O Mercedes que prometia bater 750 km/h nos anos 1930
Em 1937, com plano audacioso e cheio de segredos, os alemães da Mercedes queriam fazer um carro que batesse o recorde de velocidade de então
Recordes de velocidade sempre foram uma ambição desde a criação do carro. O primeiro recorde padronizado aconteceu em 1898, quando o carro francês Jeantaud Duc chegou aos 63,15 km/h em uma distância de 1 km. A curiosidade deste veículo é que contava com propulsão elétrica. Em 1899, o também francês La Jamais Contente foi o primeiro a ultrapassar a barreira dos 100 km/h.
Em 1906, um carro americano, Stanley Rockett, movido com motor a vapor, bateu os 200 km/h, Em 1927, uma parceria anglo-americana construiu o Sunbeam 1000 hp, com motor a combustão, conseguiu quebrar a barreira dos 300 km/h. Em 1932, o britânico Campbell-Napier-Railton Blue Bird passou dos 400 km/h e finalmente, em 1937, o britânico Thunderbolt passou dos 500 km/h.
O recorde na época era dominado por americanos e britânicos. Por uma questão promover o regime nazista, a Alemanha tinha interesse entrar na disputa. Mas é preciso voltar no tempo, mais precisamente para 1925, quando Adolf Hitler conheceu um piloto chamado Hans Stuck. Ainda faltavam alguns anos para que os nazistas tomassem o poder no país, que só aconteceu em 1933.
Em 1934, pelas boas relações mantidas entre os dois, Hans Stuck convenceu Hitler que a Alemanha deveria entrar no mundo do automobilismo, na época dominado por italianos e franceses. Com isso, Mercedes e Auto Union entraram na temporada de 1934 do Europeu de Grand Prix.
Com todo o investimento estatal, as duas montadoras começaram a dominar as corridas em 1935 e foram conquistando tudo até 1939, quando começou a Segunda Guerra Mundial. Neste meio tempo, paralelamente, as duas montadoras começaram a se desafiar em duelos de recorde de velocidade em estrada: a Mercedes contava com o W125 Rekordwagen e a Auto Union com o Type C Streamline, que chegaram a correr em uma corrida, em Avus, onde a Mercedes se deu melhor.
No dia 28 de janeiro de 1938, a “brincadeira” de bater recorde em autoestrada acabou de forma trágica. Na estrada entre Darmstadt-Frankfurt (1 km, igual a regra para quebra de velocidade terrestre), Rudolf Caracciola levou seu Mercedes W125 Rekordwagen a incríveis 432,7 km/h. Coube a Bernd Rosemeyer, levar o Auto Union Type C Streamline para tentar bater o recorde da rival. Quando estava a mais de 400 km/h, em uma condição de ventos muito fortes, ele perdeu o controle do carro e morreu na hora. As duas marcas jamais tentaram esse recorde de novo.
Antes disso, a Mercedes já trabalhava em um carro para bater o recorde de velocidade terrestre: se tratava do projeto T80, Hans Stuck havia ido até a montadora e pedido que o carro fosse feito lá, pois a Auto Union, que era sua equipe, não tinha capacidade financeira para este feito. A meta inicial era chegar aos 550 km/h., mas em agosto de 1938, o Thunderbolt voltou a quebrou seu próprio recorde, chegando aos 556.012 km/h.
O projeto era comandado por Ferdinand Porsche, a partir do recorde batido novamente, a meta ficou mais audaciosa, chegar aos 600 km/h, depois foi para 750 km/h. Um diferencial seria que, ao invés de correr no deserto, como era feito até então, esse carro iria tentar bater o recorde em uma autoestrada alemã (as Autobahn). O receio que havia era que, se o carro fosse para fora, agentes de outros países pudessem confiscar o carro e descobrir sua tecnologia.
A preocupação se justificava pois o motor escolhido para isso, o modelo Daimler-Benz DB 603 V12 de 44.5 litros, que gerava 3000 cv, que para uso militar. Porsche teve a ajuda no projeto do especialista em aerodinâmica, Josef Mickl. O carro tinha 8 metros de comprimento, cockpit fechado e com 3 eixos, sendo dois deles com tração. Para ajudar na estabilidade, tinha duas pequenas asas, ajudando na obtenção de um coeficiente de arrasto de apenas 0,18.
O projeto era previsto para 1940. Em 1939, o britânico Railton Special, pilotado por John Cobb, bateu o recorde de velocidade novamente, elevando para 595.040 km/h., mas como se sabe, em 1939 começou a Segunda Guerra Mundial e o T80 foi colocado em local seguro. Desde o fim da guerra, ele está no Museu da Mercedes-Benz em Stuttgart, Alemanha.
Até hoje, nenhum veículo com tração nas rodas conseguiu chegar aos 750 km/h, a melhor marca é do Vesco Turbinator II, que chegou aos 745,187 km/h em 2018. O recorde geral é do ThrustSSC, que atingiu os 1.227,985 km/h em 1997, mas era movido por turbinas.