Hoje é domingo de sol em São Paulo. Dependurado num céu azul, o astro-rei esparrama seus raios cor de prata e o calor se espalha. Se aqui na terra paulistana o clima está assim, imagino pelos outros estados brasileiros. Na falta de coisa melhor, ligo a televisão. Essa velha companheira, às vezes chata, cansativa. Outras vezes, alegre, monótona, pachorrenda.
Eu, que adoro filmes de faroeste, procuro mocinhos, bandidos, cavalos, pradarias, diligência, a mocinha. Volto aos tempos de menino. Não tinha nascido ainda o jornalista esportivo. Eu, que nunca cultivei heróis, nunca me preocupei em alimentar ídolos, dou asas à imaginação.
Sou, então, um torcedor, menino, passeio no tempo, volto à época da inocência. Tudo é tão bom, calmo, sem sobressaltos. De repente, na curva do caminho, surgem três parelhas de cavalos puro-sangue, fogosos, obedientes, inquietos, puxando a diligência. Imagino que lá dentro viaja a mocinha das minhas ilusões. Bonita, charmosa, ela tem um toque de classe que ninguém possui.
Essa donzela viajou para longe, para o outro lado do mundo. Foi desfilar sua graça. Pobre moça, dessa vez não foi feliz. Foram desfiles mal feitos, passarelas desconhecidas, vestidos fora de moda, roupas mal-costuradas, quase um fracasso. Imagino que é preciso salvar nossa heroína.
O organizador da viagem caiu no descrédito. Ninguém mais lhe dá atenção. Perdeu a confiança de todos. Está em fim de carreira. Amanhã, chega a diligência. Na cidade, há um grande alvoroço. Todos querem salvá-la. O primeiro candidato é realmente um bom moço. Comportado, educado, já foi seu namorado.
Conseguiu com ela grande sucesso. Houve a separação. Ele, então, sem mágoas, se refugiou conformado, simplesmente levando a vida. Seria um bom parceiro. Se não é amado por todos, também ninguém lhe quer mal.
Há um outro cowboy estourado, valente, metido a brigão, fanfarrão, gosta de usar a força bruta. Por todos os saloons onde passa, chama a atenção, consegue amigos ardentes. Outros o olham com desconfiança. Está limpando as armas, pronto para sacá-las com rapidez e ousadia. Nem sempre tem boa pontaria. Pode salvar a mocinha. Às vezes carinhoso, no fundo é grosseiro, bruto, mas ágil no gatilho.
Há, por fim, um outro artista. Até outro dia, era noivo da nossa heroína. Tudo parecia caminhar para um final feliz. Um casamento perfeito. A lua-de-mel iria durar por muitos anos. Qual o que? Há os mistérios do amor. Houve um rompimento abrupto, inesperado. Terminado o namoro, ficou um sabor de paixão de coisa mal-resolvida.
Esse mocinho, às vezes vaidoso, imprudente, talentoso, se perdeu entre verdades e fantasias. Dos três candidatos, é o que sabe mais. Desperta sentimentos, é amado e odiado com a mesma intensidade. Ninguém fica insensível ao vê-lo. Causa, na maioria, um sentimento de inveja.
Tem poucos amigos. Sem dúvida, poderá salvar a mocinha. Trazê-la de novo ao brilho das passarelas, retocar-lhe a maquiagem, devolver-lhe o esplendor da beleza, agora sofrida, desbotada. Há na cidade um grande alvoroço. Curiosidade.
A escolha do noivo, o pedido de casamento, fica para os próximos dias. Ou melhor, para a próxima sessão. Na tela do faz de conta, a diligência está chegando depois da última curva da estrada. Levanta-se uma nuvem de poeira. O letreiro agora é em inglês: The End. Continua na próxima semana. Saudade dos meus tempos de criança.