Depois de um certo tempo acompanhando as fases finais de grandes campeonatos, acabei aprendendo que nelas, como num jogo de pôquer, uma quadra honesta é sempre melhor do que qualquer combinação de trincas ou
pares, mesmo se estas forem de reis ou ases.
Avaliadas desse modo, as finais da Liga Rio-São Paulo têm tudo para ser das mais empolgantes. Isso porque, se não chega a figurar entre os quatro
classificados um time capaz de encantar a todos – o que no carteado
equivaleria a um Ás –, ao menos o nível das equipes é bastante parelho. Isso faz com que tenhamos uma boa quadra de valetes, o que, nos gramados como nos cassinos, vale mais que uma dupla de ases. Portanto, pinguem suas fichas no pano verde e vamos ver quem ganha.
Com a vantagem. Mas que vantagem?
Palmeiras e Corinthians, os únicos que chegaram à rodada final sem precisar apostar nela suas últimas fichas, aparecem com ligeiro favoritismo, especialmente se a cartolagem – dona do cassino – estabelecer vantagens concretas para os times de melhor campanha na fase classificatória. Em comum, os dois clubes que terminaram nas primeiras posições da tabela, têm algo que não pode ser desprezado: treinadores competentes.
Vanderlei Luxemburgo, a despeito das complicações extra-campo, já mostrou
mais de uma vez que sabe como armar um time de forma ofensiva e eficiente.
Com o Palmeiras de 2002, não foi diferente. A equipe, desacreditada no
início do ano, chega ao final da primeira fase na ponta da tabela, com um
dos ataques mais eficientes do torneio. E tudo isso sem um elenco de
foras-de-série, com a honrosa exceção de Alex – e mesmo assim apenas quando o inconstante meia atua com alegria. A consistência do craque definirá o futuro do Verdão na competição.
Comandando o Corinthians, os resultados de Parreira não foram menos
convincentes. De um segundo semestre desolador em 2001, o clube do Parque
São Jorge se vê agora com a defesa menos vazada da competição e um
meio-campo que erra pouquíssimos passes. E assim como o Palmeiras, não
dispõe de um elenco espetacular, apesar da regularidade de Ricardinho e do
momento inspirado de Kleber, Leandro, Deivid e Gil. A manutenção do seu
ótimo jogo de conjunto é a chave para o Timão chegar ao título.
No apagar das luzes
Completam a quadra de valetes mais dois clubes paulistas, os dois com nomes beatificados: São Paulo e São Caetano. E bem que eles precisaram de uma ajuda celestial para conseguir a sofrida classificação. O São Paulo teve que mostrar sua conhecida volúpia ofensiva, para contrapor à sua consagrada incapacidade defensiva, e assim ultrapassar o Americano. Chega a ser inacreditável ver um time que termina a primeira fase com o ataque mais poderoso – 47 gols, 13 a mais que o segundo lugar – sofrer também 31 gols, marca que o põe entre os de pior retrospecto defensivo. Do equilíbrio dessa insana balança dependerá a sorte do Tricolor na próxima etapa.
Já o São Caetano, apesar de só ter conseguido o gol salvador aos 45 da
segunda etapa, contou com o providencial auxílio do Fluminense, equipe que
em nenhum momento quis realmente vencer a partida. Seu treinador deu a um
repórter de campo a verdadeira medida da covardia do time, quando garantiu
no intervalo: “A vitória é muito mais importante para o São Caetano do que
para nós”. Parecia que era mesmo. E, não por acaso, foi o Azulão que seguiu em frente. Se quiser finalmente ganhar um título, o São Caetano terá que recuperar o futebol alegre dos últimos Brasileirões.
O esforço celestial, todavia, só não seria em vão se os demais cariocas
colaborassem. E eles colaboraram. O Vasco, que foi dominado pelo Corinthians e quase achou um gol em jogada pessoal de Romário, acabou derrotado nos descontos. E o Botafogo, que enfrentava em casa o pior colocado entre os paulistas, conseguiu a façanha de perder. Com isso, jogou fora a sonhada classificação.
O saldo final da rodada foi um verdadeiro castigo para os cariocas, que
acabaram sofrendo as conseqüências da atitude bovina com a qual as pessoas
com um mínimo de bom senso ligadas aos clubes de futebol da cidade
contemplam as calamitosas gestões de gente como Eurico Miranda, Edmundo
Santos Silva e Caixa D´Água.
Há muitos anos que os cariocas vêm apostando suas fichas nessas cartas
furadas. Agora, finalmente, sua banca quebrou. Só que o campeonato, que não tem nada a ver com isso, segue em frente. E as finais da Liga Rio-São Paulo – agora simplesmente Liga São Paulo-São Paulo – prometem partidas
disputadíssimas. Façam suas apostas!