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Marcos Caetano
Domingo, 26 Maio de 2002, 17h12
terraesportes@terra.com.br

Dez razões para crer


Brasileiro, profissão: esperança. Um espetáculo com esse tema marcou época nos palcos nacionais e consagrou, definitivamente, o talento de Paulo Gracindo e Clara Nunes. As declamações do ator e as interpretações da cantora explicavam, com muita poesia, o caráter especial do nosso povo – que mistura de forma maravilhosa sofrimento, luta e muito, muito otimismo. Na semana em que começa a Copa do Mundo, exercer nossa profissão de fé torna-se mais importante que nunca.

Portanto, ao menos por alguns instantes, tentarei esquecer a péssima campanha que a nossa Seleção fez nas eliminatórias, seu tíbio desempenho nos amistosos de preparação e até o fato de termos levado quase uma hora para fazer – com passe do zagueiro adversário – um golzinho nos bambalas malaios. Hoje eu gostaria de convidar o leitor a deixar de lado o pragmatismo das análises táticas para buscar motivação para acordar de madrugada ou virar a noite, conforme seu perfil de boêmio ou caxias, e acompanhar mais um capítulo da saga da nossa pátria de chuteiras. Encontrei dez razões:

1) Qualidade dos jogadores – Se é verdade que o 3-5-2 do Felipão está meio enguiçado, os jogadores brasileiros, que, no final das contas, darão nomes aos números do técnico, ainda estão entre os melhores do mundo. Somente Argentina e França podem pensar em competir conosco nesse quesito.

2) Não tem bicho-papão – A julgar pelos amistosos disputados no ano, nenhuma seleção chega à Copa com uma imagem ameaçadora de cão do Segundo Livro. Todos os favoritos andaram perdendo jogos e suando a camisa para bater equipes mais fracas.

3) União do grupo – Já escrevi incontáveis vezes que essa conversa de jogador santinho é uma tremenda bobagem, que a profissão de jogador de futebol nunca foi nem nunca será o caminho mais fácil para a canonização. Mas um time unido terá sempre mais chances que um outro que viva às turras. Apesar de termos um grupo de estrelas, ao menos até aqui não notamos crises de estrelismo. Fora as do Felipão com a imprensa – mas ele não joga.

4) Longe de contusões – Até o momento, nenhum dos nossos 23 atletas tem problemas de contusão. Todo o elenco está à disposição do treinador. Zidane, que ontem sofreu um estiramento e Beckham, que se recupera de uma fratura no pé, são apenas alguns dos grandes craques que preocupam seleções candidatas ao título.

5) Apoio da torcida – Graças à legenda construída não com retrancas, mas com o talento de Pelé, Garrincha e tantos outros, exceto quando joga contra o time da casa, o Brasil sempre tem a torcida a seu favor.

6) Experiência – A Seleção Brasileira, única que participou de todas as copas do mundo, conta com 7 jogadores que em 98 chegaram à final do torneio. O Brasil vem de duas finais consecutivas, experiência que faz diferença na hora de decidir.

7) Chave fácil – Não me refiro ao cruzamento das oitavas-de-final em diante, onde podemos encarar França, Argentina ou Inglaterra. Mas, ao menos na primeira fase, só vamos pegar arimetéias. E poderemos usar essas partidas para continuar acertando a equipe para as etapas mais difíceis.

8) Tradição – Para quem é apegado a estatísticas, vale lembrar que o Brasil é o único país que conquistou uma copa fora do seu continente. Como as equipes asiáticas não têm muitas chances, se a tradição entrar em campo, voltaremos com o caneco.

9) Criatividade – O Brasil tem no elenco diversos jogadores capazes de decidir partidas com lances de genialidade. Ronaldinho Gaúcho, Denílson, Ronaldinho Carioca, Rivaldo e, correndo por fora, Roberto Carlos, Juninho e Edílson, são jogadores que, se estiverem inspirados, podem desequilibrar.

10) A força da amarelinha – Digam o que quiser, mas a camisa amarelinha ainda é um fantasma a assombrar os que respeitam sua mística – ou seja, todo mundo.

Patriamada, patriaminha, patriazinha. Com os versos de Vinícius de Moraes no coração, embarcarei depois de amanhã num vôo que, após escalas, baldeações e quase 40 horas, há de me largar em Ulsan. Sou brasileiro. Portanto, sou esperançoso profissional. Mesmo que, como profissional, não esteja tão esperançoso assim.

 

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