproduzir tudo na fábrica.
Como dito antes, o W14 é uma grande revisão: a frente trás inspirações na Ferrari e na Red Bull, sendo mais alta para direcionar o máximo para baixo do carro. Neste mesmo sentido, também é revisada a suspensão dianteira, com pontos de ancoragem diferentes. Um dos pontos era tentar manter o bom tratamento dos pneus, que foi um dos pontos fortes do W13, quando conseguia colocar na janela ótima de funcionamento.
Do meio para trás, a Mercedes adotou a linha de “evolução na continuidade”. Manteve a linha da lateral esguia (obtida atrás do uso de tecnologia de radiador de foguete) , porém usando algumas ideias da concorrência. Observando, ela procurou criar uma mini-banheira e uma ligeira queda na parte traseira, cindo da Red Bull.
Isso combinado com um ligeiro “canhão” na parte final e uma bela canaleta na continuidade do halo, procurou incrementar o fluxo para a parte traseira, além de jogar o ar mais para fora do carro, também tentando selar a parte de baixo, criando o máximo de pressão aerodinâmica.
Aparentemente, os objetivos foram atingidos: o arrasto diminuiu e a Mercedes pode usar asas menores. A questão da velocidade de ponta foi resolvida. Porém, nas curvas de baixa e em alta velocidade, o comportamento do W14 não é dos melhores e o comportamento dos pneus deixou a desejar no Bahrein. Mesmo assim, a base de trabalho parece ser melhor do que a do ano passado.
Após o discreto GP´do Bahrein é dado como certo que a Mercedes estaria trabalhando em uma revisão do W14, visando o uso de laterais mais “convencionais”. O Diretor Técnico Mike Eliott falou que virão novidades, que “não nos deixarão iguais aos demais”.
O fato é que, neste regulamento, o grande diferencial está na parte debaixo, no assoalho. Não que a carroceria pouco influa. Ela tem uma bela importância para criar a pressão aerodinâmica nos aerofólios e garantir que a resistência ao ar seja a menor possível. Porém, vimos que, quem conseguiu ganhos no assoalho e nas suspensões é que se deu melhor.
Mudar as laterais simplesmente não resolverão o problema imediato da Mercedes. Dada a complexidade da aerodinâmica de um F1 moderno, acaba sendo um sistema de cobertor curto: se resolve uma coisa e pode piorar outra. Com as limitações de teto orçamentário e de desenvolvimento em túnel de vento...
Aqui acaba tendo o comparativo imediato com a Aston Martin, que usa todo o trem traseiro da Mercedes (motor, cambio e suspensão). Desta forma, não dá para se dizer como no ano passado que a configuração trazida pelos alemães era problemática em termos de desempenho (até falamos nisso aqui).
Mais uma vez, Toto Wolff e seus comandados tem a decisão encardida a ser tomada: seguir investindo em melhorar o carro ou jogar a toalha e começar a trabalhar no W15? Não à toa, relatos dão conta de que James Allison, a mente que coordenou a era dourada e que está hoje na área de Ciência Aplicada da Mercedes, voltada a outros projetos como o barco Britannia, estaria sendo chamado para dar “uma consultoria” no W14.
Provavelmente, as cartas deverão ser jogadas em Baku, quando a F1 vem de quase 1 mês de folga após o GP da Austrália. Todos deverão trazer o primeiro grande pacote de atualizações para esta prova. Ano passado, Barcelona foi o ponto de virada. Deveremos ter a mesma situação....