Nova direção de prova acumula dramas e mostra: FIA deu tiro no pé em revezamento
FIA decidiu alterar estrutura da direção de prova da Fórmula 1 após polêmica que definiu o campeonato do ano passado, mas escolha por revezamento gerou inconsistência e uma relação abalada com os pilotos
HAMILTON EMPLACA CINCO PÓDIOS SEGUIDOS. VAI VENCER NA FÓRMULA 1 2022?
O encerramento bizarro da temporada passada na Fórmula 1 mexeu com as estruturas da categoria, que demitiu Michael Masi após as decisões controversas do então diretor de prova em Abu Dhabi — que levaram ao título mundial de Max Verstappen. Para tentar remediar a situação, a FIA escutou o pedido da Mercedes e removeu o australiano de suas funções, definindo que Niels Wittich e Eduardo Freitas se revezariam no posto em 2022. Seis meses depois, é possível dizer: não funcionou.
Inflexibilidade, parâmetros mal definidos, a falta de um padrão, limites de pista recebendo protagonismo, demora em decisões simples e o foco em questões pouco importantes — como as joias de Lewis Hamilton ou as cuecas dos pilotos — são alguns dos aspectos que marcaram o revezamento entre os dois diretores de prova no ano de 2022, em sistema que deveria ser urgentemente repensado antes do ano que vem.
A questão dos limites de pista tomou o noticiário da F1 nas últimas semanas, principalmente porque as duas corridas em que mais se falou sobre o assunto fizeram parte da reta final do calendário antes das férias — Áustria e França.
Antes tida como uma regra com certa 'área cinzenta' e passível de um julgamento subjetivo, como garantir que o piloto tenha ganho tempo de fato ao sair da pista, a discussão se tornou preto no branco com a mudança na direção de prova. Qualquer carro que ultrapassasse minimamente os limites da linha branca seria punido, e o resultado foram incríveis 43 advertências distribuídas ao longo do GP da Áustria. Uma várzea.
Hamilton se cobriu de joias para protestar contra a direção de prova em Miami (Foto: CHANDAN KHANNA / AFP)
A questão é que alterar os diretores de prova de um fim de semana para o outro também altera a maneira de julgar um determinado incidente, já que cada um tem feito aquilo que acha correto. No GP de Mônaco, uma polêmica se instaurou com a linha branca na saída do pit-lane, em que os carros da Red Bull foram acusados de desrespeitar o limite definido nas anotações de prova.
No entanto, a anotação de Freitas — que foi o selecionado para o fim de semana em Monte Carlo após estrear na Espanha — incluía uma regra antiga, em que apenas tocar a linha já seria suficiente para uma punição — algo que já foi modificado, com a necessidade da roda ultrapassar completamente a linha para gerar uma penalidade. Uma verdadeira confusão, com reclamações e pedidos de punição a dois pilotos, poderia ter sido evitada se o português apenas tivesse tido mais atenção — ou talvez conhecimento das regras.
E Freitas nem tem sido o principal problema, já que a verdadeira questão gira em torno de Wittich: seu jeito 'linha-dura' e inflexível na hora de tomar decisões gerou uma relação bastante complicada com os pilotos, o que já rendeu relatos de reuniões tensas antes das corridas e um protocolo extremamente chato e repetitivo, que fez Sebastian Vettel abandonar o encontro antes do fim na sexta-feira do GP da Áustria.
A inflexibilidade de Niels tem relação direta com a quantidade absurda de anotações da direção de prova sobre limites de pista, além da força feita pelo alemão em mudar pontos antes ignorados na Fórmula 1, como requisitar que os pilotos removam suas joias ou a implementação de cuecas à prova de fogo — algo que também rendeu um protesto de Vettel.
Vettel também fez questão de protestar contra a FIA, usando uma cueca por cima da roupa (Foto: Reprodução)
Não foi incomum ver pilotos reclamando por terem sido punidos por algo que não sabiam ser errado, já que a regra não é clara para todos e parece estar sendo aplicada sem padrão. Apesar do rigor na eliminação de voltas que ultrapassem os limites da pista, Sergio Pérez perdeu seu lugar no top-10 da Áustria apenas horas depois da classificação para a corrida sprint, pois havia saído da pista no Q2 e a investigação foi adiada para depois do treino. A imagem do momento deixava claro que o carro da Red Bull saiu com as quatro rodas da pista, mas ainda assim a decisão da FIA demorou.
Uma situação no mínimo insólita, em que o piloto mexicano saiu prejudicado por ter gasto motores e pneus além do que precisava — já que seu Q3 acabou deletado — e ainda impediu Pierre Gasly de participar da última sessão da classificação e tentar uma posição melhor no grid de largada.
A intenção da FIA, depois da patacoada de Michael Masi em Abu Dhabi, foi descentralizar o poder na mão de um único diretor de prova e diminuir o fardo do responsável pelas decisões — inclusive com a presença de Herbie Blash em uma espécie de VAR da F1. No entanto, foi gerado um efeito contrário: ao invés da improvisação do australiano na final de 2021, a rigidez extrema e a dificuldade em manter um padrão de decisões vêm desestabilizando a relação da direção com os pilotos em 2022.
Ao mesmo tempo em que vários pilotos acabaram punidos por saírem dos limites de pista na Áustria, o próprio Pérez passou por fora do traçado em disputa com Charles Leclerc na Inglaterra e o incidente foi ignorado. Max Verstappen também escapou em Silverstone, ao não ser punido por se defender de forma violenta contra Mick Schumacher na última volta, empurrando o alemão para fora da pista e mudando constantemente de direção — o que gerou punições em outras corridas, como para Fernando Alonso no Canadá.
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Diversos pilotos já foram aos microfones reclamar abertamente da direção de prova, em lista que inclui os nomes de Alonso, Verstappen, Schumacher, Hamilton e Vettel. Sobrenomes pesados, que não se furtaram de levar suas frustrações às câmeras — o britânico chegou a viver uma batalha particular com Wittich por causa de suas joias, e o atual campeão definiu as novas regras sobre os limites de pista como uma "piada".
A dificuldade da FIA em resolver questões que fujam de seu script já é notória, principalmente desde o ano passado, e a entidade resolveu apertar as restrições e diminuir a margem de erro. No entanto, o automobilismo quase sempre envolve questões subjetivas que não estão completamente descritas nos manuais de regras.
Assim como o porpoising em 2022, a FIA simplesmente não esperava o caos que tomou conta da final do campeonato de 2021. Após ver sua solução sofrer com críticas dos próprios pilotos este ano, tudo leva a crer que uma nova mudança na estrutura deve entrar nos planos da Fórmula 1 para 2023.
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