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Tiquinho, o resiliente: infância dura, sucesso improvável a artilheiro do Brasil

7 jul 2023 - 12h37
(atualizado às 12h49)
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O nome de Tiquinho Soares, hoje, é sinônimo de sucesso no futebol. Mais de 100 gols na Europa, idolatrado em sua terra, venerado pela torcida do Botafogo e atual artilheiro do Brasileirão. Dessa forma, soa como o currículo dos sonhos. Mas o que Francisco das Chagas Soares dos Santos passou para chegar até este momento, certamente faria muitos desistirem no caminho. O Jogada10 conheceu detalhes da infância humilde do atacante na cidade de Sousa, no sertão da Paraíba, e descobriu os segredos de sua dura trajetória até brilhar no mundo da bola.

Esta é a primeira de uma sequência especial do J10 sobre as origens do camisa 9 alvinegro. Ainda nesta sexta-feira, publicaremos uma matéria sobre o celeiro nordestino de craques do irresistível Botafogo do segundo semestre de 2023. E, no sábado, traremos tudo sobre a luta na Série D do 'Dino', como é chamado o time da cidade de Tiquinho, para subir de divisão no Campeonato Brasileiro.

Bairro Angelim, em Sousa, onde Tiquinho morou, hoje está mais desenvolvido com a ajuda do sucesso do atacante –
Bairro Angelim, em Sousa, onde Tiquinho morou, hoje está mais desenvolvido com a ajuda do sucesso do atacante –
Foto: André Casado / Jogada10

O pai de Tiquinho no futebol

Tudo começou no bairro Angelim, em Sousa. À época, no início dos anos 1990, era uma área com alta criminalidade e sem desenvolvimento. O desejo da maioria dos meninos era ser como Bebeto e Romário e virar um bom jogador de futebol. Afinal, não havia muitas outras expectativas para fazer dinheiro na vida. Logo, Tico virou Tiquinho por causa de seu tamanho e magreza e começou a jogar no CRA (Centro Recreativo Angelim), criado por Nildo Lima, ex-jogador cuja grave lesão no joelho abreviou a carreira. Nildo só queria ajudar as crianças. Ainda assim, mal sabia ele que sua generosidade o tornaria o primeiro técnico de um dos grandes centroavantes brasileiros da geração atual.

Entre um chute e outro, Tiquinho vendia "din din", o geladinho ou sacolé, fazia a limpeza de um matadouro e foi servente de pedreiro quando cresceu um pouco mais. Trabalhava no que fosse preciso para ajudar os pais, de origem muito humilde. Mas, apesar de tímido, também era brigão. Bastava lhe ganhar no futebol ou olhar feio que virava uma fera.

"Ele tinha esse temperamento forte dele desde garoto. Era explosivo. Olhava assim e dizia 'com esse eu já briguei, com esse também…'. Isso ajudou no futebol depois de um tempo. Eu via potencial de atacante nele por ter o chute forte, depois cresceu o pescoção, espichou e a passada foi ficando cada vez mais larga. Dominava muito bem a bola também. Essas eram as marcas dele", diz Nildo.

Tiquinho comemora o aniversário do amigo com a prima Adriana ao fundo –
Tiquinho comemora o aniversário do amigo com a prima Adriana ao fundo –
Foto: Arquivo Pessoal / Jogada10

'Perdia muitos gols', revela dirigente local

Só que Tiquinho demorou a dar certo. Muito mais do que o normal para um craque de sua categoria hoje em dia. Segundo o presidente do Sousa, Aldeone Abrantes, já aos 20 anos, ele ainda tinha uma característica que irritava os torcedores, quando defendeu o Sousa.

"Perdia muitos gols. O pessoal caía em cima dele. Mas sei que a gente demorou a ver a capacidade que ele tinha para evoluir", admitiu.

Aliás, Nildo revela que, antes, tentaram até botá-lo de goleiro. Mas Tiquinho só queria saber de jogar no ataque. E a família dava todo o apoio, à medida que conseguia superar barreiras nas categorias de base que outros meninos locais não chegavam nem perto.

Tiquinho foi enganado na Europa

O camisa 9, então, foi um cigano da bola nos primeiros anos. Morou em Natal, profissionalizou-se no América-RN, passou pelo Botafogo-PB, CSP/PB, equipes pequenas do futebol gaúcho… até surgir a chance de ir para Portugal. Porém, a tal chance era, na verdade, um esquema de um suposto empresário. Lá, onde no futuro faria muito sucesso, Tiquinho passou até fome. Com a ajuda de amigos e do CSP, voltou ao Brasil sem perspectivas. Parecia que o sonho não ia dar certo. Com isso, chegou a parar de jogar por alguns meses.

"Ninguém sabe dessa história, mas foi um período muito complicado. Foi enganado por um homem que se dizia agenciador. Fez promessas, mas chegou lá e largou Tiquinho. Ele contou que teve dia que só comeu um hamburguer porque o pai de outro menino deu", revelou Nildo.

Família de Tiquinho em Sousa/PB está na torcida pelo título do Botafogo –
Família de Tiquinho em Sousa/PB está na torcida pelo título do Botafogo –
Foto: André Casado / Jogada10

Resiliente como um autêntico nordestino, Tiquinho manteve-se forte e superou mais essa barreira. Quando chegou no Nacional da Ilha da Madeira, já aos 23 anos, sua carreira enfim decolou. Mais maduro tecnicamente, driblou os defeitos e não olhou mais para trás. Aliás, olhou sim. Nunca deixou de visitar seus parentes e sua cidade. Ajudou muito as pessoas carentes de Sousa na pandemia e apoiou financeiramente o CRA quando necessário. Diferentemente de outras estrelas internacionais, não abre mão de passar parte das férias de regata e chinelo.

O filho orgulhoso de Sousa

"Para ele, a alegria é ficar aqui, na rua, dando risada com os amigos e com a gente. Esse é o prazer de Tiquinho. Às vezes eu mando ele ir descansar e ele responde que espera por isso o ano todo. Recebe todo mundo, tira fotos e é muito humilde. Saiu daqui, mas nunca perdeu as origens", conta Adriana Alves, prima do craque, que permanece em Sousa.

"Prefiro descansar e relaxar no lugar que me sinto feliz. Eu me sinto alegre perto dos meus pais. Isso me deixa feliz. Sou super feliz no meu pedacinho de chão. Aqui tem tudo que eu preciso", contou o próprio Tiquinho, no fim do ano passado, quando já era do Botafogo.

Tiquinho com a família na época em que defendia o Botafogo/PB –
Tiquinho com a família na época em que defendia o Botafogo/PB –
Foto: Arquivo Pessoal / Jogada10

Com pouco mais de 60 mil habitantes, Sousa tem a maioria da população entre flamenguistas, além de muitos vascaínos, corintianos e palmeirenses. A reportagem passou três dias por lá e conheceu vários torcedores destes times. Mas, hoje, todos torcem pelo título do Botafogo e pela artilharia de Tiquinho. Com dez gols, o atacante lidera a lista e surge bem à frente de nomes como Pedro, Hulk e companhia.

"A cidade sabe o quanto ele merece e estão todos nessa corrente positiva pelo Botafogo. Para que no fim da caminhada ele possa ser feliz. A alegria dele é a nossa. Eu sou flamenguista, mas vibrei muito com os dois gols dele sobre o Flamengo (na vitória por 3 a 2, há dois meses, pelo Brasileirão)", diz Nildo Lima, que lembra que o projeto do CRA tinha cerca de 60 crianças e hoje conta com mais de 350.

A volta ao Brasil para o Botafogo

"Os meninos miram em ser como Tiquinho. A grandeza dele é muito importante. Hoje, Sousa virou uma referência aqui no sertão. E nosso bairro, Angelim, é o que é porque ele sempre destaca e ajuda no que pode. Antes, o povo falava mal, não era uma área desenvolvida. Só vinham para jogar bola porque tínhamos dois campos. E conseguimos melhorar muito. Tenho orgulho de ter ajudado ele no início, ser o primeiro treinador, mas me orgulha mais ver o Tiquinho como ele é hoje, o mesmo molecão. Não age como jogador famoso", conta o técnico.

Garotada do projeto do CRA faz o muque de Tiquinho junto de Nildo Lima, o primeiro técnico –
Garotada do projeto do CRA faz o muque de Tiquinho junto de Nildo Lima, o primeiro técnico –
Foto: André Casado / Jogada10

Depois de se destacar no Porto, na China e na Grécia, Tiquinho decidiu voltar ao Brasil. Justamente para ficar mais perto da família e amigos e desfrutar do reconhecimento em seu próprio país. Afinal, apesar de ser avesso à mídia, o atacante gosta desse acolhimento. E encontrou no Botafogo a família perfeita para desenvolver seu futebol e se sentir em casa, aos 32 anos.

"O que nós sentimos é que ele está feliz e em paz. E é ótimo porque está mais perto de todos aqui", diz a prima Adriana.

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