Como a bola da Seleção Brasileira anda mesmo bem pequenininha, nada mais razoável do que a gente ter se saído tão bem no sorteio dos grupos da Copa do Mundo – integralmente decidido com bolinhas de bingo. Além do mais, se há um negócio no qual a cúpula da CBF e os cartolas brasileiros são realmente especialistas, esse negócio é o tal do bingo.
Pelé e Platini, craques com a bola de couro – a mesma que os cabeças-de-área do Felipão tratam com reverência monárquica – mostraram que também com as bolinhas numeradas sabem tudo e mais um pouco. O Rei foi buscar a bolota com o nome da Turquia para a nossa chave, enquanto o francês descolou o Senegal para fazer a partida de abertura com a seleção do seu país. Quem sabe, sabe.
Mas a verdadeira obra-prima dos ex-jogadores no sorteio de sábado foi a montagem dos dois grupos mais díspares da história dos mundiais: o Grupo da Morte e Grupo dos Bobos.
Para quem ainda duvidava que eliminatória é uma coisa e a Copa do Mundo outra totalmente diferente, a divisão das equipes para a primeira fase causou uma desconcertante inversão de papéis entre Brasil e Argentina. O Brasil, que antes era considerado virtualmente incapaz de sobreviver aos três primeiros jogos, dificilmente terminará a etapa sem a primeira posição de seu facílimo grupo. Por outro lado, a Argentina, que era apontada como a maior barbada do campeonato, pode perfeitamente ir para casa mais cedo. Bem mais cedo que o mais trágico dos mais trágicos tangueiros poderia supor.
O Brasil vai jogar no Grupo dos Bobos, que conta apenas com marinheiros de primeira – e no máximo segunda – viagem. É a primeira copa da China, e apenas a segunda de Costa Rica e Turquia. O Etti Jundiaí, bem treinado, atropela esses três sem suar muito a camisa. E se os comandados do Felipão não passarem por essas mangas de colete, nem precisam voltar: é melhor pedir asilo político ao governo chinês.
Já a Argentina, que caiu no Grupo da Morte, vai ter que jogar tudo o que sabe – e por sorte sabe muito – para passar pela arqui-inimiga e campeã do mundo Inglaterra, a invicta Suécia – uma das primeiras classificadas nas eliminatórias européias – e ainda pelo impetuoso time que tirou das mãos de muitos dos atuais titulares da celeste y blanca uma medalha de ouro olímpica: a Nigéria. Isso se a também invicta Dinamarca e o valente Uruguai não aprontarem uma surpresa para os acomodados franceses, atuais campeões do mundo e pré-classificados.
O Campeonato Brasileiro, por sua vez, não definiu os enfrentamentos para a próxima fase com base em bolinhas de bingo, pedras de víspora ou mesmo no “marraio feridô sô rei” das bolinhas de gude. A coisa toda se resolveu dentro de campo.
Façam suas apostas para São Caetano x Bahia, Atlético-PR x São Paulo, Fluminense x Ponte Preta e Atlético-MG x Grêmio. Faça você, amigo leitor, pois eu não me atrevo. É absolutamente impossível querer adivinhar os vencedores desses confrontos sem uma boa pajelança. O fato dos quatro primeiros colocados jogarem em casa e pelo empate no tempo normal e na prorrogação pode animar os mais precipitados a apostar neles. É uma aceitável – e, convenhamos, bem conveniente – linha de raciocínio. Mas como desprezar o impressionante histórico do Grêmio nos mata-matas? Ou a grande tradição em campeonatos brasileiros de São Paulo e Bahia? Ou mesmo a força do ataque da Ponte Preta? O Azulão parece sobrar na turma, mas da mesma forma que ele surpreendeu todo mundo no ano passado, este ano pode ser ele o surpreendido.
Com tantos enfrentamentos definidos no último final de semana – uns na bola, outros na bolinha – resta-nos apenas uma coisa a fazer: começar já os nossos bolões.
Os torcedores dos oito times classificados no Campeonato Brasileiro estão contentes, Felipão está exultante com a chave do Brasil – e há quem diga até que China, Costa Rica e Turquia estão em festa por terem caído no grupo mais fácil da Copa do Mundo. Mas tenho certeza que nenhum deles está mais feliz do que os 35 milhões de rubro-negros – que com a vitória de ontem perigam transformar um ano que caminhava para entrar para a história como aquele no qual o time foi rebaixado pela primeira vez, no ano em que o clube conseguiu três títulos: um carioca, um nacional e, dependendo da performance contra o San Lorenzo, até mesmo um internacional.