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Marcos Caetano
Segunda-feira, 10 Setembro de 2001, 13h25
terraesportes@terra.com.br

O Mefistóteles


Eram 30 minutos do segundo tempo e meu coração estava cada vez mais apertado. Também pudera, dirá o amigo leitor, pois a partida se aproximava do seu desfecho e até aquele momento a Seleção Brasileira conseguia uma inacreditável vitória, que garantia três pontos valiosos – e justo na casa dos “insoportables” argentinos. O sofrimento era mais do que natural. Era plenamente justificado.

Também cheguei a pensar assim. Cogitei que a terrível pressão alvi-celeste era mesmo a causa da minha angústia. Até que, antes que eu conseguisse ponderar qualquer outra coisa, vieram o gol de empate, o gol da virada e o apito final do juiz. O Brasil acabara de perder o jogo e meu coração, curiosamente, tornou-se leve como o papel picado do Monumental de Nuñez.

Seria então eu um antipatriota, um quinta-coluna? Sinceramente, não. Sou daqueles que se emociona até quando o Brasil ganha torneio de bafo-bafo. E se não chego a ser um Policarpo Quaresma, pelo menos sei que possuo um autêntico e descompassado coração verde-e-amarelo. Mas então, por que diabos minha angústia da vitória parcial desapareceu completamente após a derrota?

Perguntei por que diabos e acho que isso me ajudou a entender tudo. Me explico: é que ali pelos 30 do segundo tempo, eu estava prestes a me portar como o Doutor Fausto – e assinar com Mefistóteles um terrível pacto. Quanto mais o jogo se aproximava do fim, mais eu me animava a molhar a pena no tinteiro do desespero e lavrar o termo pelo qual venderia a minha alma de amante do bom futebol ao diabo. O diabo do resultado a qualquer preço. O diabo da classificação às custas de um futebol medíocre. O diabo da traição aos mais caros valores do futebol brasileiro.

Os gols da Argentina me tiraram do transe e me fizeram enxergar as coisas com clareza. Não. Definitivamente eu não me venderia a Mefistóteles, mesmo que ele estivesse travestido num simpático e simplório bonachão brasileiro, de bigodes grisalhos, olhos azuis, falar engraçado e jeito de torcedor de arquibancada. Eu não me deixaria seduzir pela proposta de futebol covarde que Felipão oferecia. E me senti aliviado – a palavra é essa – após constatar que, felizmente, o futebol ainda não chegou ao estágio de premiar a mediocridade. A vitória sobre a Argentina cristalizaria a crença no futebol brucutu como salvação.

Portanto acho que Cris foi um grande patriota ao mandar a bola para as redes – e as boas intenções do nosso Mefistóteles de bombachas para o inferno. Preservei minha alma. E acho que o futebol brasileiro também preservou a sua.

Sejamos razoáveis. Antes de tudo é preciso entender que, jogando com ousadia ou apavorada, nossa Seleção vai se classificar. A tabela nos favorece de tal forma que só uma seqüência de tropeços do Brasil, aliada a uma improvável combinação de resultados de nossos rivais, nos deixaria fora da Copa. Além disso, como nosso próprio treinador disse, o jogo contra a Argentina era o de menor responsabilidade, já que – e isso eu não consigo aceitar – “perder seria um resultado normal”. Ora, se não tínhamos nada a perder, por que não tentamos dar um vareio de bola nos caras? Por que não jogamos com ousadia para surpreendê-los? Ou, pelo menos, por que não tentamos atacar de vez em quando? No mínimo estaríamos treinando para os três últimos jogos, onde nem mesmo o Felipão vai poder pensar em assinar acordos propondo empates.

Mas outras coisas precisam ser ditas. Em primeiro lugar, a tática de Felipão contra a Argentina não foi em nada diferente da que a Moldávia usaria contra a França ou o Íbis contra o Grêmio. Modernidade? Que nada. O Brasil usou a tática mais velha e menos bem-sucedida do mundo: a do time pequeno desesperadamente retrancado contra o time grande. Se o Brasil fosse de fato uma força defensiva, como uma Irlanda do Norte, capaz de segurar um zero a zero por toda uma primavera, até poderíamos preferir a retranca. Mas a atual geração de defensores do Brasil é a mais limitada da história. E, portanto,é muita inocência – ou mesquinhez – imaginar que com defensores como Cris, Eduardo Costa ou Roque Júnior conseguiremos ganhar jogando lá atrás.

Nosso treinador se equivoca tanto que citou a Alemanha – imaginem só! – como exemplo da decadência do futebol-arte. Ora, a Alemanha jogou justamente na retranca contra a Inglaterra. E perdeu de 5 x 1. Os ingleses foram para o ataque, mesmo na casa do adversário, e golearam. Se até os tristonhos ingleses conseguem jogar no ataque na casa dos adversários, por que não o Brasil?

Se discussões sobre o futebol europeu não interessam ao Felipão, vamos então falar de futebol gaúcho. Sim, porque o verdadeiro futebol gaúcho não é o que o Brasil vem jogando. É o que a Argentina vem jogando. O futebol gaúcho, de tantas glórias e conquistas, é aquele que mistura na dose certa combatividade e talento, marcação e vocação para o ataque. De forma que eu lanço a campanha desesperada: vamos jogar futebol gaúcho, tchê!

O que nos salva é que daqui para a frente o desespero nacional começa a entrar naquele estágio onde nem a CBF, nem o técnico, nem os jornalistas conseguem interferir na escalação da Seleção. Como ninguém quer arriscar o cargo ou o mandato, a arquibancada vai escalar Ronaldinho, Romário, Juan, Juninhos, Denílson – e o time vai partir para o ataque. Já vimos esse filme antes e, para o bem do futebol, o final foi feliz.

 

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